A vida no romance machadiano

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A vida no romance machadiano

Em 2008 completam-se cem anos do falecimento do escritor Machado de Assis. Fundador da Academia Brasileira de Letras, o carioca do morro do Livramento é considerado um dos maiores romancistas brasileiros. Aos 42 anos, publicou Memórias Póstumas de Brás Cubas, obra que antecipa procedimentos modernistas e descobertas da psicanálise e eleva a literatura brasileira a um patamar jamais atingido.

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Machado de Assis foi o precursor do Modernismo no Brasil

A década de 80 do século XIX no Brasil ficou marcada pelos acontecimentos que promoveram a reestruturação do Estado Brasileiro. Pressionada pelo capital internacional em expansão, principalmente o inglês, a classe dominante brasileira tratou de promover um rearranjo no cenário político nacional, proclamando uma república e adequando o país às exigências impostas pelo imperialismo da época.

Essa mesma década marca a introdução do realismo no Brasil, criando um divisor de águas no campo da literatura nacional. O chamado Realismo na literatura brasileira compreende uma manifestação literária marcada pela oposição à tendência idealizante do Romantismo e pela atitude crítica em relação à sociedade.

Memórias Póstumas de Brás Cubas representa o marco introdutório do realismo no país e foi publicado originalmente como um folhetim, em 1880, em capítulos na Revista Brasileira. Em 1881 saiu em livro, causando espanto à crítica da época, que se perguntava se o livro tratava-se de fato de um romance: a obra era extremamente ousada do ponto de vista formal, surpreendendo o público até então acostumado à tradicional fórmula romântica.

A vida, e não a morte de Brás Cubas

O romance tem uma perspectiva deslocada: é narrado por um defunto, que reconta a própria vida, do fim para o começo, num relato marcado pela franqueza e incisão. É Brás Cubas, personagem de grande densidade psicológica, quem comenta as suas próprias mudanças.

A estrutura de Memórias Póstumas de Brás Cubas tem uma lógica narrativa surpreendente e inovadora. A sequência do livro não é determinada pela cronologia dos fatos, mas pelo encadeamento das reflexões do personagem. Uma lembrança puxa a outra e o narrador Brás Cubas, que prometera contar uma determinada história, comenta todos os outros fatos que a envolvem, para retomar o tema anunciado muitos capítulos depois.

Organizados em blocos curtos, os 160 capítulos de Memórias Póstumas… fluem segundo o ritmo do pensamento do narrador. A aparente falta de coerência da narrativa, permeada por longas digressões, dissimula uma forte coerência interna, oferecendo ao leitor todas as informações para conhecer a visão de mundo de um homem que passou pela vida sem realização nenhuma, apenas ao sabor de seus desejos.

A linguagem Machadiana que revoluciona

Usando a metalinguagem, Machado convida o leitor a refletir sobre a estrutura da obra e perceber dois níveis de leitura: a que revela diretamente o personagem e a que o faz objeto de crítica do autor.

O leitor de Machado é constantemente solicitado a interagir criticamente com a obra, distanciando-se ainda mais do modelo de leitura proposto pelos romances românticos, que mobilizam a emoção e a imaginação.

A digressão é outro elemento importante da linguagem machadiana. Consiste na interrupção do fluxo narrativo, que envereda por assuntos desvinculados do tema inicial, mas mantendo com ele alguma analogia criada pela mente de quem conta.

O caráter inovador de Memórias Póstumas de Brás Cubas não está na sequência cronológica dos fatos ou na história propriamente dita. A melhor chave para compreender a obra são as reflexões do personagem, como elas se encadeiam e se misturam aos eventos que ele vive.

O mais importante da obra certamente não é o enredo e sim a linguagem utilizada por Machado de Assis. A denúncia tácita da sociedade, por meio do humor e de uma leve ironia.

Existem críticos que apontam Machado como uma ponte entre estilos. Entendemos que a leitura de Memórias Póstumas… elucida alguns fatos e nos mostra um escritor que luta incansavelmente para furar o bloqueio do preconceito e que defende um estilo literário ligado ao momento histórico e as demandas sociais e políticas.

Ademais, introduz o realismo não só como uma linguagem, mas como uma apreciação pelo desenvolvimento científico impulsionado com a nova revolução industrial.

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