Argentina: FMI aplica castigo infinito

Argentina: FMI aplica castigo infinito

A grave crise econômica e social que estalou na Argentina em dezembro de 2001 e que segue se alastrando de forma devastadora, é o resultado da política imperialista para os países do terceiro mundo, particularmente os países latino-americanos, com uma economia submetida aos interesses estrangeiros e uma estrutura agrária baseada no latifúndio, ainda que a Argentina fosse o país da América Latina que tivesse alcançado um relativo crescimento industrial a partir de meados do século passado. Os dados alarmantes da bancarrota do país assustam exatamente porque se vendia até o ano passado (governos e mídia), a imagem de uma Argentina próspera e estável exatamente porque aplicava bem essa política.

Repentinamente os dados catastróficos da situação econômica e social do país transbordaram, alarmando os países vizinhos. Pesquisa do Data Folha, publicada em 9 de junho, mostra que 56% dos brasileiros acreditam que o Brasil pode virar Argentina. Afinal os números da crise argentina são muito parecidos com a realidade de miséria de toda a América Latina.

Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento e Ação Social, quase metade da população urbana do país (46,7%) vive hoje na pobreza (considerando-se pobre quem ganha menos de 154 pesos por mês, descontados os desempregados que recebem 200 pesos em frentes de trabalho) Mais de 6 milhões de pessoas são indigentes, ou seja, ganham menos de 64 pesos por mês. Na região metropolitana da capital Buenos Aires, 2.400.000 pessoas são pobres e 830.000 são indigentes. A taxa de desemprego urbana, admitida oficialmente, é de 22% da população economicamente ativa. Esses dados se agravam rapidamente nos últimos meses, sendo que em dezembro 25 mil argentinos perderam o emprego e de janeiro a março desse ano mais 250 mil trabalhadores foram despedidos. O salário caiu vertiginosamente, atingindo o pior nível dos últimos 50 anos reduzindo em 30% o poder aquisitivo do trabalhador.

Antes dos anos 90, a fome era um fenômeno raro na Argentina, mas na última semana do mês de maio denúncias indicaram o aumento da fome e miséria nas províncias do interior. Artêmio Lopez, diretor da Consultora Equis, principal organismo de estudos sobre desemprego e pobreza no país, informou que "a novidade mais terrível do mercado de trabalho atual é que mesmo que o chefe de família tenha um emprego, um milhão de famílias não consegue ter a receita mínima indispensável para superar a linha de indigência e assim obter os alimentos básicos que garantam a demanda calórica mínima". A cesta de alimentos, cujos produtos aumentaram 54,1% de janeiro a maio deste ano, custa atualmente 380 pesos. De acordo com a Equis, 2,7 milhões de crianças argentinas, hoje, passam fome diariamente, principalmente na região Norte, a mais empobrecida do país, onde, segundo o Ministério do Desenvolvimento 74,5% das crianças são pobres. Incluindo a população rural, a pobreza atinge 14 milhões de argentinos.

Dados da imprensa argentina dão conta de que a dívida externa pública chegou a 170 bilhões de dólares e a dívida privada a 40 bilhões), fruto da política de saque imposta pelo imperialismo através dos mecanismos de pagamento dos serviços da dívida externa e que prossegue com a corrupção desenfreada em todas as esferas do poder público e privado. 40% da indústria e a maioria dos serviços públicos e 90% dos bancos estão em mãos estrangeiras. A aplicação da cartilha imperialista pelos governos aumentou o poder do latifúndio e das agroindústrias que controlam as melhores terras do país. Hoje, mais de 20 milhões de hectares de terras estão hipotecadas pelos bancos (somente o Banco Nación tem mais de 12 milhões). A Argentina vive um processo acelerado de "estrangeirização" das terras: o imperialismo ianque pressiona pela criação do Banco Federal, que agruparia os Bancos Nación, Província, Córdoba e Cidade para posterior privatização, ficando dessa forma com as terras hipotecadas.

Também contra o Empresário nacional

"A coisa mais importante que precisamos fazer é manter a paz social" diz o presidente Duhalde. A que paz se refere? Certamente à "paz dos cemitérios", que o povo argentino se nega terminantemente a aceitar. Duhalde pede que o povo pare de lutar e baixe a cabeça frente às exigências cada dia mais espoliadoras do FMI, que nada mais são que a busca da saída do imperialismo de sua crise estrutural com a espoliação e submissão total dos países do terceiro mundo, particularmente da América Latina. O governo norte-americano quer fazer da Argentina um "caso exemplar" e o FMI lança contra o país a operação "castigo infinito" (Jornal El País, 22/03/02), impondo ao governo e demais políticos representantes das classes dominantes medidas preliminares para fazer novo acordo que permitiriam o "socorro internacional à Argentina".

A primeira destas medidas diz respeito à reforma da Lei de Falências, que já foi realizada. Como Segunda medida, o FMI exigiu a revogação da Lei de Subversão Econômica, em nome da "segurança jurídica dos investidores internacionais", o que acabou acontecendo, por apenas um voto de diferença no Senado argentino, em maio último. A polêmica Lei de Subversão Econômica foi criada em outubro de 1974, durante o governo de Isabelita Perón, para processar empresários que apoiavam financeiramente os guerrilheiros na Argentina, principalmente os Montoneros. Após o golpe militar de 1976, o ditador Jorge Videla fez alterações na lei no sentido de endurecer as penas. Na época, passou a ser chamada de Lei de Segurança Nacional. Em 1983, o Congresso aprovou novas modificações, revogando parte da lei referente a delitos políticos, mas manteve a parte sobre os delitos econômicos.

A terceira exigência é o corte de 60% do orçamento das províncias, que já não têm mais onde, nem o que cortar, pois já estão emitindo bônus (as chamadas "quase moedas") com as quais pagam o funcionalismo e as despesas de custeio da administração. Os governadores, pressionados pelo povo faminto, resistem ainda ao acordo fiscal, enquanto o presidente Duhalde faz de tudo para acatar ao pé da letra, as novas diretrizes do governo norte-americano.

Enquanto os políticos no parlamento fazem um jogo sórdido para ver quem ocupará o poder em substituição do presidente Duhalde — indiferentes à fome e à miséria — as massas populares vão para as ruas; fazem greve; fazem piquetes; fecham estradas; apedrejam e ateiam fogo nos bancos. O povo percebe que pode derrubar presidentes e ministros, como fez, de fato, com o presidente De la Rua, o presidente interino Ramón Puertas e depois com Adolfo Rodrigues Sáas. A realidade concreta está se encarregando de mostrar que a troca de governantes não basta. A efervescência política das ações de massas mostra que o povo argentino espera que a saída para essa situação caótica seja outra, que não a das classes dominantes, que nas últimas décadas reagiram contra a resistência popular com as forças armadas nas ruas promovendo banhos de sangue.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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