Sebastián Piñera, o gerente de turno do Estado chileno, está aprofundando a guerra contra os mapuches, aumentando a repressão à zona da Auracanía, sul do país, onde se encontra a maioria das comunidades originárias. Enquanto isso, presos políticos mapuches continuam em greve de fome e protestos tomam as ruas.
Após incêndio em propriedade de latifundiário: Lei Antiterrorista
No dia 4 de janeiro, um casal de latifundiários morreu após um ataque incendiário em uma de suas propriedades, na cidade de Vilcún, sul do país. Rapidamente, a Comunidade Autónoma de Temucuicui, mapuche, foi acusada de provocar o incêndio e a morte do casal.
Os latifundiários se diziam proprietários de 1.200 ha reclamados por comunidades mapuches da região. A área é alvo de conflitos desde o início do século 20, quando a família dos latifundiários, de sobrenome Luchsinger, chegou à região, segundo o historiador chileno Martín Correa.
Em 1999, uma das fazendas foi ocupada por uma organização mapuche e no ano seguinte começaram a ocorrer ações incendiárias nas várias propriedades da família. Desde 2005, as áreas contam com vigilância permanente da polícia chilena.
A região conta com mais de 400 policiais e 40 agentes de inteligência e Piñera autorizou a criação de uma polícia especializada no combate ao “terrorismo”, de acordo com o Ministro do Interior, Andrés Chadwick.
Em 2008, Matías Catrileo foi assassinado (ver box) em uma das áreas reivindicadas pelos mapuches e que estão em poder da família Luchsinger. O governo e a polícia chilena tentam vincular as manifestações pela morte de Catrileo – que ocorrem há cinco anos – com o recente incêndio na propriedade Luchsinger.
Violência generalizada
Após o incêndio, o governo chileno montou uma verdadeira operação de guerra no sul do país. Piñera esteve pessoalmente no local do conflito e discursou contra o “terrorismo”. A polícia realizou um grande operativo, invadindo várias comunidades da região e prendeu cinco pessoas. O governo decretou o uso da Lei Antiterrorista, agudizando o conflito.
Segundo os dirigentes mapuches a morte do casal é mais uma das diversas montagens com o intuito de criminalizar a luta por retomada dos territórios ancestrais e que dessa vez utilizam a data de 5 anos do assassinato de Catrileo como justificativa.
O líder da comunidade Autônoma de Temucuicui, Jorge Huenchullán, afirmou ao jornal El Siglo: “A prática que o governo usa agora não é nova, e aponta a criminalizar os dirigentes mapuches. Aqui fica muito claro que qualquer fato, mesmo que alheio ao tema territorial político, é atribuído aos mapuches. Nossa luta é política, territorial. Jamais vamos eliminar pessoas, isso não está na consciência coletiva da luta mapuche”.
No dia 4, o machi (líder espiritual) Ceferino Celestino Córdova, de 26 anos, foi preso e se encontrava baleado. A polícia afirma ter prendido Ceferino na propriedade incendiada. Segundo as investigações policiais, o casal respondeu ao ataque a tiros e teria ferido o machi. As comunidades mapuches contestam a versão policial.
No dia 4, a machi Francisca Linconao, da comunidade de Padre Las Casas, teve a casa invandida e foi presa por possuir panfletos vinculados à causa mapuche e, segundo a polícia, portar uma arma caseira.
Para o primeiro preso, Ceferino Celestino, foi utilizada a Lei Antiterrorista e ele continuará preso por tempo indeterminado. Francisca foi liberada dias depois, após sofrer violências físicas e psicológicas. Ela foi obrigada a retirar sua vestimenta típica mapuche e suas tranças foram desfeitas. Ao ser liberada, Francisca afirmou que não possuía nenhuma arma.
Em Ercilla, umas das mais destacadas comunidades mapuches que lutam pela recuperação de territórios, um homem foi agredido por policiais e ficou gravemente ferido.
Mas à violência, as organizações mapuches responderam com a ocupação, na mesma semana, de mais um latifúndio usurpado: o “fundado” conhecido como “Família Puig”. Ainda durante a primeira semana de janeiro, várias ações de sabotagem contra empresas florestais e latifúndios foram realizadas.
Matías Catrileo
O jovem Matías Catrileo, de apenas 23 anos, foi assassinado em 3 de janeiro de 2008, quando a Coordenadora Arauco-Malleco tentava recuperar uma área ancestral que estava em mãos da família Luchsinger, em Vilcún. Ele foi um dos 13 mapuches assassinados desde 1990, quando começaram as recuperações de terra.
Catrileo levou um tiro pelas costas do cabo da polícia chilena Walter Ramírez. Segundo a polícia houve um “mal entendido no cumprimento do dever, por isso sua conduta deveria ser reconhecida como legal”. A justiça acabou condenando o cabo a 3 anos e um dia de prisão domiciliar. Em que pese a condenação, o cabo continua em ativa na polícia chilena.
Após o assassinato de Catrielo foram seus familiares que foram parar atrás das grades. A mãe e a irmã de Catrileo estiveram presas várias vezes por reclamar justiça e organizar manifestações.
Este ano, a família fez um novo chamado para manifestações públicas contra a criminalização da luta mapuche e pela responsabilização criminal dos culpados pelo assassinado de Matías. No dia 3 de janeiro de 2013, manifestações foram realizadas em Santiago, Concepción e Temuco.
Greve de fome
Atualmente, três pesos políticos mapuches, dirigentes da Coordenadora Arauco-Malleco, estão em greve de fome: Ramon Llanquilleo, Héctor Llaitul e Fernando Millacheo.
Llanquileo está recluso no presídio de Angol, em Temuco, sul do país. Hector está recluso em Concepción, no presídio El Manzano. O protesto dos dirigentes da CAM começou em 14 de novembro de 2012. Eles exigem justiça e reclamam que foram julgados duas vezes, sendo considerados inocentes pelo Tribunal Militar e culpados pela Justiça Civil chilena, no qual foram utilizados testemunhas sem rosto e foi utilizada a Lei Antiterrorista. Todas as manifestações são referentes ao “caso Elgueta” no qual são acusados de assassinato de um policial.
Héctor foi condenado a 15 anos de prisão e já fez mais de 300 dias de greve de fome, desde 2007, em cinco diferentes protestos. No dia 3 de janeiro, ele foi retirado do presídio de Angol, onde estava, e hospitalizado em Concepción. Depois, foi levado, sem ordem judicial, para o presídio El Manzano, da mesma cidade. Com a atual greve de fome já perdeu mais de 116 kg.
Ramón, que foi condenado a 8 anos de reclusão, já leva mais de 200 dias sem comer desde que foi preso, em 2007. Ele já perdeu mais de 13kg.
Millacheo está em greve de fome desde 24 de dezembro de 2012. Ele pertence à comunidade mapuche Chequenco, de Ercilla.
No último dia 10 foram realizadas manifestações em várias partes do Chile e no México, França, Autrália, Noruega, Suécia e Brasil em apoio à causa mapuche. No dia 8, o povo de Concepción saiu às ruas em protesto à Lei Antiterrorista e à criminalização da luta.
Menores presos
O Estado chileno também mantém presos menores de idade acusados de ações “terroristas”. São jovens que levantam alto a bandeira da luta mapuche pela recuperação de terras. Gabriel V. M, de 17 anos, da comunidade Wente Winkul Mapu, está preso desde 3 de dezembro no presídio de menores de Chol Chol.
Gabriel é acusado, junto a Luis Marileo e Leonardo Quijón, de assassinar policiais. Ele se defende, em manifesto desde a prisão, afirmando que “somos jovens que estamos lutando por justiça e verdade para nosso povo em suas justas demandas por território, mas o Estado chileno não pode dar respostas e só pensa em reprimir e agudizar a luta das comunidades mapuches”.