Bamba no samba e na pintura

Bamba no samba e na pintura

Carioca da gema, como afirma, nascido e criado no Morro de São Carlos, o sambista, compositor e artista plástico, Wanderley Caramba, é um típico ‘talento do povo’. Seus sambas-enredos já venceram carnavais e seus quadros retratam bem a boemia carioca, o povo do morro e seu cotidiano, tudo muito colorido. Um dos quatro componentes do grupo ‘Sambistas pintores’, Caramba faz parte da ‘Velha Guarda da Estácio’, sendo um exemplo de fidelidade à sua raiz.


O Rio e o samba como tema

— Sou um compositor, criado dentro do universo do morro e do samba, que também nasceu predisposto a desenhar e pintar, amando da mesma forma música e artes plásticas. Costumo me inspirar na minha própria infância e naquilo que fui vendo ao longo da vida para pintar e compor. Sou de uma família de cariocas, de muitas gerações — declara.

— Comecei a desenhar na infância ainda, e em pouco tempo estava fazendo historinhas através disso: arrumava uma caixa de sapatos e fazia desenhos em sequência, tipo filme, usando os heróis que existiam na época, adaptados ao meu jeito. E ganhava ‘alguns tostões’ com isso, porque meus amigos me solicitavam filmes. Ainda criança, já fazia muitos filmes por encomenda — conta com alegria.

Um pouco depois Caramba foi trabalhar fazendo carreto na feira e assim conheceu Hilda Borges Curti, professora de canto e pintura.

— Ela notou que eu ficava maravilhado com seus quadros, e começou a me ensinar técnicas de desenho e pintura. Também me deu aulas de canto. Depois fui trabalhar de carregador em uma fábrica de aparelhos de televisão, e por ficar desenhando na hora no almoço, fui convidado pelo patrão para desenhar objetos para a firma. E incentivado por ele ingressei na Escola de Belas Artes e no Liceu de Artes e Ofício — continua.

Durante todo esse tempo Caramba também cantava samba informalmente e fazia suas composições.

— Fazia desenhos para o morro inteiro, em papel, em camisas, até tatuagens e, paralelamente, participava dos carnavais em blocos e na Estácio, primeira escola de samba do Rio. Meu pai foi sambista de lá, e meus tios compositores e estilistas da escola. Na minha época de moço, década de 1950, o carnaval era bem diferente: artesanal, do povo, não tinha esse dinheiro todo envolvido como tem hoje. E as ruas ficavam cheias de cordões e blocos — lembra.

— Conheci Ismael Silva quando eu ainda era criança, e mais tarde foi meu companheiro ‘nas noites’ da malandragem, com rodas de samba e jogos de cartas. Ele na verdade não morava no morro, mas ali nas redondezas, pelo Catumbi — diz Caramba, que também conviveu com muitas personalidades do samba, entre eles: Cartola e Braguinha.

— Certa vez participei de um festival de samba na televisão, e o Braguinha falava que ia ganhar. Todo mundo o apoiava, até eu (risos), mas meu puxador acabou fazendo uma aposta com ele de que nós ganharíamos. Para minha surpresa meu samba ‘Tem mina pra caramba’, ficou em primeiro lugar e o dele em segundo. Então teve que pagar um almoço pra ‘todo mundo’ numa churrascaria em Botafogo, o que deu um dinheirão — conta.

Juntando as artes plásticas com o samba, Caramba já fez esculturas/adereços e sambas-enredo para a Estácio e várias outras escolas além de blocos de carnavais. Ele chegou a criar uma escola de samba e um bloco carnavalesco durante o tempo que morou em Jacarepaguá, bairro da zona Oeste do Rio.

— Apesar da Estácio ser a do coração, nunca deixei de fazer trabalhos para outras escolas, isso pelo amor ao samba de forma geral. Inclusive fui campeão pela São Clemente e participei bastante do carnaval da Portela.

Caramba diz que com o mesmo samba foi campeão por duas vezes na Estácio, a primeira na década de 1970 e a segunda a quatro anos.

— Foi ‘Arte negra da legendária Bahia’, em parceria com Dominguinhos do Estácio, meu vizinho no morro — conta Caramba, que atualmente reside na baixada.

Companheiros de samba e pincel

Wanderley Caramba é um dos integrantes do grupo, criado na década de 1980, ‘Sambistas pintores’, ao lado de Nelson Sargento, Sérgio Vidal e Heitorzinho dos Prazeres.

— Nossa proposta é reafirmar o valor do samba, cantando obras de Zé Ketti, Cartola, Paulinho da Viola, Guilherme de Brito, que também foi componente do grupo até falecer três anos atrás, e também as nossas composições. O que mais temos em comum é o amor pelo samba e pela pintura, e acreditamos que o importante é cantar o samba de raiz e não esse negócio que está na mídia dizendo que é samba. Essa coisa só serve mesmo é para quebrar a verdadeira música do povo — comenta o sambista.

— Temos feito muitos shows e estamos trabalhando para tentar gravar um disco. Acredito que será um grande sucesso, porque temos um repertório muito bonito, bem elaborado — diz Caramba, acrescentando que continua compondo seus sambas, mas que também ainda não gravou discos, apenas participações em trabalhos de outros artistas, e teve seus sambas gravados por outras pessoas.

— Assim tenho vivido. Também continuo participando de rodas de samba informais, até porque quando chego a algum lugar que tem música, logo me pedem para entrar na roda, o que serve para eu ter certeza que o povo quer mesmo é ouvir a música de raiz, a nossa cultura. A outra lhe é imposta pela maioria das rádios, que as tocam o tempo todo — comenta.

Wanderley Caramba também é professor, lecionando desenho e pintura em seu atelier e em um hospital infantil, para crianças enfermas (e também para seus pais).

— Vejo a arte, entre outras de suas funções, como uma terapia. Não posso curar ninguém porque não tenho poder para isso, mas posso ajudar através da arte. Da mesma forma me sinto feliz em passar meus conhecimentos para meus alunos no — finaliza Caramba, acrescento que também promove exposições em seu atelier.

Aqueles que desejarem cursar artes com Wanderley Caramba devem ligar para: (21) 2451-1185.
Para contratá-lo para shows, o telefone é (21) 8516-9086.

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