Monopólio dos transportes em Belo Horizonte planeja a demissão de 10 mil Rodoviários
Mário Lúcio
No início da implantação do sistema de bilhetagem eletrônica, no final dos anos de 1990, a BHTrans — Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte, órgão responsável pela gestão do sistema de transporte e trânsito, gastou milhões com propagandas encomendadas pelas sete famílias que monopolizam todo o transporte coletivo de BH e região. Foi lançada a demagógica campanha "BHbus, o futuro anda rápido", cujo foco principal foi desvirtuar e atacar o papel dos cobradores, que passaram a ser chamados de "agentes de bordo" preparando assim o campo para suas futuras demissões.
Caos do transporte público em Belo Horizonte pode piorar ainda mais
O laboratório para a instalação das catracas eletrônicas foi Betim, importante cidade industrial da Região Metropolitana. Em Belo Horizonte, os primeiros ônibus passaram a circular com a catraca eletrônica em 1999. Nesta data também se iniciou grande batalha dirigida pelo Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de Belo Horizonte e Região para garantir os empregos dos cobradores. Já naquela época, o sindicato denunciava que a intenção do monopólio dos transportes era implantar as catracas eletrônicas e por fim à função dos cobradores e despachantes.
De acordo com dados tabulados pelo Sindicato dos Rodoviários, entre 1996 e 2005, mais de 60% dos despachantes já haviam sido demitidos, e o número de cobradores sofreu sensível redução nas cidades vizinhas de Contagem e Betim, após a implantação dos microônibus sem cobrador.
— Esta vem sendo a política do monopólio dos transportes na Região Metropolitana. Eles aplicam uma série de medidas que prejudicam os trabalhadores: implantam a catraca eletrônica, microônibus sem cobrador, praticam banco de horas, violam a CLT, cometem todo tipo de crimes contra o trabalhador. O nosso Sindicato é radicalmente contrário a implantação de "tecnologias" que só servem para aumentar o lucro patronal e promover a demissão dos trabalhadores. — afirmou Denilson Dorneles, coordenador político do STTR BH.
Engodo eletrônico
Com a implantação do sistema de bilhetagem eletrônica o cobrador é substituído por um mecanismo leitor de cartões e validador de créditos, que desconta o valor da passagem quando acionado pelo usuário e registra a movimentação de passageiros no transporte coletivo urbano. Com a implantação deste sistema, a empresa Transfácil, de propriedade do monopólio do transporte coletivo de BH, situada no mesmo prédio do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano, passou a administrar os cartões de armazenamento de créditos de passagens, que substitui o pagamento em dinheiro e os vales-transporte.
Assim surgiu o cartão BHbus: artimanha das empresas de transporte que estipula o valor mínimo de R$ 5,50 para a aquisição da carcaça de um cartão que deverá ser recarregado com novos créditos nas estações e postos cadastrados.
Para tentar adoçar a boca da população e assim tentar impor o sistema em toda a rede de transporte coletivo metropolitana, as empresas bolam "promoções" como, por exemplo, dar "desconto" na segunda passagem quando o usuário faz dois deslocamentos consecutivos. No entanto, o vale-transporte, que era utilizado por milhares de pessoas como um complemento salarial diante do quadro de arrocho salarial, não pode ser usado em benefício da família do trabalhador, pois o sistema impõe o limite de seis viagens diárias com um cartão. Desta forma, o trabalhador não pode utilizar o cartão para toda a sua família.
Contrariando até mesmo a lógica consumista do capitalismo, que "permite" às pessoas adquirir produtos imediatamente e efetuar o pagamento à prazo, o usuário do transporte tornou-se um comprador que adquire o bem à vista e o utiliza a prazo. Sem meias palavras, ao utilizar o transporte, a população já terá depositado há muito o valor da passagem diretamente nos cofres das empresas com a compra antecipada dos créditos transporte.
O presidente da SPTrans — empresa do gerenciamento do transporte de São Paulo — Ulrich Hoffmann, em entrevista publicada no jornal Folha de São Paulo, do dia 14 de março de 2005, já dava a senha para este quadro quando afirmou que "a bilhetagem eletrônica tende a se expandir rapidamente, tristemente, tira os cobradores da história. Os validadores são mais baratos que os cobradores".
Por todo o país
Em Sorocaba, interior de São Paulo, as catracas eletrônicas começaram a ser implantadas em 1991 e simultaneamente foi anunciado que a "modernização" melhoraria os serviços e os preços das tarifas baixariam. Além disso ainda começaram a aparecer denúncias de furtos e negligência praticados pelos cobradores.
As empresas de ônibus veicularam campanhas para tranquilizar os cobradores e a população dizendo que eles seriam remanejados para outras funções, mas em 93 todos os cobradores estavam demitidos sem nenhum sinal de remanejamento.
Situações semelhantes à de Sorocaba estão se repetindo em diversas regiões do país. Em Goiânia, Santos, Maringá — dentre outras cidades — primeiramente os cobradores foram obrigados a vender cartões eletrônicos no interior dos ônibus e nos postos de venda. Depois que a maioria da população adquiriu-os e usava a bilhetagem eletrônica, a função dos cobradores foi extinta e ocorreram demissões em massa. Hoje, nestas cidades não existe mais a função de cobrador e os motoristas, além de se preocuparem com o trânsito são obrigados a exercer a função de cobrar e se preocupar com o controle de passageiros.
Recentemente esta mesma tática tem sido aplicada pelo monopólio dos transportes em Belo Horizonte.
— Trabalhadores tem vindo até o Sindicato denunciar a ocorrência de reuniões realizadas pela Transfácil nas empresas, como na São Dimas e Rodap, visando obrigar os cobradores a comercializar os cartões BHBus nos ônibus. Os patrões e BHtrans chegaram ao absurdo de estipular uma absurda e ilegal multa de quase um salário mínimo para quem não vender o cartão. A BH-Trans e os patrões não podem desviar a função dos cobradores e obrigá-los a efetuar comércio dos veículos. Vamos mobilizar os rodoviários e utilizar todos os recursos para impedir estes abusos — pontuou Denílson, acrescentando. — O nosso Sindicato já há muito tempo vem alertando os cobradores sobre as maléficas intenções da BHTrans e dos patrões. Eles implantaram as catracas eletrônicas, reduziram o número de veículos e de despachantes, demitiram pessoal de manutenção e escritório e agora fica ainda mais evidente a jogada patronal de acabar progressivamente com a função de cobrador como fizeram em outras cidades.
10 mil demissões à vista
Em novembro último foi divulgado mais um pacote de mudanças no sistema de transporte metropolitano de Belo Horizonte. O monopólio dos transportes anunciou o corte de mais de 300 ônibus que ligam 34 cidades da região metropolitana à capital sob a justificativa de "desafogar o transito". O pacote também prevê a implantação do sistema de bilhetagem eletrônica em toda a frota do transporte metropolitano no prazo máximo de um ano, o que poderá causar outras 10 mil demissões de trabalhadores nas funções de cobradores, despachantes, motoristas e funcionários administrativos.
O monopólio dos transportes de BH e região elaborou um complexo projeto com a implantação de estações e sub-estações de integração com vistas a reduzir drasticamente a já defasada frota de ônibus na cidade. Com a implantação das estações, o trabalhador não tem mais acesso direto dos bairros periféricos ao centro da cidade. Para atingir o centro, ele utiliza uma condução até a estação e outra da estação ao centro da cidade.
A propaganda do desafogamento do trânsito não condiz com o suplício da imensa massa de trabalhadores e estudantes que paga uma das passagens proporcionalmente mais caras do país e enfrenta filas, estações lotadas e ônibus superlotados para ir e voltar do serviço todos os dias. As estações de integração converteram-se em verdadeiros currais humanos, com uma frota reduzida ao ponto de os ônibus partirem com pessoas penduradas nas portas.
Motorista cumpre dupla função
Sindicato denuncia a dupla função
O STTR-BH tem denunciado constantemente as empresas de transporte que obrigam os trabalhadores a cumprir dupla função e desvio de função, que ferem frontalmente a CLT e os direitos dos trabalhadores.
— Empresas tentam a todo momento implantar microônibus sem cobrador em algumas linhas, e este fato só não se consumou até o momento devido às pressões do Sindicato e resistência dos trabalhadores — denunciou Denílson Dorneles.
O monopólio dos transportes visando o lucro máximo coloca em risco todos os ocupantes dos ônibus, descumprindo inclusive a lei municipal que obriga que todo ônibus tenha um cobrador.
Os motoristas são obrigados a cumprir uma série de funções que desviam sua atenção e prejudicam a sua saúde. Além de terem que se preocupar com o trânsito, com o embarque e desembarque de passageiros, eles têm que receber o dinheiro das passagens, dar o troco e anotar os dados de idosos e deficientes, isto além da pressão exercida pelas empresas para o cumprimento dos horários de partida e chegada. Estabelecidos.
— A bandeira do Sindicato é lutar sem trégua em defesa da profissão dos cobradores e por impedir que as empresas obriguem os motoristas a exercer a dupla função. Efetuar o controle do pagamento das passagens e recebimento de fichas (vale-transporte), controle do embarque de idosos, gestantes, verificação de carteiras, observações quanto ao embarque e desembarque de passageiros pelas portas especificadas, auxiliar o motorista em manobras mais delicadas do trânsito, receber reclamações e dar informações aos usuários, evitando que muitos problemas perturbem a atenção dos motoristas, constituem funções básicas dos cobradores dos ônibus, que não podem ser realizadas por uma máquina, como pretende o monopólio dos transportes —ressaltou Denílson.
Catraca eletrônica e desemprego
Ana Lúcia Nunes
Em novembro, as catracas eletrônicas começaram a funcionar no sistema de transporte coletivo de Brasília, DF. Todo o povo perde com o sistema e os rodoviários lutam para manter o emprego.
A União dos Rodoviários do Distrito Federal (URDF), movimento de luta dos rodoviários, tem organizado várias paralisações contra as catracas eletrônicas, demissões arbitrárias e as reformas da gerência FMI/Luiz Inácio.
No dia 8 de novembro, os rodoviários pararam a garagem da Viplan, em Sobradinho (DF), impedindo a saída dos ônibus na madrugada. Protestavam contra a instalação das catracas eletrônicas, demissão dos cobradores, violação de dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), contra o fim do direito de greve, pela regulamentação da profissão de motorista e contra as demissões injustas nas empresas.
Diretores do sindicato compareceram ao ato na tentativa de desmobilizar os rodoviários, mas o esforço dos pelegos foi em vão, deixando a categoria ainda mais revoltada.
No dia 29 do mesmo mês foi a vez da Viação Viva Brasília, na cidade satélite de Planaltina (DF). O estopim foi a demissão, por perseguição política, de um cobrador que havia participado da paralisação na Viplan e era ativo na URDF. A combativa manifestação parou a garagem da empresa até 6h. Mesmo com a polícia, o gerente e os pelegos do sindicato tentando desmobilizar a paralisação, os rodoviários cruzaram os braços.
A URDF promete continuar com paralisações até a reintegração dos funcionários demitidos arbitrariamente e o fim do sistema de catracas eletrônicas.
Em Brasília (DF), a catraca eletrônica foi instalada em mais de dois mil veículos. A mudança faz parte de um projeto maior, chamado de "Brasília Integrada", que vai unificar o transporte da capital — ônibus, metrô e microônibus. O objetivo do governo é criar terminais de integração, onde o passageiro paga uma passagem e utiliza diversos meios de condução. O grande inconveniente é o tempo perdido em espera de ônibus e baldeações.
O Sindicato dos Rodoviários do DF (filiado à CUT) está do lado de patrões e governo, apoiando a implantação do sistema. Bastou o governo anunciar que não haveria demissões, para o sindicato fazer coro pela catraca eletrônica, mesmo sem nenhuma garantia real de que os empregos serão garantidos. A experiência de outras cidades só mostrou que o sistema foi ruim para o povo e para a categoria, com milhares de demissões.