Todos os anos, a Universidade Sonoma State, na Califórnia, publica o índice do chamado "Projeto Censurado". Trata-se de uma lista dos 25 assuntos mais boicotados pelo monopólio dos meios de comunicação do USA. São aqueles temas que as grandes emissoras de TV e os grandes jornalões, comprometidos com o poder imperialista, mais se esmeram para manter por debaixo dos panos. Na edição de 2008 do "Censurado", relativo ao que aconteceu no ano de 2007, pode-se ver na sétima posição do ranking o ítem "Por trás da Blackwater Inc".
Cartaz na entrada do centro de treinamento de Blackwater
Para medir as notícias mais sonegadas aos cidadãos do USA pelos veículos de massa ao longo de um ano, professores da Sonoma State enumeram os assuntos mais divulgados em pequenas emissoras de rádio e de TV, veículos alternativos da internet e em pequenas publicações voltadas para as classes populares. A sétima novidade mais difundida por estes veículos no ano passado — e a mais censurada pelos jornalistas e donos da grande imprensa — foi o lançamento do livro Blackwater: A ascensão do mais poderoso exército mercenário do mundo, do jornalista Jeremy Scahill.
Scahill, jornalista de um programa de rádio e TV chamado Democracy Now!, investigou o que chama de "nossos mercenários no Iraque": cerca de 20 mil indivíduos contratados pela administração Bush que compõem no Iraque a maior base militar privada do planeta, todos funcionários da Blackwater Security Consulting. Em uma palavra, mercenários. Mercenários que contam com a logística nada modesta de uma central de inteligência e uma esquadrilha de dezenas de aviões e helicópteros para reprimir o povo iraquiano.
Opressão militar privatizada
A Blackwater é uma empresa pioneira. Ela abocanhou os primeiros contratos ditos de "segurança" da estratégia ianque de dominação mundial pela via de aparatos militares privatizados — estratégia concebida pela nata da intelectualidade reacionária dos USA, ligada ao mesmo tempo ao poder dos monopólios ianques e ao alto escalão da administração Bush, o que no fim das contas dá no mesmo.
Estes objetivos estão esquadrinhados no "Projeto para um Novo Século Americano" (PNAC, na sigla em inglês), elaborado em 1997 por gente como Dick Cheney, Donald Rumsfeld e Paul Wolfowitz. No ano 2000, pouco antes das eleições ianques, a mesma laia redigiu um documento chamado "Reconstruindo as defesas americanas: estratégia, forças e recursos para um novo século". O texto lançou as bases dos rearranjos da estratégia imperialista do USA para o século XXI. As condições para que o império passasse a terceirizar sua máquina assassina estavam criadas.
Hoje, são contratos de até 500 milhões de dólares, como aquele assinado com o Pentágono para, entre outras "missões", cercar de mercenários assassinos o perímetro da embaixada ianque em Bagdá, escolta de autoridades no Iraque e operações de apoio ao exército do USA no Oriente Médio. Quando pessoas foram torturadas, humilhadas e ridicularizadas na prisão de Abu Ghraib, mercenários da Blackwater puderam ser vistos nas imagens que vazaram e correram o mundo.
'Diversificar os negócios'
Caso alguma universidade brasileira se disponha a fazer um levantamento dos assuntos que mais são escondidos do povo pelo monopólio dos meios de comunicação, certamente iríamos nos deparar com uma notícia sobre a Blackwater que envolve o nosso continente e, por conseguinte, nosso país.
A notícia é a seguinte: a maior fornecedora de mão-de-obra paramilitar para a administração Bush está de olho grande na América Latina, que vê como "mercado futuro". E quem diz isso é o mesmo Jeremy Scahill que escreveu o livro que desnuda magistralmente os negócios escusos entre o governo ianque e a companhia dita de "serviços de defesa independentes".
Scahill diz que a Blackwater está em ascensão meteórica desde os acontecimentos de 11 de setembro de 2001, e está se convertendo em um dos poderes mais influentes sobre o complexo militar-industrial do USA. Em declarações à agência de notícias EFE no início do último mês de maio, ele disse que a empresa de mercenários conseguiu lucros recordes nos últimos dois trimestres, o que vem animando sua direção no sentindo de "diversificar os negócios", por assim dizer.
Como se sabe, a moderna empresa capitalista não pode parar, não pode arrefecer em sua sanha de reproduzir o dinheiro, não pode se contentar com ótimos resultados financeiros em mercados consolidados, sob pena de espantar investimentos, ver reduzir o valor de suas ações e cair no limbo da suspeita de estagnação que assombra as companhias que não conseguem apresentar ganhos com razão exponencial a cada prestação de contas.
Por isso a Blackwater estaria buscando "se adaptar a novas realidades", o que, segundo Jeremy Scahill, passaria por estender sua área de atuação até a América Latina. Talvez os executivos da empresa ianque tenham se animado com a longa história de repasse de dinheiro do USA aos paramilitares da Colômbia que há décadas aterrorizam o povo daquele país.
Pois foi exatamente um plano "contra as drogas" a ser implementado no México e na própria Colômbia que o Pentágono encomendou à Blackwater, acenando com um primeiro contrato de nada menos do que 15 milhões de dólares para a contratação de mercenários recrutados nos países do continente.
Lula faz negócio com os mercenários
"O futuro passa pelo treinamento e pela preparação de militares latino-americanos, com o objetivo de ter pequenas equipes paramilitares trabalhando para estas empresas na América Latina", diz Scahill.
Sim, "estas empresas", porque a Blackwater é a maior e mais sanguinária, mas não é a única prestadora de serviços mercenários para os fins imperialistas do USA. Existem ainda a britânica Aegis e as americanas Triple Canopy, Zapata, Titan e CACI, entre outras.
Nem tampouco o Iraque é o único teatro de operações da Blackwater, o que mostra que a disposição para "diversificar os negócios" já está a todo vapor. Além do Pentágono, a CIA também já se vale de seus serviços paramilitares para reprimir o povo do Afeganistão. Em 2005, depois de o furacão Katrina devastar a cidade de Nova Orleans, os mercenários contratados pela empresa foram deslocados para a área afetada ao custo de 950 dólares por homem, pagos com dinheiro público do USA a fim de conter a revolta de seu próprio povo.
E uma notícia ainda mais fresca sobre a Blackwater envolve diretamente a gerência Luiz Inácio. No dia 25 de fevereiro deste ano, o Estado brasileiro entregou uma encomenda feita pela empresa. O produto? Um avião militar Super Tucano. A aeronave foi vendida na surdina pela Embraer para esta firma de contratação de assassinos que vem sendo investigada pelo próprio Congresso do USA. O negócio contou com autorização expressa da presidência da República depois de contatos diretos com o governo ianque.
Noves fora a imoralidade óbvia, a legislação brasileira proíbe a venda de equipamentos militares para empresas particulares e para uso em guerras ou conflitos já existentes quando do momento da negociação.
A subserviência de Luiz Inácio ao imperialismo realmente não conhece limites.