Camponês no campo se levanta,
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Se o camponês não planta,
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Camponeses em protesto na capital mineira seguem até o Tribunal de Justiça.
Delegações de camponeses representando aproximadamente quarenta áreas do Norte de Minas Gerais e do Triângulo Mineiro desembarcaram em Belo Horizonte na manhã de 9 de setembro. Com suas bandeiras vermelhas, perfilaram-se e entoaram palavras de ordem.
À frente, uma grande faixa: “Terra para quem nela trabalha”.É o grito de resistência de centenas de famílias que vivem e trabalham em suas terras há mais de uma década, algumas mais de quinze anos, ameaçadas de despejo por ordens expedidas pela Vara de Conflitos Agrários. Tamanho é o número e a celeridade com que as ordens de reintegração de posse contra os camponeses são emitidas, que o juiz titular da Vara, Octávio de Almeida Neves, foi denunciado ao Conselho Nacional de Justiça — CNJ por descumprir os ritos processuais e apressar o despejo de camponeses.
Luta camponesa agita a capital
A primeira parada foi no Fórum Lafayette, região central da capital, onde está localizada a Vara de Conflitos Agrários. Lá os camponeses protocolaram um documento denunciando as ameaças de despejo e o papel da Vara de Conflitos Agrários contra os pobres do campo.
Estudantes mobilizados pelo Movimento Estudantil Popular Revolucionário (MEPR), membros do Sindicato dos Trabalhadores da Construção de Belo Horizonte (Marreta), ativistas da Frente Revolucionária de Defesa dos Direitos do Povo (FRDDP), do Movimento Feminino Popular (MFP) e da Liga Operária somaram-se ao protesto em apoio aos camponeses, erguendo também as bandeiras e reivindicações dos protestos populares que ocorrem em todo o país desde o mês de junho. Somaram-se às consignas da luta pela terra as palavras de ordem da FRDDP: “Abaixo o velho Estado e seus governos antipovo e vende-pátria” e “USA, tire suas garras da Síria!”. Um operário carregava um banner exigindo resposta das “autoridades” e da polícia do Rio de Janeiro: “Cadê o Amarildo?”.
Quando a manifestação passou diante da 3ª Área Integrada de Segurança Pública, foi dada palavra aos estudantes, que denunciaram a brutal repressão policial desencadeada contra os manifestantes no 7 de setembro na capital. Ativistas do MEPR denunciaram o espancamento e prisão de dezenas de manifestantes, sendo que quinze deles permaneciam presos até aquele momento.
O protesto seguiu até o Tribunal de Justiça, onde foram feitas denúncias dos ataques do judiciário contra os camponeses em luta pela terra.
— Não foram poucas as vezes que, após muita luta, conseguimos derrubar liminares de reintegração de posse que depois foram mantidas por esse Tribunal – denunciou um orador da LCP.
Rumo ao Incra.
Com o apoio do carro de som do Marreta, as palavras de ordem ecoaram pelas ruas de Belo Horizonte, chamando a atenção dos trabalhadores e transeuntes, parando o trânsito do centro da capital.
Incra ocupado
Sem hesitação, o Incra foi ocupado e a presença do superintendente regional foi exigida.
Apenas um funcionário do Instituto se apresentou e disse que o superintendente Danilo Araújo Prado estava viajando.
Sem negociação mantém-se a ocupação. Rapidamente os camponeses dividiram-se em comissões para cuidar da limpeza, segurança, comunicação, controle da portaria, alimentação, entre outras tarefas.
A reportagem de AND foi convidada para permanecer com os camponeses. O blog e o Facebook do jornal transmitiram em tempo real cada passo da ocupação.
Ainda pela manhã, outra delegação de camponeses organizados pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Minas Gerais — Fetaemg e MST somou-se a ocupação. Nada do superintendente.
Danilo Araújo chegou de viagem à noite e fez contato por telefone chamando representantes dos camponeses para “conversar numa lanchonete”, o que foi prontamente rechaçado pelos ocupantes que exigiram sua presença na superintendência. Ele então pretendeu impor a desocupação do Incra como condição para receber uma comissão de camponeses. Ameaçou pedir a reintegração de posse da sede do Instituto. Nada feito.
Cobrado por uma comissão de camponesas, Danilo Araújo quis se esquivar, alegando que o Incra de Brasília não o havia autorizado a reunir-se com os camponeses. Que dirá então dar solução às suas demandas?
Os camponeses exigiram a presença do Incra Nacional e da Ouvidoria Agraria Nacional, na pessoa do desembargador Gercino José da Silva Filho, para tratarem de suas reivindicações. O Incra “dormiu” ocupado.
Na manhã de 10 de setembro, notícias dos jornais sobre a manifestação e a ocupação do Incra foram lidas e saudadas por todos com palmas e exclamações. Um camponês propôs que bloqueassem a Avenida Afonso Pena em frente ao Incra de hora em hora até que fossem atendidos. Aplausos e aprovação. O primeiro bloqueio da avenida ocorreu às 11 horas.
Organizações populares e sindicatos mobilizaram-se para garantir a alimentação e apoio aos camponeses. Uma comissão da ocupação foi destacada para participar de uma reunião da Comissão de Direitos Humanos na Assembleia Legislativa e expor suas denúncias e reivindicações.
Após o almoço, os camponeses reuniram-se em nova assembleia. Representantes das áreas falaram de suas lutas e demandas, relataram como têm se organizado, expuseram os problemas que têm enfrentado, destacaram a necessidade de se organizarem mais para lutas maiores. Apoiadores e dirigentes sindicais também fizeram uso da palavra. Falaram da necessidade do fortalecimento da aliança operário-camponesa para impulsionar a Revolução Agrária e deixaram mensagens de solidariedade e apoio a resistência e luta camponesa. Coordenadores da LCP exaltaram as jornadas de luta de julho no interior, os vitoriosos bloqueios de estrada que contribuíram para derrubar a liminar de reintegração de posse que ameaçava a área Vitória, em Varzelândia, antiga Cachoeirinha, palco de heroica resistência camponesa. Exaltaram também a necessidade de levantar mais alto a bandeira da Revolução Agrária para destruir o latifúndio, conquistar a terra para os camponeses e promover transformações radicais no campo em nosso país.
Os camponeses retomaram a discussão sobre o objetivo da ocupação. Se tivessem simplesmente entregado um papel com a pauta de reivindicações ao representante regional do Incra ele não daria respostas aos problemas dos camponeses. Com a manifestação e a ocupação do Instituto, com o abandono do superintendente de suas funções e sua recusa em receber a pauta dos camponeses, foi demonstrada a justeza da linha da Liga dos Camponeses Pobres, que sempre alertou os camponeses para não alimentarem ilusões com o velho Estado. “Seguir aplicando a linha do movimento camponês combativo de tomar as terras do latifúndio, promover o corte popular, entregar as terras aos camponeses e avançar com a produção coletiva” – como afirmou um orador da LCP.
Na noite de 10 de setembro foi decidida a desocupação do Incra.
Em nota, LCP do Norte de Minas e Bahia e a Comissão de Associações e movimentos da ocupação do Incra declararam:
“Denunciamos que este senhor [o superintendente Danilo Araújo]abandonou seu posto, além de demonstrar medo e falta de respeito para com os camponeses. Nos negamos a reconhecer a condição de superintendente de uma pessoa que propõe receber camponeses em ‘lanchonetes’.
Exigimos que a pauta de reivindicações de pelo menos quarenta áreas do Norte de Minas e do Triangulo Mineiro seja respondida, pela Ouvidoria Agrária Nacional e pelo INCRA Nacional, até o próximo dia trinta de setembro.
A pauta de reivindicações, que o superintendente Danilo se negou a receber, já foi enviada a estes órgãos e divulgada para a imprensa.
Viva a luta pela terra!
Viva a união dos camponeses do Norte de Minas!
Abaixo a criminalização da luta pela terra!
Abaixo as criminosas reintegrações de posse!
Ousar lutar, Ousar Vencer, o camponês quer plantar e quer colher!
Viva a Revolução Agrária!
Liga dos Camponeses Pobres do Norte de Minas e Bahia
Comissão de Associações e Movimentos da Ocupação do INCRA nos dias 09 e 10 de setembro de 2013.”