Após dois meses em greve de fome, os presos políticos mapuches levantaram o protesto após decisões judiciais favoráveis a seus casos penais. Nove presos políticos mapuches estiveram em greve de fome no Chile. Quatro deles começaram o protesto em 27 de agosto, no presídio de Angol, sul do país. Os outros cinco, presos em Temuko, também sul do Chile, deixaram de se alimentar a partir do dia 01 de outubro.
No dia 25 de outubro, os quatro presos de Angol voltaram a se alimentar, após conseguirem uma grande vitória em seus casos. Daniel Levinao teve o julgamento cancelado e Paulino Levinao deve ser libertado imediatamente. No dia 23 de outubro, os cinco presos em Temuco também deixaram a greve de fome, após a promessa de que seriam trasladados ao Presídio de Angol no dia 25, o que foi efetivado sem incidentes.
A situação de saúde dos prisioneiros era crítica no fim da greve de fome, sendo que a maioria deles havia perdido entre 8 e 11kg. Leonardo Quijon, de 20 anos, sofreu uma parada cardíaca no dia 20 de outubro e foi hospitalizado em Concepción. Os presos en Angol estiveram hospitalizados por vários dias em Concepción e o traslado entre o presídio e o hospital foi marcado por polêmicas, já que não foi autorizado pelo judiciário e feito contra a vontade dos presos, colocando em risco a integridade física dos mesmos. No dia 22 de outubro, os presos em Temuco foram hospitalizados em caráter de urgência.
Os presos
Estavam presos em Angol: Erick Montoya, Rodrigo Montoya, Paulino Levipan e Daniel Levinao. Os mapuches, que se consideram presos políticos do Estado chileno, reivindicavam a anulação do julgamento de Paulino Levipan e Daniel Levinao, o fim da utilização de testemunhas não identificadas nas causas contra os mapuches, o fim da violência policial contra suas comunidades, a desmilitarização dos territórios mapuches e o reconhecimento de seu direito à terra. Erick e Rodrigo Montoya são acusados de porte ilegal de armas, munições e de tentativa de homicídio contra policiais. Paulino e Daniel foram condenados a 10 anos de prisão pelo mesmo motivo.
Do presídio de Angol, no dia 23, os presos políticos declararam que “nos levantamos com uma voz cheia de força. Lutamos pela recuperação das terras que nos tiraram, para ser dignos desse povo que com valentia e sangue a defendeu através da história. Queremos dizer que ainda que estejamos privados de liberdade, em nossas veias corre o sangue guerrreiro que jamais vencerão. As correntes que levamos não nos intimidam. Avançaremos defendendo nosso direito à vida e responsabilizaremos o Estado chileno, encabeçado por Piñera, de nos negar o direito a um processo justo, à presunção da inocência e a respeitar os acordos internacionais que assinaram para a proteção do nosso povo. Continuaremos em resistência para defender nosso direito porque não é um direito só nosso, mas dos filhos e das gerações mapuches que virão para seguir lutando pela terra que nos roubaram. Porque nem a prisão, nem a morte deterão nossa luta pela liberdade e território de nosso povo nação mapuche“.
Os quatro presos políticos encarcerados em Angol, Chile
Estavam no presídio de Temuco: Leonardo Quijon e Luis Marileo, acusados de tentativa de homicídio contra um candidato a prefeito em Ercilla; Fernando Millacheo, Guido Bahamondes e Cristian Leviano, acusados de assalto. Eles exigiam a transferência do presídio de Temuco para Angol, onde ficariam mais próximos às famílias e o fim das revistas humilhantes impostas a familiares e amigos que os visitam.
Inicialmente, os presos em Temuco receberam como resposta às reivindicações protocoladas frente à direção do presídio que “como se trata de uma prisão política, não está ao nosso alcance resolver a situação”. Frente a essa resposta, no dia 19 de outubro, eles radicalizaram suas ações, promovendo uma greve de fome seca, deixando de ingerir qualquer tipo de líquido.
Em carta ao povo chileno, os presos em Temuco afirmaram que a situação a que são submetidos pelo estado chileno “são estratégias usadas pelo Poder para calar nossa luta e resistência” e que exigem um tratamento diferenciado às visitas, já que é de conhecimento público que eles estão presos “por causas de caráter político e não de conflito legal”.
Apesar de cada grupo ter demandas próprias, a luta dos nove presos políticos era conjunta e se refere a um cenário maior de resistência do povo mapuche e de retorno aos territórios que historicamente lhes pertence. Os presos de Temuco iniciaram sua greve de fome em apoio aos presos em Angol. Outros presos políticos mapuches, principalmente os do presídio Los Ríos, também na região da Auracanía, sul do Chile, fizeram greve de fome em protesto e apoio a seus companheiros de Angol e Temuco.
Manifestações
As manifestações em apoio à causa mapuche tem sido cotidianas em Concepción e Santiago e se espalhado por outras partes do país, principalmente ao sul, onde a resistência mapuche se concentra. Na última marcha em apoio à greve de fome mapuche, mais de mil pessoas participaram do protesto em Temuco. No mesmo dia, em Osorno, a Catedral Metropolitana foi ocupada por comuneros mapuches. No dia anterior, a polícia reprimiu e impediu uma manifestação em Concepción.
No dia 19 de outubro, cerca de cem pessoas marcharam por Concepción em apoio à greve de fome. Quando avançaram até o centro da cidade, bloquearam a passagem de uma avenida e foram reprimidos com gás lacrimogênio pela polícia. Dez pessoas foram presas, dentre elas crianças e a mãe e a irmã de um dos presos políticos. No dia 17, outra marcha no mesmo local resultou em quatro presos.
Ainda no dia 17, estudantes da Universidad de Concepción realizavam um protesto pacífico em apoio aos grevistas, quando a polícia chegou com jatos de água e gases. Os estudantes se refugiaram na Universidade, mas os enfrentamentos continuaram. No dia seguinte, estudantes da Universidad de La Frontera de Temuco, colocaram fogo em pneus e propaganda eleitoral – as eleições municipais no país ocorreram no dia 28 de outubro.
No dia 16, uma massiva marcha pela cidade, deixou bancos e empresas multinacionais com os vidros quebrados, além da prefeitura da cidade. Quatro pessoas foram presas, sendo que duas delas eram mães de presos mapuches. Nesse mesmo dia, o gerente de turno, Sebastián Piñera, esteve em Ercilla, cidade onde se concentra a resistência mapuche, e discursou sob vaias.
No dia 15 de outubro, “dia da raça”, os chilenos realizaram uma grande manifestação pelas ruas de Santiago e de Valdívia. Segundo a polícia, grandes redes de bancos internacionais foram saqueadas, 16 pessoas foram presas e 6 policiais ficaram feridos.
No dia 12, 300 pessoas marcharam pelas ruas de Osorno, sul do país, e recordaram os cem anos do massacre de Forrahue, no qual 15 pessoas foram assassinadas. No mesmo dia, 200 pessoas protestaram nas ruas de Temuco. No dia anterior, 200 pessoas também haviam protestado em Concepción.
A luta mapuche
Durante os últimos anos, os mapuches vêm se organizando para recuperar seus territórios usurpados, principalmente durante o gerenciamento militar no país (1973 a 1990), e para defendê-lo da contaminação realizada por mineradoras e do desmatamento provocado pelas madeireiras. Diante do avanço da luta mapuche, o Estado chileno vem procurando incriminá-los de todas as formas. Verdadeiras montagens são promovidas para acusar os militantes da causa de tentativas de homicídio, incêndios e diversos tipos de atentados e enquadrá-los na lei antiterrorista, que remonta a Pinochet.
A maioria das áreas reivindicadas pelos mapuches estão na região da Auracanía, localizada no extremo sul e uma das mais pobres do país.