Como A Nova Democracia denunciou nas últimas duas edições, o Choque de Ordem promovido pelo prefeito Eduardo Paes segue investindo brutalmente contra moradores de rua, trabalhadores ambulantes e comunidades carentes. Revoltado, o povo intensifica os protestos e a Resistência.
Agentes da prefeitura agridem camelô
Março e abril também foram meses duros para aqueles que trabalham e também para os que dormem nas ruas da cidade. Mais uma vez a operação "Choque de Ordem" atacou impetuosamente os direitos do povo.
Em 8 de março a PM e a Guarda Municipal estiveram no Aterro do Flamengo e impediram centenas de ambulantes de trabalhar. Cerca de 40 moradores de rua também foram retirados do local e levados para masmorras que as gerências estadual e municipal insistem em chamar de abrigos. Dois ambulantes que tiveram a mercadoria roubada protestaram e foram presos.
Sobre o roubo de mercadorias, praticado em todas as ações do Choque de Ordem contra vendedores ambulantes, Rodrigo Bethlem, o Secretário de Ordem Pública, isentou-se da culpa e disse o que será feito com o modesto material apreendido.
— Essas mercadorias vão ser leiloadas rapidamente. Já é gasto muito dinheiro dos cofres públicos para que essas pessoas cometam irregularidades e fiquem impunes — disse o xerife referindo-se a trabalhadores pobres e honestos.
No olho da rua
Em 10 de março equipes da prefeitura, juntamente com a PM, foram ao morro Pavão-Pavãozinho, na Zona Sul da cidade e destruíram um prédio localizado em um terreno de 5 mil metros quadrados. As razões apresentadas pela prefeitura para a ação foram as reclamações de moradores de Copacabana, bairro nobre da cidade, referentes ao barulho excessivo no local. Cerca de 20 pessoas ficaram sem moradia e não receberam nenhum tipo de indenização. O proprietário do prédio ainda acabou preso ao contestar a ação.
Na Lapa, o Choque de Ordem atacou no dia 12 de março. Os agentes da Prefeitura roubaram sete barracas, mesas e cadeiras de ambulantes e "recolheram" 19 moradores de rua. As ações na Lapa também estão ligadas ao projeto "Lapa Legal", anunciado pela oportunista Jandira Feghali (Pecedobê) durante o Fashion Rio — milionário evento de moda realizado todos os anos no Rio de Janeiro. O "Lapa Legal", assim como o Choque de Ordem, visa reprimir trabalhadores informais, moradores de rua e ocupações por moradia.
Continuam os protestos
A resposta dos trabalhadores informais e sem moradia foi rapidamente preparada e no dia 13 de março cerca de 500 manifestantes realizaram um grande protesto no entorno da Central do Brasil, no Centro da cidade. O advogado da Fist (Frente Internacionalista dos Sem-teto) — uma das entidades que participaram do ato — André de Paula foi enfático:
— Repudiamos essas ações. O que ele [o prefeito] deveria fazer é uma reforma urbana e desapropriar os prédios vazios para abrigar essas pessoas — questionou, referindo-se aos ataques às ocupações por moradia, promovidos pela Prefeitura.
Dentre as principais reivindicações dos trabalhadores está "a regularização do comércio informal e fim dos roubos de mercadoria pela Guarda Municipal" e também políticas de geração de empregos.
Mesmo assim, as ações continuaram acontecendo e em 15 de março, no entorno do Maracanã, ambulantes mais uma vez foram impedidos de trabalhar. Um casal que resistiu a apreensão do seu material foi preso e algemado. Outros onze homens que trabalhavam guardando carros também foram detidos. No domingo seguinte dois trabalhadores foram detidos, cerca de 350 latinhas de bebidas foram roubadas, além de 40 camisas, 27 bandeiras de clubes, 176 capas de chuva e 10 guarda-chuvas.
Materiais de trabalho de camelôs são apreendidos
Nos fins de semanas seguintes, as operações do Choque de Ordem continuaram acontecendo no entorno do Maracanã. No sábado (28), várias apreensões foram feitas, dentre elas estava uma enorme carrocinha de churrascos, que pertencia ao comerciante Joaquim José Pinto. Ele trabalha há 20 anos em frente ao bar Luiz Gama, na rua de mesmo nome e criticou duramente o Choque de Ordem.
— Esse Choque de Ordem não existe, porque só está prejudicando quem trabalha. Eu, por exemplo, tenho 56 anos. Aonde vou arrumar outro trabalho? Eu dependo disso para sobreviver e só sei fazer isso. Sempre trabalhei de cozinheiro, então eu só sei fazer comida. Qual restaurante vai querer contratar um homem de 56 anos? — questiona indignado.
Pesquisas revelam que habitações em áreas pobres são o foco das demolições
Na manhã de 25 de março, após uma longa batalha judicial entre Prefeitura e Associação de Moradores da Rocinha, desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro autorizaram a demolição de um prédio de dois andares no alto da favela. O edifício conhecido como "Minhocão" teve sua obra embargada uma semana antes, quando o Secretario Municipal de Ordem Pública, Rodrigo Bethlem, alegou que desde 1992 está proibida por decreto qualquer tipo de construção que aumente os limites do morro da Rocinha, o maior do Rio de Janeiro e um dos maiores do mundo.
Bethlem declarou que o edifício seria obra de empresários interessados em especulação imobiliária. Acontece que a proprietária do "Minhocão", Maria Clara dos Santos, está longe de ser uma "empresária especuladora", como a escória de construtoras que financiaram em grande parte a milionária campanha de Eduardo Paes (Ver AND 51 – A história indiscreta do prefeito do Rio de Janeiro). Ao contrário disso, Maria Clara estudou até a 4ª série do ensino fundamental e jamais morou em outro lugar que não a favela da Rocinha. O "Minhocão" seria a primeira edificação erguida por ela com o próprio dinheiro.
Desesperados, Maria Clara e membros da Associação de Moradores da comunidade ofereceram o prédio à Prefeitura para que fosse transformado em um Posto de Saúde para moradores da Rocinha. Obviamente a proposta foi recusada e momentos depois operários da Prefeitura começaram a demolição à marretadas, ação acompanhada de perto por Bethlem, que foi duramente hostilizado por centenas de moradores e teve que se retirar da favela sob escolta da Tropa de Choque da PM.
Curiosamente, pesquisa realizada pelo IPP (Instituto Pereira Passos), revelou o foco da operação Choque de Ordem, especificamente no que diz respeito à sequência de demolições realizadas todas as semanas em diversas favelas da cidade.
A pesquisa, que analisou todas as habitações construídas acima dos 100 metros de altitude, mostra que 69,7% das encostas da cidade, ou 11,7 milhões de metros quadrados, é ocupada por condomínios de mansões e casas de luxo. Números que se invertem na análise da quantidade de habitantes e do tamanho das demais regiões: as favelas. Os dados mostram que do total de indivíduos morando nas regiões acima dos 100 metros, 73,5% moram em bairros pobres, enquanto o restante deleita-se na área nobre sem ser incomodado pela Prefeitura.