“Criminalizar os que lutam pela terra visa encobrir o fracasso da reforma agrária do governo Lula”

“Criminalizar os que lutam pela terra visa encobrir o fracasso da reforma agrária do governo Lula”

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A Liga Operária, de Belo Horizonte nos envia — juntamente com um texto publicado pelo Estado de São Paulo, em 7 de setembro último — uma nota em que denuncia o referido jornal. Diz a Liga Operária que, a pretexto de fazer uma entrevista, aquele jornal pôs em execução nada menos que uma grotesca provocação, buscando associar pessoas e entidades de trabalhadores no sentido de atribuir-lhes crimes. Segue uma nota da Liga Operária , datada de 14 de setembro.

Na terça-feira, 7 de setembro, o jornal O Estado de São Paulo publicou matéria sob o título Ligas Camponesas buscam confrontos em Minas. No subtítulo, destaca que métodos agressivos e falta de lideranças preocupam o Incra e o Instituto de Terras do Estado. A Liga Operária se solidarizou e fez eco às denúncias dos camponeses organizados pela Liga dos Camponeses Pobres do Centro Oeste, que foram violentamente atacados pela Policia Militar de Minas Gerais no dia 19 de agosto, quando do despejo das 80 famílias acampadas na Fazenda Salitre. Para defender o conhecido grileiro de terras e decadente latifundiário Alaor Ribeiro de Paiva, alinharam-se a justiça, representantes dos governos municipal, estadual e federal, uma milícia particular armada e, como último reforço, tropas da Polícia Militar.

Do outro lado estavam 150 pessoas, a maioria mulheres, jovens e crianças, cansados de promessas, que lutavam por um pedaço de terra para dele extrair, com o suor do seu trabalho, o seu sustento. Em sua defesa, os camponeses contavam com sua disposição de luta e sua organização, a Liga dos Camponeses Pobres.

No conflito entre os interesses de um latifundiário e os interesses das 80 famílias de camponeses pobres, 300 policiais militares, com cães, armas, helicópteros e farta munição foram lançados contra os camponeses. Os camponeses foram acusados de ter lançado mão de coquetéis molotov para deter o ataque policial e os “negociadores” do INCRA (Instituto de Colonização e Reforma Agrária) e do ITER (Instituto de Terras, órgão do governo do Estado de Minas Gerais) culparam os camponeses pelo confronto.

Como é possível que 150 camponeses desarmados sejam considerados culpados por confrontar 300 policiais fortemente armados? Como podem ser agora processados por tentativa de homicídio se dezenas deles foram alvejados por tiros disparados pela PM?

Repete-se a mesma condenação: o povo é sempre o culpado pelas agressões que sofre.

Desde o primeiro momento, guiada por seus princípios, a Liga Operária manifestou integral solidariedade aos camponeses da Fazenda Salitre, denunciando mais este ataque covarde do Estado podre e reacionário contra o povo em luta por seus direitos.

Idêntica posição tomou a Liga quando da retirada violenta dos camponeses da Fazenda Guiné, em Montes Claros, no primeiro semestre deste ano; quando denunciou o latifúndio e o conluio do Estado pela morte dos fiscais do Trabalho em Unaí; quando participou da campanha pela libertação do líder camponês José Rainha; quando foi solidária com os camponeses organizados pelo MST em Buritis quando estes foram presos pela Policia Federal após ocupar a fazenda do então presidente da República FHC etc.

A Liga não se furta em defender, independente de que consequências possam ter, os interesses das massas camponesas, particularmente das pobres. A Liga Operária não abre mão de defender a luta popular, a luta pela “terra para os que nela trabalham”.

O governo Lula/FMI suspendeu todos os processos de desapropriação de terras. Ao decidir pela compra, pagando praticamente à vista, enterrou de vez a Reforma Agrária. Permanece inalterada a legislação de FHC que criminaliza a luta pela terra, legislação que foi manejada abertamente pela primeira vez no governo Lula em julho de 2004 pelo Ouvidor Agrário Nacional, Gercino José da Silva Filho, quando chamou camponeses de Rondônia para se reunir no quartel da Policia Militar, e depois enviou correspondência ameaçando aos camponeses de utilizar contra eles o decreto fascista de FHC. E é numa reportagem do próprio O Estado de São Paulo, de 2 de setembro de 2004, quando trata da criação de uma Justiça Agrária Federal, que é revelado o porquê do governo Lula estar utilizando este instrumento de repressão: “No Palácio do Planalto uma luz amarela se acendeu nos últimos dias com as dificuldades enfrentadas pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário para cumprir a meta de assentamentos no País. O governo já foi alertado de que, com o anúncio e o reconhecimento de que faltarão recursos para que sejam assentadas as 115 mil famílias até dezembro, certamente as ‘invasões’ serão intensificadas.”

Ou seja, diante de seu fracasso, o governo Lula utiliza uma legislação que o próprio PT condenava quando oposição, e mira naqueles em que reconhece atitude moral para não se dobrar diante de tanta infâmia.

E para que todos possam tirar suas próprias conclusões, enviamos junto com esta nota tanto a reportagem do jornal O Estado de São Paulo do dia 7/09/2004, como também as perguntas e respostas feitas por correio eletrônico à Liga Operária, respondidas em 27/08/2004, cuja atitude de as desconsiderar demonstra o caráter de provocação da matéria assinada pelo jornalista Eduardo Kattah. É pública e notória a condição de porta-voz do que existe de mais reacionário no país, em particular do sistema latifundiário, que almeja e persegue o jornal O Estado de São Paulo. Mas reconhecendo que o latifúndio tem sido prestigiado e defendido como nunca pela gerência LuIa/FMI, este arqui-reacionário porta-voz da causa antipovo patrocina mais uma cruzada de criminalização da luta camponesa para justificar uma nova onda de repressão aos movimentos de luta pela terra, incluindo aí a perseguição à nossa organização.

Leia na íntegra a matéria publicada pelo O Estado de São Paulo na terça-feira,7 de setembro de 2004

Ligas camponesas buscam confrontos em Minas Métodos agressivos e falta de lideranças preocupam o INCRA e o Instituto Terras do Estado
Eduardo Kattah
Belo Horizonte – Com sua estratégia agressiva,destinada quase sempre a provocar confrontos,as chamadas ligas camponesas que atuam na zona rural de Minas preocupam cada vez mais as autoridades.Neste ano já foram registrados dois conflitos com integrantes das ligas,durante a desocupação de fazendas invadidas. Vinculados à Liga Operária,organização de extrema-esquerda,de inspiração maoísta,os grupos atuam principalmente na região norte.No ano passado passaram também a ocupar áreas no Alto Paranaíba e noroeste mineiro.Além da violência,uma das características que chamam a atenção nos grupos é a falta de lideranças.Segundo representantes do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)e do Instituto de Terras de Minas Gerais (Iter-MG),isso atrapalha o diálogo com as autoridades e as negociações.

Polícia – “A Liga está indo para o confronto “,diz o superintendente do Incra em Minas, Marcos Helênio.”O Incra tem a obrigação de mediar conflitos e defender a reforma agrária.Questões de criminalidade,armas,são para a Polícia “. Ex-deputado estadual pelo PT e ligado aos movimentos de reforma agrária,Helênio não esconde a preocupação “.Estão tentando criar um braço agrário,mas a historia da Liga é operaria,urbana.”

Composta por sindicatos que formavam o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR —8)e a antiga Central Geral dos Trabalhadores (CGT),a Liga Operária controla os sindicatos dos trabalhadores da construção civil e dos rodoviários de Belo Horizonte. “Não são do meio e manipulam a massa de trabalhadores rurais analfabetos e semi —analfabetos “,diz presidente do Iter —MG,Luiz Chaves.”Tradicionalmente procuram algum tipo de confronto.E uma estratégia de conseguir uma bandeira política na luta pela terra.É o grupo mais radical que temos em Minas.Não reconhecem nenhum tipo de instituição,de governo.”

LOC —Criada em 1995,inicialmente com o nome de Liga Operária e Camponesa (LOC),a Liga operária tornou-se conhecida em 1999,na ocupação da Vila Bandeira Vermelha,em Betim (MG).”Sua atuação pode levar a uma reavaliação do papel da mediação de conflitos da vara agrária “, afirma Helênio.”Há o risco de acirramento das tensões.”

A Liga Operária,apesar de divulgar manifestos em nome dos movimentos camponeses,afirma que apenas dá apoio a eles.Um dos seus coordenadores,Gérson Lima,não quis dar entrevista ao Estado,argumentando que a imprensa “distorce ’suas declarações. A organização,porém,concordou em responder perguntas por e-mail. A Liga rebate as acusações sobre práticas agressivas dos grupos que atuam no campo.Diz que esse tipo de crítica faz parte da tentativa de “criminalizar” os movimentos sociais.Critica o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva,que estaria a serviço da “grande burguesia e do latifúndio “.

O texto enviado por e-mail conclui afirmando que “o problema agrário só pode ser resolvido radicalmente com a democratização da propriedade da terra “

Entrevista concedida por e-mail pela Liga a Eduardo Kattah, em 27/08/2004

Eduardo Kattah – Gostaria de um pequeno e, se possível, conciso histórico da Liga Operária e de sua atuação no campo por meio de movimentos vinculados como a Liga dos Camponeses Pobres do Norte de Minas e do Centro Oeste. Quantos acampados possui hoje o movimento e quantas ocupações ocorreram neste ano? É correto dizer que a Liga está expandindo sua atuação na luta pela terra, antes mais concentrada na região norte de Minas?

A Liga surgiu em setembro de 1995, formada por um grupo de companheiros e companheiras com avaliação crítica sobre os rumos e prática do movimento sindical brasileiro que decidiram criar a Liga como organização classista, independente, como movimento de luta para resistência econômica dos trabalhadores, de caráter sindical e que se propõem a organizar a classe a partir de comissões de trabalhadores nos locais de trabalho. Inicialmente com o nome de Liga Sindical Operária e Camponesa e, posteriormente, precisando seus objetivos mudou a denominação para Liga Operária. No mesmo propósito da Liga tem surgido várias organizações em defesa de um sindicalismo classista, em função principalmente da consolidação da CUT como mais uma central patronal. Dentre essas organizações classistas temos apoiado as Ligas Camponesas e outras organizações combativas que tem surgido no campo. Quanto às informações das ações dessas organizações (nº de acampados e ocupações) é necessário que se indague a elas.

EK: No que a Liga se diferencia de outros movimentos, como o mais conhecido deles, o MST, por exemplo? Qual é a forma de arregimentar integrantes?

Existem muitas diferenças. Acomeçar que a Liga Operária não organiza a luta pela terra que é a natureza da organização do MST. ALiga não está vinculada a nenhum partido político como a direção do MST demonstra em suas relações com o PT e o atual governo.

EK – Como vocês respondem a essas acusações de que os métodos utilizados são agressivos, com ‘técnicas de guerrilha’, que a ação da Liga é ‘truculenta’, etc.

Como você mesmo colocou em sua pergunta isso são acusações; acusações tendenciosas que são praxe do aparato policial para com os movimentos sociais para criminalizar e justificar sua ação truculenta contra o povo e suas organizações. Essa prática corresponde ao caráter do Estado brasileiro que sempre tratou e segue tratando as questões sociais como caso de polícia.

E essa prática é reproduzida por muitos meios de comunicação comprometidos em defender os interesses reacionários e carcomidos das classes que têm nesse velho e podre Estado seu instrumento de dominação.

EK – Vocês alegam que a apreensão de quatro armas de fogo durante o conflito na última semana, durante o tumulto em Floresta Salitre, foi uma armação da PM. Porém, os policiais afirmam que apreenderam uma foto na qual integrantes da Liga estariam exibindo armas. A foto foi publicada na edição de terça-feira do jornal Hoje em Dia. Ela é legítima? As pessoas pertencem ao movimento?

Solidários com a luta dos camponeses do Acampamento Floresta/Salitre, covardemente agredidos pela tropa da PM no último dia 19, acreditamos na resposta que eles têm dado. É notória a prática da polícia, na repressão aos movimentos sociais, forjar provas para incriminar trabalhadores.

EK – Ideologicamente, como a Liga se posiciona frente ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva?

Uma vez que a ideologia do governo é a da grande burguesia e do latifúndio, serviçais do imperialismo, somos radical e frontalmente opostos a ela.

EK – Como avaliam a política de reforma agrária do atual governo federal? E o governo estadual, como tem agido nessa área?

A rigor, o Estado brasileiro nunca teve uma verdadeira política de reforma agrária.

O problema agrário é o principal problema da nação ao lado da subjugação ao domínio estrangeiro, principalmente norte-americano. O problema agrário só pode ser resolvido radicalmente com a democratização da propriedade da terra que requer a liquidação completa do sistema arcaico de propriedade latifundiária.

Enquanto reprimia o movimento de luta pela terra e praticava a deplorável política de assentamentos nas mais terríveis condições, ao passo que a demanda por terra é de milhões de famílias camponesas, FHC falava que estava fazendo a maior reforma agrária do mundo. Lula consegue ser ainda pior que ele.

O governo estadual tem agido exclusivamente através da repressão.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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