Cultura espúria

Cultura espúria

Com toda a “vênia”, parece que mais uma vez, como nas duas explosões anteriores, o laudo sobre a causa da explosão do VLS – V03 vai ser hipotético, inconclusivo, sem autores ou repuxáveis.

No dia 23 de setembro de 2003, trinta dias após a “explosão”, em entrevista concedida para a Rádio CBN no Jornal do Meio Dia, mais uma vez o brigadeiro Tiago da Silva Ribeiro vem a público anunciar, antes mesmo de a “Comissão de Investigação” ter chegado ao término dos seus trabalhos, que a causa da ignição intempestiva do motor A do primeiro estágio do VLS foi “… uma corrente elétrica espúria que nasceu no interior do próprio VLS…” e que assim detonou a espoleta que acendeu o ejetor, dando início à tragédia.

Disse que a “corrente espúria” não veio pela “linha de fogo”, isto é, da Sala do Comando da Missão, mas, provavelmente, veio de um outro setor do foguete que estava sendo testado no momento e que a hipótese de sabotagem estava descartada, pois não foram detectados nos locais ondas eletromagnéticas fortes o suficiente para gerar uma corrente com pelo menos dois amperes, necessária para detonar a espoleta, e vai por aí. Abalizando superficialmente as palavras do brigadeiro podemos constar que:

1O brigadeiro Tiago da Silva Ribeiro já mentiu pelo menos uma vez em outra oportunidade.

Em 11 de dezembro de 1999, declarou para toda a imprensa: “A causa da teledestruição do VLS-01 – V02 aos 3m20s foi o não acendimento do motor do segundo estágio”. Não foi. Foi a explosão “intempestiva” da carga de destruição do segundo estágio, e ele já sabia disso quando deu aquela declaração. Quem faz um cesto faz um cento.

2 Desde o primeiro instante após a “explosão”, a teoria da “corrente elétrica” já corria solta na boca das autoridades do governo. O ministro da “Defesa”, José Viegas, já declarava isso com entonação de certeza: sabotagem, nem pensar. Missão impossível para os seus pares do Itamarati assumir.

3 Desde as suas primeiras declarações, o brigadeiro Tiago da Silva Ribeiro não admitia que se lançasse qualquer traço de culpa ou responsabilidade sobre os membros da equipe recém sacrificada pela explosão.

Agora ele já sugere esta possibilidade. Morto não fala.

4 O brigadeiro usou a expressão “corrente elétrica espúria” como a autora da detonação da espoleta do ejetor do motor S-43-A do primeiro estágio do VLS.

Espúrio, de acordo com o Caldas Aulete: suposto, não genuíno, incestuoso, bastardo, ilegítimo.

Sinceramente não sei como interpretar o uso desse adjetivo no campo da física para qualificar e definir qualquer tipo de corrente elétrica por mim conhecida.

5 De acordo com as informações disponíveis, os sistemas elétricos de segurança dos ejetores do VLS não permitem, em hipótese nenhuma, a circulação de qualquer tipo de corrente elétrica, sejam elas “espúrias”, “prostitutas”, “vadias”, “vagabundas”, “canalhas”, “traidoras”, etc., nas espoletas dos ignitores, até que seus circuitos sejam armados instantes antes do lançamento, já na parte final da contagem regressiva.

Portanto, o brigadeiro Tiago da Silva Ribeiro mais uma vez volta a faltar com a sua palavra de oficial general de quatro estrelas.

6Para o brigadeiro, a única hipótese possível para a prática de uma sabotagem é através da utilização de ondas eletromagnéticas fortes. Não considera o uso de agentes infiltrados e outros artifícios. Estranho, não?

Então, por que não responder à pergunta do jornalista da Folha de São Paulo, Roberto Godoy, especializado em tecnologia de armamentos, feita durante programa da TV Educativa, que foi ao ar no dia 2 de setembro de 2003: “Eu só quero saber por que, no dia 23 de abril de 2003, toda a equipe de montagem do VLS foi retirada intempestivamente da base de Alcântara e recambiada às pressas para São José dos Campos?”

Quem ficou mantendo a segurança do VLS até o retorno da equipe? Quem manipulou o foguete durante esse período? Quem pariu a “corrente espúria” nascida no interior do próprio VLS?

7 Sabotagem, jamais.

O governo não pode admitir o que voluntariamente permitiu: que o país fosse, mais uma vez, violentamente abusado por parte do “grande irmão do norte”.

8 Covardes!

 

Saudações nacionais.


Ronaldo Schlichting é administrador de empresas
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