Dando tudo

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Em 1997 foi privatizada, de graça, a Vale do Rio Doce, a companhia de maior patrimônio no mundo, de muitos trilhões de dólares. Somente as jazidas minerais foram avaliadas, por baixo, em R$ 1,7 trilhão. Metade do preço oficial pelo controle da companhia, R$ 3,2 bilhões, foi dado ao grupo controlador pelo BN DES ao assumir créditos podres do Fundo de Compensação de Variações Salariais. As despesas e comissões pagas superaram R$ 200 milhões. O saldo de R$ 1,4 bilhão foi pago principalmente por fundos de pensão de estatais, manipulados pelo governo em proveito dos controladores, beneficiados também por créditos subsidiados. Ademais, o saldo era inferior ao dinheiro em caixa da empresa e estoques realizáveis a curto prazo. No primeiro semestre de 2003, o lucro da Vale do Rio Doce alcançou R$ 2,44 bilhões, equivalente a 76% do preço oficial pelo controle da companhia. De 2000 a 2003 (três anos e meio) os lucros somaram R$ 10,8 bilhões, mais de três vezes o valor oficial da doada privatização.

Outro resultado semestre: o BNDES sofreu prejuízo de R$ 2 bilhões, por dívidas não pagas por empresas estrangeiras agraciadas com privatizações do setor elétrico, a AES e a American Eagle. Em cima disso, o Conselho Monetário Nacional (CMN) acaba de aprovar repasse do Tesouro Nacional de R$ 1,9 bilhão ao BNDES, para que este financie as distribuidoras de energia que não transferiram para o consumidor os aumentos dos “custos não-gerenciáveis”. Só de uma tacada, pois, novos prejuízos para a União de R$ 3,9 bilhões.

Mais uma. De sua produção total de 41,5 milhões de m³ de gás natural, o Brasil joga fora todos os dias 14,2 milhões, volume superior ao que importa da Bolívia: 13,5 milhões de m³ diários, gastando R$ 600 milhões no semestre. As descobertas na Bacia de Santos fizeram triplicar as reservas nacionais. Porém, os contratos corruptos que a administração insiste em respeitar, exigem, a partir de 2010, elevar a importação para 30 milhões de m³. Há que pagar pelo produto, recebendo-o ou não. Com a sobre oferta, fornecedores bolivianos o vendem à Argentina pela metade do preço cobrado ao Brasil. Entre as beneficiárias da extorsão, a Shell e a Enron, falida nos EUA e inadimplente no Brasil, mais um mico da privatização do setor elétrico.

As administrações coloniais nomearam diretorias desastrosas para a Petrobrás

Desgastaram os quadros técnicos, fizeram terceirizações e aquisições danosas, entregaram jazidas sem as ter explorado, obedecendo à imposição pelo FMI de limites para investir. Ainda assim, a Petrobrás obtém lucros vultosos: R$ 9,3 bilhões no primeiro semestre de 2003. Entretanto, com mais de 60% de seu capital alienado, o grosso dos lucros não será reinvestido. É distribuído a acionistas, sobretudo aos estrangeiros, que adquiriram ações na Bolsa de Nova York. E dos menos de 40% que tocam à estatal, muito pouco será investido, já que o orçamento da União obriga a destinar a maior parte dos recursos ao superávit primário, exigido pelo FMI, para pagar juros. 

De quê? Juros da dívida pública, que cresceu, não em função de crédito para fins produtivos, mas de juros capitalizados, por causa das taxas absurdas fixadas pelo governo federal, que representa (?) o Tesouro, devedor (!). “Governo” que lança títulos no mercado mesmo tendo dezenas de bilhões de reais em caixa (sem falar no poder de emitir moeda). “Governo” que transformou títulos podres, cotados a menos de 10% do valor de face, em dívida com valor integral. Ressuscitou papéis até do século XIX.

Em 2003 foi elevada a taxa básica dos títulos da dívida interna para 26,5% aa

Há pouco, ela retornou aos 22% em que estava em 18 de dezembro de 2002. O estoque médio dos títulos remunerados pela SELIC foi de R$ 500 bilhões, no 1º semestre de 2002 — 12% aa. já seria um taxa generosa. À taxa média de 25%, a diferença são 13 pontos percentuais — o que significa a perda injustificada de R$ 32,5 bilhões. E como pelo menos 60% da dívida foi assumida sem necessidade, a conta sobe mais R$ 18 bilhões, levando o prejuízo para R$ 50,5 bilhões. Em 2002 foi pior: os encargos dos títulos indexados ao dólar custaram 80% aa., e o estoque deles aproximou-se de 40% do total.

Se fosse mencionar outros casos desse porte, não faria um artigo. Faria um livro. Abordei cinco exemplos: 1) Vale do Rio Doce; 2) prejuízos do BNDES decorrentes da privatização do setor elétrico; 3) importação de gás da Bolívia em benefício de transnacionais; 4) desvio dos lucros da Petrobrás; 5) criação desnecessária de dívida pública. Os quatro primeiros custaram mais de R$ 15 bilhões no semestre, e o quinto, R$ 50,5 bilhões. Total: R$ 65,5 bilhões. E dizem que o Brasil é um país pobre, enquanto ele gera esses ganhos para seus predadores. Seria riquíssimo, se não fossem desperdiçados tantos recursos.

A administração petista só faz economia onde o Banco Mundial e o FMI determinam

Com a “reforma” da Previdência, tira, segundo dizia ao lançá-la, R$ 56 bilhões dos servidores públicos em 30 anos, i.e, R$ 0,933 bilhão por semestre, ao preço de pisotear direitos adquiridos, agravar a depressão econômica e piorar condições de vida desgastadas pela inflação não corrigida (ao contrário das tarifas telefônicas) e por impostos exorbitantes. Mas nem essa pífia soma será poupada, pois a Previdência complementar acarretará aumento na despesa pública de R$ 1 bilhão por ano, com a transferência de recursos para os fundos de pensão.


*Adriano Benayon é Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo, Alemanha. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento” [email protected].
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