O imperialismo é useiro e vezeiro em torcer o sentido das palavras. Expressões e palavras que têm um significado positivo são usadas para encobrir práticas e ações de sentido e significado exatamente opostos e contrários.
Desde quando o USA estabeleceu a Doutrina Monroe, “a América para os americanos”, o discurso de todos os seus presidentes não vai direto ao ponto de seus interesses exploradores nem declara abertamente sua vontade opressora. Todos eles, seja Roosevelt, Kennedy, Reagan, Bush (pai e filho) Clinton ou Obama, trazem nos lábios sorrisos afáveis e palavras doces, porém, suas mãos nunca deixaram de segurar o “Big Stick”, o grande porrete, que descaradamente uma vez assumiram e que sempre foi utilizado para impor o seu insaciável desejo de dominar o mundo.
Em março de 2007, o Comando Sul do exército do USA, sob a administração G. W. Bush, lançou o documento “Estratégia 2016”, sob a palavra de ordem “Amizade e Cooperação para as Américas”. Aprofundando seus planos de apertar mais ainda a dominação imperialista, a “Estratégia 2016” propõe aumentar a militarização nesta região através de um formato ao qual foi dada a denominação de “interagencial”, ou seja, o Comando Sul do Exército do USA concentraria em suas mãos não só as ações militares propriamente ditas, como todas as demais ações, sejam no campo assistencial, econômico, educacional e cultural.
Sem tirar nem por
Ademais da tentativa de infantilização de nossos povos com paparicação rasteira, o discurso de Obama, tanto no Brasil como no Chile, teve um duplo sentido, tal como a chamada “Estratégia 2016”. Lança mão de termos como sócios, parceria, amizade, convergência cultural, cooperação, igualdade, tudo para tentar iludir as nações da América Latina e do Caribe – já contando com a subserviência de seus lacaios de plantão.
De quebra, faz um discurso para dento do USA, especialmente para os senhores da guerra, os especuladores e sanguessugas em geral, os que compõem o extrato superior das classes dominantes ianques, na busca de cacifar-se para um segundo mandato, intenção já tornada pública.
Farinha pouca, meu pirão primeiro
Em 2007, a crise já batia às portas do USA e de lá para cá só se agudizou. A voracidade com que a China surgiu no cenário em busca das fontes de matérias primas e mercados para seus produtos fizeram com que as nações imperialistas entrassem numa desesperada busca por assegurar para si o controle de nações exploradas no jogo de partilha e repartilha do mundo, verdadeira reedição da pilhagem colonial. Os acontecimentos no Norte da África e no Oriente Médio são bem uma demonstração deste fenômeno.
Tidos e havidos como o quintal dos ianques, a América Latina e o Caribe, em decorrência dessa situação, recebem uma nova investida com a finalidade de atá-los ao jugo imperialista.
Como não poderia deixar de ser, os ianques, sempre querendo fazer de bobos os demais povos, fazem a exaltação das confluências econômicas, culturais e demográficas entre os povos das Américas para, a partir daí, propor uma sociedade entre o USA e os demais países da região como se fosse possível considerar sócios o cocheiro e os cavalos que ele tange. Assim, tal “Estratégia 2016” se centra na busca de resolver os problemas de segurança, energéticos, de estabilidade e migratórios do USA colocando os demais países a seu serviço.
Uma sociedade onde os sócios menores abrem mão do que lhe resta de soberania e territorialidade sem, entretanto, obter a reciprocidade do sócio maior. Isso porque, no caso da segurança, a “Estratégia 2016” propõe a “segurança avançada” do USA, o que significa a implantação de mais bases militares nos países sócios, além da interpenetração de seus órgãos de segurança, logicamente, sob a batuta imperialista.
No que concerne às questões energéticas, tanto no que se refere ao petróleo como às demais fontes de energia, a sociedade se traduz em drenar toda a energia possível para o USA, tendo como contrapartida a assistência técnica de suas empresas, como a Halliburton e outras, cujos serviços são cobrados a preço de ouro, e sob a segurança militar garantida por suas bases militares no continente em terra e por sua IV Frota no mar.
A “Estratégia 2016” considera indispensável para o alcance de seus objetivos que o modelo de democracia ianque seja observado por todos e que haja um clima de estabilidade para que a exploração imperialista possa se dar sem contratempos. Assim, não basta que aconteçam eleições, os eleitos têm que estar afinados com o sócio maior, inclusive dispostos a pedir ajuda para a “manutenção da ordem” nas áreas onde o Estado não tenha presença efetiva.
Mais uma vez, a questão do narcotráfico e da narcoguerrilha são levantadas como motivo para a ocupação militar da região. Contribuem também para a “estabilidade” dentro da área de cada sócio a aplicação das políticas de focalização na eliminação da pobreza e o combate à corrupção no seio das oligarquias encasteladas no aparelho estatal. Para tanto, as agências especializadas, como o Banco Mundial, BIRD, USAID, OEA, FBI, CIA e outras, em colaboração com o Comando Sul, estarão aptas a prestar sua assessoria para a manutenção da estabilidade.
Essa estabilidade é indispensável para, além de permitir os super-lucros das empresas ianques, diminuir o fluxo migratório para o norte das Américas. E, na impossibilidade de eliminar o problema totalmente, a solução deverá ser dada através de se desviar o fluxo para terceiros países de forma que a estabilidade e a segurança do USA sejam garantidas.
A todas estas ações de mais alargamento dos espaços nos países da América Latina e do Caribe para a livre atuação de suas empresas, através do impulsionamento do capitalismo burocrático, a “Estratégia 2016” denomina de “prosperidade para as Américas”. Pura desfaçatez, já que este tipo de capitalismo, através do qual o imperialismo suga a força de trabalho e as matérias primas, exaure o meio natural e espolia o mercado consumidor, obtendo super-lucros que são drenados para a metrópole, não traz nenhuma prosperidade aos povos submetidos a essa condição. Muito pelo contrário, cada investimento que chega é uma plataforma propulsora de mais lucros a serem enviados para suas matrizes.
A Doutrina Obama na América Latina
Para verificar-se algo da relação existente entre as diretivas do Comando Sul do Exército dos Estados Unidos elaborados pela administração Bush e a chamada Doutrina Obama, reproduzimos a seguir extratos da página 4 do documento “Estratégia 2016” e algumas passagens dos recentes discursos de Obama no Chile.
Extratos do documento do Comando Sul do Exército do USA:
Vínculos
A América está inextricavelmente vinculada. Celebramos nossa diversidade e as diferentes tradições culturais e históricas, porém também reconhecemos que temos muito em comum:
- Demograficamente
- Economicamente
- Socialmente
- Politicamente
Desafios
A possibilidade de ações militares de forças contra forças entre duas ou mais nações na região é relativamente baixa; entretanto, enfrentamos muitos outros problemas e desafios que ameaçam a segurança, a estabilidade e a prosperidade:
- Pobreza e desigualdade
- Corrupção
- Terrorismo
- Delitos
Cumprir a promessa: 2016
Devemos trabalhar juntos, como sócios, para tornar realidade a “promessa” de prosperidade futura de nosso hemisfério compartilhado. O êxito no ano 2016 depende da criação de um ambiente de segurança hemisférica que inclua e beneficie a todos nós.
- Nossa visão, missão e metas, junto com a cooperação de nossos sócios interagenciais e os países sócios, nos permitirão cumprir a promessa.
- Missão atual: levar a cabo operações militares e fomentar a cooperação de segurança para lograr os objetivos estratégicos do USA.
- Visão 2016: uma organização interagencial conjunta que procura respaldar a segurança, a estabilidade e a prosperidade em todas as Américas.
- Metas:
Hemisféricas:
- Assegurar a segurança
- Fomentar a estabilidade
- Facilitar a prosperidade
- Empreendimento governamental
- Transformar o comando.”
Dos recentes discursos de Obama no Chile:
“…Vocês receberam imigrantes dos quatro cantos do globo. Assim como vocês, comemoramos uma orgulhosa herança indígena.
…E lá [na Cúpula das Américas] eu prometi buscar parcerias de igualdade e de responsabilidade compartilhada, baseada em interesses mútuos e respeito mútuo, mas também em valores comuns.
…E por todos esses motivos, creio que a América Latina é mais importante para a prosperidade e a segurança dos Estados Unidos do que nunca. Com nenhuma outra região os Estados Unidos têm tantas conexões.
…Mas, se formos honestos, vamos admitir também que esses sonhos ainda estão fora do alcance de muitos, que o progresso das Américas não chegou rápido o suficiente. Não é para os milhões que sofrem a injustiça da pobreza extrema. Não é para as crianças em favelas e nas favelas que só querem a mesma chance que todos os outros. Não é para as comunidades que são apanhadas nas garras brutais dos cartéis e gangues, onde os policiais são desarmados e muitas pessoas vivem com medo.
…E, apesar do progresso democrático dessa região, ela suporta desigualdades gritantes. No poder político e econômico que é, muitas vezes, concentrado nas mãos de poucos, em vez de servir a muitos. Na corrupção que, muitas vezes, ainda sufoca o crescimento econômico e o desenvolvimento, inovação e empreendedorismo.
…E hoje, os Estados Unidos estão trabalhando com as nações do hemisfério a cumprir as nossas responsabilidades em várias áreas chave.
Primeiro, temos parceria para resolver os problemas que as pessoas nas Américas dizem se preocupar mais – e essa é a segurança de suas famílias e comunidades. As quadrilhas de criminosos e traficantes de drogas não só são uma ameaça para a segurança dos nossos cidadãos. Eles são uma ameaça ao desenvolvimento, porque eles afugentam o investimento que as economias precisam para prosperar. E eles são uma ameaça direta à democracia, porque alimentam a corrupção que apodrece as instituições por dentro.
Então, estamos nos juntando com parceiros em toda a América para ampliar policiamento baseado na comunidade, fortalecer os sistemas de justiça juvenil, e investir em programas de prevenção da criminalidade e drogas.
À medida que trabalhamos para garantir a segurança dos nossos cidadãos, temos parceria em uma segunda área – e que é a promoção da prosperidade e da oportunidade. Eu fiquei tão impressionado com a promessa do presidente Piñera de ajudar todos saírem da pobreza extrema até 2020. Essa é uma meta ambiciosa e um objetivo adequado. E com essa viagem, eu estou trabalhando para ampliar alguns dos acordos comerciais e de investimento que possam ajudar a alcançar este objetivo.
…E, assim como defendemos os direitos humanos e a democracia dentro das nossas fronteiras, vamos defendê-los em nosso hemisfério.
…Segurança de nossos cidadãos. Comércio e desenvolvimento que cria emprego, prosperidade e um futuro de energia limpa. Em defesa da democracia e dos direitos humanos. Estas são as parcerias que podemos forjar juntos – aqui nas Américas, mas, também ao redor do mundo.