Dobradinha entre USA e oligarquia colombiana ameaça a América do Sul

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Dobradinha entre USA e oligarquia colombiana ameaça a América do Sul

Há oito anos o USA e seu comparsa-mor na América do Sul, o governo colombiano, anunciaram ao mundo que colocariam em prática o chamado Plano Colômbia. De acordo com os comunicados oficiais da época, tratava-se de cooperação para combater a produção e o tráfico de cocaína neste país. De acordo com a realidade subseqüente, tratou-se de uma intervenção militar levada a cabo sob uma estratégia imperialista maior. O plano, na verdade, era salvaguardar os interesses do poder econômico ianque não apenas na Colômbia, mas em toda a região amazônica do nosso continente. E ainda é.

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"Os USA parecem destinados pela providêcia a encher de miséria
a América em nome da liberdade". Simon Bolívar citado em faixa

"O Plano Colômbia será executado com ou sem a solidariedade internacional", já dizia o vice-ministro de Defesa do USA, James Bodner, na Conferência Ministerial de Defesa das Américas, que se realizou em Manaus em outubro do ano 2000. Poderia ter falado em "Planos Colômbia" e "serão executados" com ou sem quem quer que seja. Assim, no plural, como o personagem Rambo, que no episódio II do filme homônimo foi ao Vietnã e se mostrou decidido a metralhar vietnamitas vinte anos depois do fim da guerra, com ou sem a ajuda de quem quer que fosse.

De fato, o Plano Colômbia está hoje já em sua segunda versão. A primeira aconteceu entre 2000 e 2007. A segunda entrou em vigor em 2007 mesmo, e está prevista para se prolongar até 2013. Nada indica que não haverá uma terceira, uma quarta, ou até uma quinta, até que a Colômbia se torne enfim, e oficialmente, o 51º estado ianque. Como Rambo, cuja quarta versão ainda pode — mas não deve — ser vista em algumas salas de cinema no Brasil. Assim, teríamos no Pacífico Sul um integrante da Organização do Tratado do Atlântico Norte, e se a cena do porta-aviões ianque flutuando na baía de Guanabara em meados de abril deste ano assombrou os habitantes da cidade do Rio de Janeiro, que dizer da possibilidade de haver tropas da Otan policiando a América do Sul à luz dos interesses imperialistas?

Sabe-se bem que não é uma missão impossível. É longa a história de ingerências, assassinatos, golpes e sabotagens que foram tramados, financiados ou diretamente executados pelos ianques em nosso continente. É longa mesmo a história de manobras militares imperialistas nos mares do sul a título de treinamento conjunto.

Como dito acima, há pouco tivemos o porta-aviões George Washington, o maior da marinha do USA, participando de exercícios militares com as tropas do Brasil e da Argentina em plena América do Sul, e tudo soou a mais perfeita normalidade. Era parte da 49ª edição da Operação Unitas. Em 1974, enquanto transcorria sob a mais perfeita normalidade uma Operação Unitas na costa do Chile, o palácio de La Moneda foi tomado de assalto e o presidente Salvador Allende foi assassinado. Em uma matéria publicada em 1974, o hoje famoso escritor colombiano Gabriel García Márquez reportava:

"Muitos agentes estrangeiros participaram do drama. O bombardeio do palácio de La Moneda, cuja precisão técnica assombrou os especialistas, foi feito por um grupo de acrobatas norte-americanos que entraram, com a bandeira da Operação Unitas, para fazer acrobacias aéreas no dia 18 de setembro, dia da independência nacional [no Chile]".

Uma informação devidamente negligenciada pelo oligopólio brasileiro dos meios de comunicação, e que deve ser repercutida nos dias de hoje, depois que os trabalhadores do Rio de Janeiro viram e ouviram aviões de guerra sobrevoando a cidade e a região metropolitana em alguns dias de abril como parte dos exercícios da 49ª Operação Unitas.

Achar que este tipo de operação é realmente algo inofensivo é uma prerrogativa para os que gostam de se iludir. A Unitas é a presença do poder militar ianque na América do Sul para fins nada amistosos. É parte de um grande projeto neocolonial do USA que tem na Colômbia seu comando avançado e nos sucessivos Planos Colômbia sua linha-mestra.

Com muitas facetas e sem data para acabar

A Colômbia hoje vêm sendo apresentada como modelo internacional de políticas de segurança pública. Chefes e ex-chefes de polícia de cidades como Cáli e Medellín são figurinhas fáceis em palestras, congressos e encontros internacionais onde se debate não exatamente como proteger os cidadãos, mas sim formas e métodos de repressão e controle social. Os índices de criminalidade de suas cidades mais problemáticas são exibidos via retroprojetores e cadernos policiais do mundo inteiro como verdadeiros troféus, mas o que não se diz é que não são acompanhados de qualquer melhora significativa das condições de vida ou de liberdade do povo.

As cidades caribenhas da Colômbia também voltaram a frequentar as páginas e mesmo as capas das revistas de turismo mundo afora. Fala-se dos coloridos e dos sobrados de Cartagena e das maravilhas de Santa Marta, sempre lembrando que a Colômbia não é mais apenas um país de sequestradores e traficantes, e omitindo sempre que no caribe colombiano estão instaladas duas das quatro bases militares ianques que existem no país. Estas, as do caribe, como sempre justificadas como necessárias para a luta contra o narcotráfico, funcionam na verdade como centros de monitoramento da atividade petroleira na região, e têm capacidade operativa cujo alcance se estende para além do território colombiano.

O Plano Colômbia, entendido e compreendido entre o ano 2000 e o horizonte que se perde de vista, é um programa imperialista sem prazo de validade, que por meio da intervenção política, econômica e militar pretende favorecer grandes petrolíferas, carvoeiras e outras empresas especializadas na rapina de recursos naturais dos países pobres, como a água doce e a biodiversidade.

Além disto, a idéia é implementar na marra as reformas do capitalismo monopolista e financeiro, além de semear o divisionismo e a corrupção em um país assolado pela pobreza e castigado pelas ações dos "Paras".

No fim de abril deste ano, as autoridades judiciárias colombianas mandaram prender o ex-senador Mario Uribe Escobar — menos por ser um Escobar e mais por ser um Uribe.

Ex-presidente do Congresso da Colômbia e primo do atual presidente do país, Álvaro Uribe, Mario teve a prisão decretada após a comprovação de suas ligações com os grupos paramilitares. Assim, ficou-se sabendo que o primo de Uribe se reuniu secretamente com Salvatore Mancuso, então líder das Autodefesas Unidas da Colômbia, pouco antes das eleições de 2002.

Uribe Escobar é um dos 63 congressistas metidos no escândalo da "parapolítica"— uma rede desmascarada de membros do executivo e do legislativo colombianos envolvidos direta ou indiretamente com as Autodefesas Unidas da Colômbia.

Outras pessoas diretamente ligadas a Uribe caíram devido a ligações umbilicais com o próprio narcotráfico. Sobre o próprio Álvaro Uribe, a ex-companheira do traficante Pablo Escobar — morto em 1993 — diz o seguinte: "O narco-estado sonhado por Escobar tem mais vigência do que nunca".

"Os narcotraficantes prosperam na Colômbia não porque são uns gênios, mas porque os presidentes são muito baratos", diz Virginia Vallejo em seu livro Amando Pablo, odiando Escobar. Junte a isto o fato de o próprio USA listar Uribe em sua relação de narcotraficantes, e o discurso humanitário dos sucessivos Planos Colômbia não mais resistirá. O que o imperialismo quer é um cúmplice para respaldar sua ofensiva sobre os povos sul-americanos, e não um parceiro para libertar o povo de um país da opressão de seus inimigos internos.

E foi com as Autodefesas Unidas da Colômbia que uma das maiores multinacionais ianques manteve ao longo de anos uma relação de contratante de prestadora de serviços pouco convencionais, por assim dizer. Entre 1997 e 2004, a empresa Chiquita, cujo negócio é a exportação de bananas, pagou quase 2 bilhões de dólares às Autodefesas Unidas em troca de "proteção", que na prática significava chantagem e achacamento dos camponeses e pequenos produtores rurais.

A cereja do bolo neocolonial

É isto o que há por trás de todo o discurso humanitário de defesa da democracia e de salvação da América Latina frente aos desmandos do narcotráfico: os interesses comerciais e belicistas do USA, por sua vez mancomunado com as oligarquias locais da Colômbia.

E vem sendo assim desde a primeira grande investida militar sob a batuta do Plano Colômbia, em outubro de 2000, quando foi desencadeada uma grande operação na região de Puntamayo, no sul do país — a mais rica em petróleo da Colômbia — até o episódio recente da violação da fronteira com o Equador, quando foi assassinado o dirigente das Farc Raúl Reyes (ver Box).

Hoje, são cerca de 400 ianques diretamente envolvidos nas decisões políticas, econômicas e militares tomadas pelo governo colombiano. É alto o investimento do USA na Colômbia em forma de radares, aviões espiões, helicópteros de guerra, e financiamento e treinamento de um exército de mais de 200 mil soldados.

São 700 milhões de dólares por ano injetados no enclave ianque no qual a oligarquia colombiana transformou o país. Segundo dados da Anistia Internacional e da Human Right Watches, o Plano Colômbia é responsável direto pela morte de 14 pessoas por dia. São sistemáticos os massacres e os seqüestros de cidadãos colombianos resistentes, a pretexto de serem traficantes de drogas ou colaboradores das Farc.

Chama-se Plano Colômbia, porque se dá a partir deste protetorado ianque, mas poderia se chamar "Plano América do Sul", tamanha é a envergadura de sua implicação sobre toda a região.

É evidente que o que se faz na Colômbia é montar uma base de operações para praticar agressões em toda a América Latina, e a ditadura não do generalão, mas do gerentão Uribe seria o modelo a se seguir, em detrimento do nacionalismo demagogo e oportunista de Hugo Chávez, Evo Morales e Rafael Correa — de Luíz Inácio, nem mesmo isto se pode dizer.

A cereja do bolo imperialista seria colocada com o chamado "Acordo de Livre Comércio entre EUA e Colômbia", tramado por Bush e Uribe ao longo de meses e assinado ainda em 2006. A coisa vem sendo brecada pelo Partido Democrata no Congresso do USA, mas única e exclusivamente por razões eleitoreiras. O esmero da administração Bush para aprovar o tratado é tanto que vêm gerando indisposição com o legislativo ianque.

A presidente da Câmara dos Deputados do USA, Nancy Pelosi, do Partido Democrata, condicionou a votação do tratado com a Colômbia à solução de problemas econômicos domésticos. Bush, então, usou de sua prerrogativa e enviou o tratado ao Congresso pela chamada "via rápida", um instrumento emergencial que obriga os congressistas a apreciarem e darem parecer sobre seu conteúdo em até 90 dias. Em um contra-golpe, Nancy Pelosi liderou um movimento no Congresso que culminou com a eliminação desta regra.

Isto é revelador: o que seria, a princípio, um mero acordo com um longínquo país da América do Sul causou grande rebuliço nas instituições do país mais poderoso do planeta. Demonstra a importância estratégica que esta região tem para os objetivos imperialistas, e que a administração ianque de plantão não mede esforços para assegurar o domínio do nosso continente, seja pela via militar, seja pelo caminho político-econômico.

Caso não fosse assim, o secretário do tesouro deles, o polido Henry M. Paulson Jr., não teria esperneado como esperneou diante da não-votação do acordo com a Colômbia, dizendo que isto encorajaria as forças anti-USA na América Latina e colocaria em risco a economia ianque. Certamente não estava preocupado com as bananas.

O USA e a recente violação da fronteira equatoriana

Nas últimas duas décadas o USA vem tentando consolidar uma nova estratégia de controle global na qual é muito importante a cooptação das administrações nacionais de vários países ditos democráticos.

Trata-se da implantação de bases militares de pequeno e médio portes apenas, porém em grande quantidade ao redor do planeta. Segundo dados do Pentágono, são hoje 735 destas bases espalhadas por 130 países de todo o mundo.

Na América Latina, há uma complexa e extensa rede de bases militares de todo tipo controladas pelo Comando Sul do Pentágono, baseado em Key West, na Flórida. Desde meados dos anos 80 os ianques viram na luta contra o narcotráfico na região andina uma verdadeira porta de entrada para suas tropas, oficiais e estrategistas na região.

O que hoje se conhece como Plano Colômbia — ou Planos Colômbia — é o desdobramento do que faziam os FOLs, da sigla em inglês, que significa Centros Avançados de Operação. Ainda existem quatro FOLs em plena operação na América Latina, No Equador, El Salvador, Aruba e Curaçao.

E há grandes possibilidades de ter saído de uma FOL situada no próprio Equador o avião C-130 que forneceu informações sobre a localização dos integrantes das Farc que estavam próximos à fronteira com a Colômbia, no episódio da violação de soberania que resultou na morte de Raul Reyes e mais 17 pessoas. Um avião deste tipo da base de Manta, na costa do Pacífico, não estava pousado no momento em que as tropas colombianas bombardearam o local onde o grupo estava acampado, já em território equatoriano.

Tendo em vista que toda e qualquer operação envolvendo tropas ianques na região passa pelos estrategistas do Plano Colômbia, a recente violação militar da fronteira equatoriana é na verdade uma dupla invasão, empreendida pelo USA e pela administração Uribe, estes dois inimigos dos povos da América do Sul.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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