Editorial – Dois caminhos nas rebeliões árabes

Editorial – Dois caminhos nas rebeliões árabes

Os países do norte da África e do Oriente Médio estão em convulsão. Um após o outro, os povos da região se insurgiram espontaneamente levantando bandeiras democráticas e exigindo emprego, diminuição dos preços dos alimentos, melhores condições de vida, o fim da corrupção, etc.

Engana-se quem acredita que os protestos se dirigiam exclusivamente à derrubada de um ou outro tirano e que os arremedos de “transição” chefiados por militares conduzirão à realização das aspirações das massas.

Apanhados de surpresa pelos levantes, os presidentes dos países imperialistas primeiro fizeram declarações de apoio aos seus lacaios, para depois, vendo a consistência dos protestos, clamar para que as manifestações não fossem reprimidas “com violência” e que se fizesse uma transição pacífica. Nesse meio tempo, as coisas foram se arranjando entre os plenipotenciários imperialistas e os chefes da forças armadas desses países.

No Egito, milhões de pessoas se acotovelaram nas praças das principais cidades do país por 18 dias até que fosse acertada a saída de Hosni Mubarak, no poder há 30 anos, e uma transição comandada pelos generais do exército, com uma eleição programada para setembro, com tempo de sobra para que se assegure que o próximo gerente do Estado egípcio seja tão ou mais subserviente aos interesses do imperialismo ianque.

Assim também na Tunísia o imperialismo não economizou esforços para que Ben Ali se escafedesse e deixasse em seu lugar gente capacitada para manter intactos os interesses da grande burguesia e dos monopólios imperialistas.

Em países como a Argélia e Jordânia, os governos acenaram com algumas concessões para as massas, o que veio combinado com a repressão. Em outros, como Iêmen e Bahrein, apenas a repressão se fez presente, o que não diminuiu o ímpeto das massas. No Bahrein, pequena ilha, no Golfo Pérsico, sede da V Frota do USA, uma prova da Fórmula 1 foi cancelada por “problemas de segurança”.

Na Líbia, depois de mais de 40 anos, Muamar Kadafi balança, enfrentando a maior oposição nas ruas em décadas. O USA não perdeu a oportunidade e fomenta a rebelião para derrubar o “ditador” e instaurar uma “democracia” ao seu estilo, como feito no Iraque desde 2003.

A fama de socialista ou de esquerda adquirida por Kadafi, na verdade em razão de seu passado de radical anti-imperialista, deixa o monopólio de imprensa tão assanhado a ponto de botarem no centro dos acontecimentos os protestos na Líbia, apresentando Kadafi como o “mais sanguinário ditador”. A gravidade da situação da Líbia, dada sua composição social com várias etnias e tribos, tende a agravar-se numa guerra civil, na qual o imperialismo intervirá, através da OTAN, sob a justificativa da segurança europeia e do abastecimento de petróleo.

O certo é que a justa rebelião das massas encontrou as baionetas assassinas e milhares de jovens árabes foram mortos em nome da revolução e da democracia que, ao que tudo indica, além de seus simulacros e farsas, não chegarão ao mundo árabe agora. Nada irá além da reestruturação do velho Estado, seguindo o velho caminho burocrático das classes dominantes.

E a principal razão disso é a ausência de uma vanguarda revolucionária consequente, capaz de conduzir o levantamento para o caminho da revolução até o fim.

Os partidos na região que se denominam comunistas há muito são organizações revisionistas, anquilosados reformistas, incapazes de dirigir movimentos dessa natureza e presas fáceis das manobras, acordos e concertações manejados pelos ianques, quando não instrumentos dóceis dos mesmos. O Partido Comunista do Egito defende medidas de reestruturação do Estado, como a derrubada de Mubarak e a instalação de uma constituinte, nada sobre destruir o velho Estado e construir um novo poder das massas populares.

Também os revisionistas, trotskistas e todo tipo de oportunistas, que aclamaram as rebeliões árabes como revoluções, devem ser desmascarados, porque lá, pela própria ausência de uma vanguarda proletária minimamente organizada, a situação revolucionária tão pujante como a que sacode tais países não pode sequer desenvolver-se em crise revolucionária, menos ainda numa revolução. Revolução é um processo social que, ao sacudir toda a velha ordem estabelecida, as classes exploradas e oprimidas derrubam pela violência o poder das classes exploradoras e opressoras, destroem sua máquina estatal e edificam uma nova ordem, um novo Estado, expressão do poder político das classes revolucionárias. Este, o novo caminho democrático das massas populares.

Ademais, os recentes levantamentos nos países árabes guardam muita semelhança com as rebeliões e protestos na América Latina, como na Argentina em 2001, no Equador em 2000 e 2005 e na Bolívia em 2005. Nessas ocasiões, os massivos protestos e mesmo rebeliões armadas, como no caso da Bolívia, foram empalmadas por partidos oportunistas que desviaram as massas populares radicalizadas do caminho revolucionário. O protagonismo do oportunismo no nefasto papel de compromissos com as classes dominantes locais e com o imperialismo para impor a via eleitoral burguesa o cacifou para que, em cada um desses países e ao seu tempo, ascendessem à gerência do velho Estado.

Na prática, esses governos pendem entre as juras de amor ao capital financeiro e o apoio dos “movimentos sociais” corporativizados pelo Estado reacionário genocida. No entanto, como se comprova na Bolívia, as massas já estão despertas para a política fascista antipovo e vendepátria aplicada por essas gerências.

E se é verdade que na oportunidade desses eventos aqui na América Latina e lá no norte da África e no Oriente Médio não houve uma direção revolucionária consequente, também é verdade que as próprias massas, tendo o proletariado como classe dirigente, ainda que necessite mais tempo, inevitavelmente forjará a vanguarda, o partido que as conduzirá para o caminho da revolução de nova democracia.

Por hora seguirá a luta entre os dois caminhos, o velho caminho burocrático irá se desgastar e desmascarar, enquanto o novo caminho democrático das massas populares se imporá mais dia menos dia.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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