O massacre contra a população pobre de São Paulo ganha contornos cada vez mais dramáticos à medida em que vão se desnudando a intenção genocida do velho Estado de promover uma “limpeza” nos bairros pobres das grandes cidades, e a crise na gerência estadual, que se viu forçada a admitir sua responsabilidade, substituindo o secretário de segurança e o comando das duas polícias estaduais, como se uma simples troca de pessoas resolvesse o problema do povo, que não pode mais sair de casa sem o risco claro de ser assassinado.
Já passa de 300 o número de mortos com as mesmas características de execução desde outubro, num ascenso difícil de acompanhar, já que as informações são fragmentadas e misturadas a outros homicídios, ou apresentadas de maneira a dificultar sua totalização. Para se ter uma idéia, houve 592 homicídios em todo o estado em outubro, uma média de 19,09 por dia, sendo 11,12 na região metropolitana. Apenas no fim de semana entre os dias 23 e 25 de novembro foram 22 assassinados na grande São Paulo com características de execução.
Para quem tem alguma dúvida sobre a autoria desses crimes, ou da maioria deles, dados da Polícia Civil dão conta de que as fichas policiais da maior parte dos mortos nessas circunstâncias foram acessadas antes das execuções, numa clara e gravíssima demonstração de como agem os grupos de extermínio, formados quase sempre por policiais.
E quando não agem em veículos descaracterizados e encapuzados, matam fardados de ‘cara limpa’, com a cobertura do velho Estado, que lhes encobre com o véu dos “autos de resistência”, expressão famigerada utilizada para as execuções de pobres em diferentes situações.
Também o número dos autos de resistência teve um aumento assombroso no último período: dados do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), da Polícia Civil paulista, mostram que entre 24 de outubro e 19 de novembro a polícia matou, supostamente em confrontos, 62 pessoas (média de 2,29 por dia), quando de janeiro a setembro a média já era de alarmante 1 pessoa por dia. Esses são os que a polícia assassina oficialmente. Isso sem falar na ocupação militar de vários bairros proletários paulistanos, na chamada “Operação Saturação”, impondo toques de recolher e outras atrocidades contra a população.
Várias cidades do interior e do litoral do estado presenciaram chacinas e execuções do mesmo tipo, aumentando a triste estatística.
Se, por um lado, o número de ataques a policiais também cresceu, isso está sendo utilizado, tal como nos crimes de maio de 2006, como pretexto para aterrorizar a população e matar indiscriminadamente pessoas nas ruas.
A violência criminosa parte sempre do Estado, e a cada volta da espiral vai ampliando os atingidos, afogando cada vez mais gente em sangue, inclusive alguns de seus próprios agentes. É o governo de São Paulo que sempre quebra os acordos com o que chama de “crime organizado” (mas não assume nem o acordo nem o rompimento), e ainda se aproveita disso para exterminar mais uma parte da população pobre.
A mesma situação, em proporções menores, toma conta de Santa Catarina. Uma onda de ataques está ocorrendo, com queima de ônibus e execuções sumárias. Um vídeo foi divulgado pelos encarcerados no presídio São Pedro de Alcântara, em Florianópolis, no qual está documentada a selvageria do diretor do presídio e dos carcereiros, que submetiam diariamente os presos a brutal tortura, numa suposta tentativa de que os presos assumissem a responsabilidade pela morte da esposa do diretor.
Essa não é uma situação isolada. No Brasil toda a população carcerária, que já bate a casa das 600 mil pessoas (4ª maior do mundo), padece da superlotação, maus-tratos e sevícias de todas as espécies.
O massacre contra os pobres, não só de São Paulo, mas do Brasil, não só o que se comete em ondas, mas também o cotidiano, é intolerável. Não se pode naturalizar mais esse ato de terrorismo cometido diuturnamente pelo velho Estado.
A guerra do velho Estado nunca foi contra o “crime organizado”, contra o PCC (não se pode citá-lo na imprensa). É uma guerra declarada contra o povo, que se torna cada vez mais rebelde, incapaz de viver em condições que pioram dia a dia.
O problema é que o Estado não pode prender nem matar todo mundo, enquanto o povo pode facilmente viver sem algo que o oprime. E assim será feito, mais cedo ou mais tarde.
Errata
Na última edição de AND, na entrevista com Laura Petit “Os familiares continuam sendo penalizados, pag.5, afirmamos que Lúcio Petit foi preso junto a Carlos Nicolau Danielli. Na verdade, Petit foi preso com Antônio Ferreira Pinto, conhecido como Antônio Alfaiate.