Outra conhecida crítica das remoções de favelas e bairros pobres em função dos mega-eventos é a urbanista, professora da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo) e relatora especial da ONU para a moradia adequada, Raquel Rolnik. Ela explica porque os países ditos emergentes estão sendo os alvos prediletos da Fifa e do COI para a realização dos mega-eventos.
— Essa cidade vai ser mostrada. Essa cidade vai ser exibida para o mundo inteiro. É uma espécie de estande de vendas gratuito, internacional, que vai construir uma imagem de cidade ligada ao evento. Índia, Brasil, Rússia, China, os Brics, são eles a bola da vez, África do Sul. São países que são as novas fronteiras de exploração do mercado mundial. E as remoções são fruto da valorização imobiliária de determinados espaços nesses locais que abrigam os mega-eventos. São locais que se transformaram em vitrine global. São espaços que passam a ser disputados por atores que têm uma situação financeira infinitamente maior do que os atores locais — explica.
Além disso, a especialista critica o projeto habitacional Minha Casa, Minha Vida do gerenciamento PT-Dilma. Os imóveis construídos pelo projeto são o destino da maioria das famílias removidas compulsóriamente de suas casas em função dos mega-eventos. No Rio de Janeiro, a maioria desses “condomínios” são dominados por grupos paramilitares e não possuem hospitais, creches, escolas, farmácias e mercados por perto.
— Existe uma diferença muito grande entre política habitacional e política industrial de produção de casas, que é a natureza do projeto Minha Casa, Minha Vida, em uma perspectiva econômica contracíclica e em resposta à crise econômica de 2008 e 2009 — diz.
— Do ponto de vista humano, a questão da moradia é a porta de entrada para os outras questões, como saúde, trabalho, educação, condições de sobrevivência, tudo isso é violado no momento em que a pessoa é arrancada de sua casa, muitas vezes, já em condições precárias, para outro lugar onde ela estará sujeita a uma condição pior ainda. Então, óbviamente, essa pessoa vai ter que se deslocar de volta para uma condição também precária, no mesmo lugar — conta Raquel, que critica também a falta de informações sobre as remoções de favelas e bairros pobres.
— Outra violação básica é o não direito à informação e o não direito à participação. Ninguém sabe o que será feito nos locais de remoção, quantas pessoas já foram removidas, nada — Rolnik diz que o mais curioso é que estão sendo removidas compulsóriamente inclusive as pessoas que têm seus imóveis regularizados junto às prefeituras de suas cidade.
— A coisa mais paradoxal é que estão sendo removidas pessoas que têm posse legal de suas casas. A constituição de 1988 reconheceu a posse de pessoas que ocuparam espaços públicos ou privados por não terem condições de acesso à moradia dígna. Quando a pessoa é removida, ela tem duas opções, compensação financeira e reassentamento. Não pode deixar ninguém sem casa, sem teto, e não pode impor uma condição de moradia pior do que a pessoa tem. Nenhuma dessas regras está sendo cumprida. E não é por acaso que as obras vão cair por cima das comunidades. É para sair mais barato — denuncia.