No dia 25 de fevereiro, a Suprema Corte da Colômbia ordenou a prisão de dois senadores e dois deputados devido a indícios de vínculos com grupos paramilitares. Os senadores Ciro Ramirez e Luiz Fernando Almario, do Partido Conservador, e os deputados Dixon Tabasco e Pompillo Avedaño, do Partido Liberal, se juntaram a outros 14 parlamentares na Penitenciária La Picota, em Bogotá, todos acusados de envolvimento com grupos paramilitares, que controlam determinadas comunidades, tiranizam a população local e negociam votos em períodos eleitorais. No total, são 63 congressistas envolvidos no escândalo da "parapolítica". A maioria desses políticos pertence à base de sustentação do presidente Álvaro Uribe.
Esses grupos paramilitares foram reunidos sob o comando de Carlos Castaño num grupo conhecido como Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC) e foram treinados e equipados durante décadas sob o pretexto de combater os traficantes de drogas que, segundo o governo do USA e Uribe, têm como principais representantes no país sul-americano as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc-EP). Por outro lado, organizações de esquerda e as próprias Farc-EP denunciam o presidente Álvaro Uribe e Washington como os maiores interessados no tráfico internacional de drogas e armas. Segundo a BBC, as AUC já sequestraram jornalistas.
A imprensa brasileira, de modo geral, omite esta realidade ou então a inverte por completo. Um exemplo. É a matéria da repórter Ruth Aquino na revista Época, em 19 de fevereiro de 2007, intitulada As lições da Colômbia para o Brasil. Em vez de listar alguns dos crimes citados acima, elogia o modelo de segurança militarizado ("nas ruas da capital colombiana, o ambiente é de Primeiro Mundo (…) Praticamente não há mendigos") sem considerar que por trás dele se sustentam as relações políticas que permitiram a constituição de milícias de direita que assassinaram inúmeros colombianos, geralmente camponeses pobres.
Políticos apóiam grupos criminosos
No Brasil, não faltaram "autoridades" para respaldar o modelo colombiano — que como se sabe é ditado por Washington via agências como DEA e CIA. Um mês após a reportagem publicada pela Época, o governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral visitou a Colômbia para conhecer o modelo de segurança do país vizinho. Levou com ele o secretário de segurança, José Mariano Beltrame. Segundo a reportagem do jornal O Globo, em 23 de março de 2007, "A Colômbia, que chegou a ser um dos países mais violentos da América Latina, é considerada hoje modelo de como diminuir índices de criminalidade". O texto, não assinado, afirma que Sérgio Cabral ficou animado com a visita: "Disse que pretende investir na área social em favelas do Rio, como o Conjunto do Alemão e Manguinhos. Para ele, a união ideal para reduzir a violência é policiamento maciço e investimento nas áreas mais pobres".
No Rio de Janeiro, assim que veio à tona a existência de bandos armados, mal chamados de milícias, essa mesma imprensa o tratou como um mal menor. Um mal que seria necessário para expusar traficantes varejistas e proteger os moradores da periferia. Afinado a este discurso, o prefeito do Rio, César Maia (DEM), costumava se referir a esses marginais como Autodefesas Comunitárias (ADCs). Em reportagem publicada no Globo de 9 de dezembro de 2006, Maia afirma: "A curto prazo, portanto dentro do Pan, as ADCs são um problema menor, muito menor, que o tráfico".
As mal chamadas milícias são grupos de policiais, ex-policiais, bombeiros, agentes penitenciários que controlam militarmente uma determinada região da cidade e administram serviços de gás, tv a cabo e segurança. São frequentes os relatos de ameaças, represálias, torturas e homicídios. Há muito se sabe da atuação desses grupos criminosos, mas só depois que uma equipe do jornal O DIA foi torturada na favela do Batan, em Realengo, Zona Oeste do Rio, é que as corporações de mídia deram o destaque merecido para tamanho escândalo. Um fato jornalístico que vinha sendo escondido em notas de rodapé e que respirava em uma ou outra reportagem maior.
Em debate realizado no dia 10 de dezembro passado, no plenário da Assembléia Legislativa, o professor da UFRJ Roberto Leher lembrou que "na Colômbia estão assassinando jornalistas e militantes de direitos humanos na ordem de centenas por ano.
PMDB e DEM envolvidos até a alma
Como afirma o juiz Walter Maierovitch, não existe crime organizado sem ramificações no Estado. A toda hora revela-se parte das relações entre políticos, empresários e o crime organizado no Rio de Janeiro e no resto do país. São exemplos a prisão do deputado estadual Álvaro Lins (PMDB), ex-chefe de Polícia Civil, sob as acusações de facilitação de contrabando, lavagem de dinheiro, corrupção ativa e formação de quadrilha armada. No mesmo dia o ex-governador do RJ e atual presidente do PMDB no estado, Antonhy Garotinho, foi denunciado pelo Ministério Público por formação de quadrilha armada.
Há outros parlamentares fluminenses acusados de envolvimento com atividades criminosas. O Ministério Público acusou a prefeita de Magé, Núbia Cozzolino (PMDB), de formação de quadrilha e apropriação e desvio de rendas públicas. O vereador Jerominho (PMDB) e seu irmão, Natalino José Guimarães (DEM), foram acusados pelo procurador-geral de Justiça, Marfan Vieira, de chefiar grupo de milícia conhecida pelo nome "Liga da Justiça", que atua na Zona Oeste da cidade. Há ainda o vereador Nadinho de Rio das Pedras (DEM), que foi preso ano passado acusado de envolvimento no assassinato do inspetor de polícia Félix dos Santos Tostes.
A infiltração desses bandos criminosos no governo do Estado do RJ não é novidade para o leitor do AND. Na edição de agosto de 2007, Maurício Campos, da Rede Contra a Violência, já denunciava:
— Aqui no Estado do Rio, e poderia dizer até no país, existe uma política de segurança e existe também uma prática das forças de segurança, que você nem pode chamar de política. Grande parte das forças de segurança é formada por grupos mafiosos, grupos que extorquem, têm negócios próprios, que exploram diversos serviços escusos e que em grande parte vivem de extorsão dos próprios bandidos não-fardados, dos próprios criminosos, do tráfico e por aí vai.