É do conhecimento de todos: o rastilho de pólvora da crise geral do capitalismo deu a volta ao mundo e voltou a estourar na Europa há cerca de um ano na forma de “crise da dívida” – depois da “crise de crédito” –, com o anúncio de que a Grécia não conseguiria pagar aos grandes bancos do continente suas dívidas monstruosas, tornadas monstruosas em função de juros exorbitantes. “Crise da dívida”: a absoluta incapacidade de os Estados nacionais pagarem os juros das suas dívidas públicas, o que os tecnocratas costumam chamar de “insolvência”.
Londres, manifestantes marcham no Hyde Park contra os cortes no setor público
Pois a “crise da dívida” europeia – manifestação da crise geral dos monopólios – se alastrou, e não apenas para os países mais periféricos da Europa, como Portugal e Espanha, considerados por alguns verdadeiras semicolônias sob a espoliação direta e feroz das potências Grã-Bretanha, Alemanha e França, mas também para nações como a Itália, que integra o G8, grupo dos países ditos mais ricos do mundo.
A crise geral do capitalismo está corroendo os alicerces de todos os arcabouços institucionais criados pelas classes dominantes da Europa para oprimir as classes trabalhadoras daquele continente: a União Europeia, o mercado comum europeu, o euro e todas as demais organizações supranacionais do continente a serviço dos grandes industriais e dos grandes especuladores.
Os chefes de governo já não se entendem sequer onde funcionavam perfeitamente alinhados na orquestração de seus caros instrumentos de espoliação dos povos. Foi o caso do rebaixamento da nota dos títulos da dívida de Portugal para “bônus lixo” no início de julho por parte da agência de “classificação de risco” Moody’s, mesmo com o país sob intervenção do FMI e do Banco Central Europeu, o que gerou raivosos protestos.
Outro daqueles instrumentos é o chamado “risco-país”. Pois no dia 11 de julho o “risco-país” da Espanha superou a marca de 300 pontos básicos, o que nunca havia acontecido desde a introdução da moeda única europeia, o euro, em janeiro 2002. No mesmo dia a taxa de risco italiana também bateu seu recorde de alta. Na Europa, o “risco-país” é medido por meio da comparação entre a rentabilidade do bônus da dívida nacional em dez anos e a rentabilidade do bônus da dívida da Alemanha, considerado o mais seguro do continente, com o mesmo prazo. Quanto maior o resultado da conta, mais ressabiados ficam os especuladores, cassineiros e financistas em geral.
São mais evidências da desgraceira dos capitalistas, à qual seus cupinchas empoleirados nas gerências dos elos mais fracos da União Europeia ora tentam remediar com draconianos “planos de ajuste da economia”.
Os recordes de alta do “risco-país” na Espanha e na Itália foram registrados simultaneamente à realização, em Bruxelas, de uma reunião de emergência da cúpula da União Europeia exatamente sobre as dívidas públicas espanhola e italiana.
Greve geral na Inglaterra
A simples notícia sobre a reunião, da qual participaram o chefe do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy, o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, e o comissário europeu para Assuntos Econômicos e Monetários, Olli Rehn, derrubou as bolsas de valores de Madri e Milão, bem como as de Paris e Frankfurt.
Como um animal em agonia, a UE exige dos seus membros redução de salários, cortes nos orçamentos dos serviços públicos, nova e ampla rodada de privatização do patrimônio do povo e liberdade para a indústria demitir à vontade. O resultado já se vê: a pobreza aumentou em termos reais nos países da Europa Ocidental pela primeira no pós-guerra, isso segundo a definição de pobreza vigente na Europa, segundo a qual é pobre aquele que a administração de cada Estado burguês considera arbitrariamente que não consegue satisfazer suas necessidades básicas.
Mas a classe trabalhadora, aquela que no curto prazo mais sofre na carne as consequências da corrosão capitalista – e para a qual não há pacotes de socorro, mas sim de “austeridade” – sente que o momento é para a forte confrontação com o capital em agonia, e está nas ruas, em movimentos e ações uns mais, outros menos organizados, uns mais, outros menos consequentes, mas com altivez e ânimo para a luta classista.
No dia 30 de junho os trabalhadores britânicos levaram a cabo uma grande greve geral contra os “ajustes” antipovo que vêm sendo pretendidos pela administração de David Cameron, sobretudo contra o aumento da idade para se aposentar de 60 para 66 anos, a privatização de universidades e do Serviço Nacional de Saúde britânico e contra o corte de 300 mil postos de trabalho nos serviços públicos.
Houve mobilização, atos e conscientização da população em tribunais, prisões, aeroportos, estações ferroviárias e centros de emprego, bem como em milhares de escolas e dezenas de universidades. O movimento contou com a participação de nada menos do que 750 mil funcionários públicos. Enquanto os trabalhadores britânicos lutam arduamente contra a dilapidação dos seus direitos e a dizimação do patrimônio do povo, a administração Cameron baixou de 28% para 24% o imposto sobre o lucro das empresas.
Na Espanha, onde o Parlamento – com a colaboração de sindicatos pelegos – aprovou o aumento de 64 para 66 anos a idade para se aposentar, os protestos são diários e disseminados por todo o país. Dando sequência aos acampamentos rebeldes levantados nas praças de inúmeras cidades espanholas, o movimento antieleitoreiro dos “indignados” tem organizado marchas contra o desemprego na capital Madri e cercos a prefeituras e outros órgãos de todos os níveis da administração estatal.
São cada vez mais comuns também na Espanha os protestos organizados contra o despejo em massa de pessoas inadimplentes com as parcelas dos seus imóveis. Por causa do desemprego recorde, cerca de um milhão de espanhóis não conseguem pagar os financiamentos de habitação aos bancos, que requisitam os respectivos despejos junto ao aparato repressivo do Estado espanhol. Trezentas mil pessoas foram desalojadas pelo Estado nos últimos dois anos e, mesmo perdendo as casas, são obrigados por lei – a lei burguesa – a seguir pagando aos banqueiros.