A crise econômica aqui no USA está se tornado uma verdadeira psicose coletiva, levando ao desespero os estadunidenses das classes populares ante a interminável onda de desemprego que já atinge quase 9% da população ativa e caminhando rapidamente para os 10%, o que representa 12,5 milhões de desempregados, na mais alta taxa dos últimos 25 anos. Hoje já é difícil encontrar aqui qualquer pessoa da classe trabalhadora que direta ou indiretamente não tenha sido atingida pelo fantasma da recessão, que nos últimos 6 meses levou boa parte dos 6 milhões de pessoas que perderam seus empregos às filas do seguro-desemprego, dos cupons de alimentação, fora os bens que perderam por falta de pagamento dos compromissos assumidos, inclusive o seguro-saúde e a casa própria.
Como não poderia deixar de ser, esta situação que se agrava a cada dia que passa está levando a parte mais desassistida do povo americano ao desespero, que se reflete estatisticamente no aumento da criminalidade, na falência pessoal, empobrecimento dos sistemas de educação e saúde e numa psicose coletiva, principalmente para uma sociedade cuja noção de valores é medida pela posse e acúmulo de bens materiais, como manda a cartilha capitalista.
Outro fato que também já está motivando uma séria preocupação é a impressionante taxa de suicídios verificada nas fileiras do exército, tanto entre jovens soldados da ativa como entre os veteranos já de volta ao seu país. Isto sem contar com os frequentes tiroteios entre eles, como o ocorrido quando um sargento executou cinco colegas e feriu mais dois em Camp Liberty (!), onde fica a sede da ocupação do USA e aliados no Iraque. O ataque ocorreu dentro de uma clínica que trata de militares atacados pelo estresse, cuja estatística mostra que um em cada seis soldados que voltam demonstram sofrer de estresse pós-traumático e outros distúrbios emocionais.
Sobre o fato, o Secretário de Defesa Robert Gates "mostrou-se horrorizado" segundo a imprensa daqui, acrescentando: "essa trágica perda de vidas pelas mãos do nosso próprio exército é causa de grande e urgente preocupação". O presidente Obama por sua vez se limitou a dizer que "ficou triste" e iria "procurar entender tudo o que levou a essa tragédia".
As autoridades e psicólogos militares chegaram a uma estranha (para eles) conclusão, declarando que não sabem as causas do impressionante aumento das taxas de chacinas e suicídios recentes entre os militares, número recorde em toda a história das recentes invasões do Iraque, Paquistão e Afeganistão, superando os números das invasões da Coréia e do Vietnã.
O que talvez causou maior surpresa aos senhores da guerra foi o aumento dos casos de suicídio em 2008, em 11% maior que em 2007, inclusive superando pela primeira vez a taxa com relação aos suicídios entre a população civil, o que levou a cúpula do exército a anunciar uma "campanha de treinamento e prevenção para identificar soldados vulneráveis". As autoridades admitem que esta tendência ocorre desde 2004, tanto na ativa como entre os reservistas, e eles mesmos se perguntam: "Por que os números seguem subindo?". Até parece que eles não sabem a resposta clara e cristalina que o mundo inteiro está cansado de saber e só eles não conseguem enxergar, ou melhor, fingem não enxergar: quando o jovem soldado é jogado na linha de frente, acaba descobrindo que não está guerreando, mas sim assassinando populações civis, destruindo escolas, lares e hospitais. Que não está realmente defendendo sua pátria e sim metido numa agressão, e que foi enganado pelas promessas das (aliás, muito bem elaboradas) propagandas de recrutamento fartamente veiculadas e espalhadas por todo país através da TV, folhetos e jornais, que seduzem os jovens com a promessa e perspectiva de ótimos salários, facilidades para estudar, fazer uma bela carreira no exército e ter um futuro garantido, então sua estrutura psíquica se desmonta, e daí para uma chacina ou suicídio é um passo.
Isto tudo sem contar também com os que voltam inutilizados física e mentalmente e se entregam às drogas e ao álcool, uma forma indireta de suicídio, além de outros problemas decorrentes da falta de assistência médica dentro do USA aos que voltam mutilados e neuróticos, e a consequente falta de perspectivas pessoais para o futuro na família e no trabalho, agora principalmente agravadas com a recessão econômica.
Um estudo do próprio exército revela que em 2007 o número de suicídios (entre soldados) foi de 115, e pulou para 143 em 2008, sendo que somente no mês de março ultimo ocorreram 13 suicídios. Perguntado por um repórter o porquê desses números continuarem subindo, o Secretário do Exército respondeu: "Não sabemos…(!). Os oficiais graduados garantiram que não há um único fator(!) que explique o aumento de suicídios…".
As estatísticas divulgadas recentemente pelo exército do USA mostram que 30% dos que se suicidaram no ano passado estavam em missão no momento da sua morte, e para 75% do grupo era a primeira vez que participavam de um conflito. Cerca de 35% dos soldados que se suicidaram no ano passado não haviam sido mobilizados antes. Outros 35% se mataram depois de terem sido enviados para o combate, na maioria dos casos 1 ano após terem voltado para as suas bases.
As altas autoridades e médicos, aqueles mesmos que dizem não saber as causas do aumento das taxas de suicídio, citam agora em relatório problemas de relacionamento entre os próprios soldados ou seus superiores, questões financeiras, legais, familiares e estresse no trabalho como fatores principais. De acordo com o mesmo informe, os autores fizeram uma relação significativa entre as tentativas de suicídio e o tempo que os soldados permaneceram nas áreas de conflito. Já uma outra pesquisa havia descoberto que ¼ dos veteranos das invasões do Iraque e Afeganistão tratados em centros médicos de reabilitação do exército no USA sofre de problemas mentais e/ou dependência química.
O diagnóstico mais frequente das causas de suicídio era o estresse pós-traumático, mas ansiedade, depressão e uso de substâncias tóxicas foram considerados problemas de saúde mental que podem certamente levar ao gesto extremo. Outros estudos também concluíram que os recursos dos centros de reabilitação do exército não foram suficientes para a quantidade de homens e mulheres enviados para as guerras de agressão.
Outro problema da maior gravidade e que tem elevado a taxa de suicídio entre os militares é o desafio e a pressão a que são submetidos os funcionários encarregados do recrutamento de tropas. Apesar de amparados por uma propaganda massiva e caríssima, os centros de recrutamento largamente espalhados pelo país já não conseguem como antes, enganar os jovens com as falsas promessas de um futuro brilhante. São 1.650 postos de recrutamento estrategicamente localizados nas ruas principais e centros comerciais em todas as cidades do país sob a responsabilidade de suboficiais, geralmente veteranos do Iraque e Afeganistão, que trabalham geralmente das 6 da manhã às 10 da noite, e que tem como obrigação impostergável a incorporação de, no mínimo, dois soldados por mês.
Seus superiores (por sua vez pressionados pelos escalões mais altos) exercem uma pressão implacável sobre os recrutadores, cuja grande maioria (70%) esteve na frente de batalha e está com sua estrutura psíquica visivelmente abalada. Se não conseguem cumprir sua cota mínima, os recrutadores são ameaçados com as mais variadas formas de castigo, principalmente o de perder o emprego e o de ser execrado por seus colegas e superiores. Quando a pressão se torna insuportável não são poucos os que escolhem a solução pelo suicídio.
Numa reportagem sobre o problema, a revista "Times", uma das maiores tiragens aqui do USA, publicou extensa e interessante matéria na edição de 13 de abril, sob o titulo "The dark side of recruitig" (O lado obscuro do recrutamento). A matéria destaca um fato acontecido com a sargento Amanda Handerson, titular de um serviço de recrutamento no Texas, quando foi visitar seu colega, também sargento administrativo, Larry Flores, e ficou chocada com a péssima aparência do seu colega, antes um rapaz bonito e sempre muito disposto.
Perguntou ela: "Tudo bem com você?", ao que ele responde: "Estou somente muito cansado. Tive uma longa semana e estou mal".
Na semana anterior ele fora severamente admoestado pelo oficial, seu chefe, por não ter cumprido sua cota apesar de ter trabalhado o tempo todo das 6 às 10 da noite tentando persuadir uma comunidade de jovens descendentes indígenas a vestirem o uniforme do exército ianque.
"Não se preocupe, estou OK".
Mas na verdade ele não estava nada bem. Tanto que na mesma noite passou uma corda no pescoço e enforcou-se.
Amanda contou o fato para o seu marido Patrick, também sargento recrutador, ficando ambos muito chocados, principalmente o marido de Amanda, que era grande amigo de Flores.
Seis semanas depois, quando chegou em casa, Amanda foi encontrar o marido enforcado com a corrente do seu cachorro de estimação.