Extrema-direita monta cursos paramilitares para crianças e adolescentes

Extrema-direita monta cursos paramilitares para crianças e adolescentes

Como fenômeno da crise política, econômica e social pela qual o país passa, organizações e indivíduos destacados da extrema-direita estão abrindo cursos paramilitares por todo o Brasil com o foco no recrutamento de crianças e adolescentes de 5 a 24 anos. Em tais escolas, os jovens recebem treinamento de guerra e são doutrinados na ideologia fascista pelos seus “professores”.

Reprodução

Anticomunismo visceral e ideologia fascista são os conteúdos dos cursos

Os principais cursos deste segmento são conhecidos como: Academia Militar Mirim e Força Pré-Militar Brasileira ou Força Patriota Estudantil (Fope). Nas imagens disponíveis das “aulas” na internet, é possível observar crianças e adolescentes portando armas, que o curso diz se tratarem de simulacros, enquanto realizam treinamentos de combate e sobrevivência em ambientes de selva. Os treinamentos são orientados por adultos, muitos deles com formação militar. O que realmente é grave, no entanto, é o conteúdo dos cursos, voltados a adestrar crianças e jovens na ideologia fascista e no anticomunismo visceral.

Academia Militar Mirim

A Academia Militar Mirim tem sede em Brasília e promete ensinar a jovens de 5 a 15 anos valores como hierarquia, disciplina, respeito a símbolos nacionais, valorização da família, ordem unida, ética e civismo. Os cursos são ministrados aos sábados, as aulas têm duração de duas horas e a carga horária total do curso é de seis meses. Os responsáveis pela “escola” cobram aos pais e responsáveis das crianças o valor de R$ 150 de mensalidade e R$ 105 pelo uniforme de tipo militar. As aulas da Academia Militar Mirim, em Brasília, estão marcadas para começarem no dia 4 de junho e serão ministradas na Universidade Católica de Brasília (UCB).

A empresa “Pem cursos e treinamentos” é a responsável pela Academia, e quem responde pelo seu Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) é Maurício Almeida. Junto com ele na empreitada também estão os irmãos Perth José Passagli e Walter Passagli. Perth é dono da PJP Cursos e Treinamentos, empresa que possui a propriedade do domínio do site da Academia Militar Mirim, criado em 12 de agosto de 2021. Outra pessoa que está diretamente envolvida com a Academia Militar Mirim é o coronel Costa Júnior, da Polícia Militar de São Paulo, que presta consultoria ao curso. Já Walter Passagli atua no processo operacional da organização. No dia 29 de maio de 2022, ele participou de uma reunião de apresentação do curso, juntamente com os pais e responsáveis de candidatos a alunos. O evento aconteceu em uma sala de aula da Faculdade LS, no pistão Sul, em Taguatinga, no Distrito Federal.

Na reunião, Walter, após fazer a apresentação e tentar convencer os pais a assinarem um contrato com a Academia, destacou a necessidade dos pais não irem visitar o curso, principalmente durante as oito primeiras aulas. “As primeiras oito aulas são importantíssimas e a gente pede que vocês deixem seus filhos com a gente. Você não vai poder participar porque a disciplina em 90% dos casos não combina com pai e mãe”, destacou o reacionário.

Todos os citados como responsáveis pela Academia Militar Mirim são ferrenhos bolsonaristas. Em suas redes sociais na internet defendem manifestações golpistas e negam as medidas de combate a Covid-19. Além disso, ao menos três dos citados tentaram se eleger para cargos do velho Estado através da farsa eleitoral. Perth foi candidato a vereador de Suzano, no interior paulista, nas eleições de 2021 pelo MDB. Walter se lançou candidato também a vereador de Suzano no ano de 2016 pelo PR. Já o coronel Costa Júnior foi candidato a prefeito de Mogi Guaçu, também em São Paulo, no ano de 2020 pelo PRTB. Nenhum dos três obteve êxito.

Fope

Assim como a Academia Militar Mirim, a Fope também tem como alvo jovens de 6 a 24 anos. O autointitulado “comandante” da Fope é Daniel Majone Maretto. No histórico de Daniel, consta uma prisão em flagrante ocorrida em 2009. Ele foi acusado de fundar a empresa A.F.E. Cursos Preparatórios, um curso preparatório falso. Sendo assim, Daniel foi preso por estelionato após prometer que os alunos ingressariam automaticamente nas Forças Armadas reacionárias depois de realizar o curso. À época, Daniel foi preso dentro de uma sala de aula na frente de 300 alunos, em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.

Agentes da contrarrevolução

O surgimento de tais grupos e “escolas” lembra em partes as escolas de ensino cívico e religioso da década de 60, como a Tradição, Família e Propriedade (TFP), grupo católico ultrarreacionário fundado pelo ex-deputado paulista Plínio Corrêa de Oliveira poucos anos antes do golpe militar de 64.

Essas escolas recrutavam jovens pobres do interior do Brasil. Para convencer as famílias, os dirigentes dessas organizações ofereciam ensino escolar, alimentação e moradia para as crianças e adolescentes que estudavam em regime de internato. Dada a situação de penúria das famílias e o fato de se estar oferecendo um ensino religioso, muitas aceitavam a oferta.

Contudo, nestes locais os jovens eram submetidos a todo tipo de humilhações e torturas físicas e psicológicas. Sendo obrigados a viver de forma feudal, inclusive utilizando roupas que lembram os cavaleiros templários² da Idade Média. Além disso, eram obrigados a realizar treinamentos de guerra, inclusive com a utilização de armas de fogo. Alguns destes jovens ainda eram mandados para o Estados Unidos (USA) para aprimorarem o treinamento com armas e aprenderem táticas de combate à guerrilha. Seus líderes justificavam o treinamento argumentando que os jovens tinham que se preparar para a guerra contra o “mal”, que na visão deles se materializa nos comunistas e democratas contrários ao regime militar fascista.

A TFP ainda continua a atuar no Brasil agora com o nome de Arautos do Evangelho. A instituição enfrenta acusações de homicídio, estupro, indução ao suícidio, torturas e outras.

Organizações populares atacadas

A revelação da atuação destes grupos paramilitares e ultrarreacionários desmascara os ataques hipócritas feitos por reacionários defensores da velha ordem aos movimentos democráticos e de luta pela terra.

Não são poucas as acusações feitas, inclusives pelo judiciário, de que organizações populares e de massas como a Liga dos Camponeses Pobres (LCP), a Frente Nacional de Lutas Campo e Cidade (FNL), o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e outras, utilizam crianças em seus acampamentos e ocupações. Até mesmo quando jovens moradores de favelas nas grandes cidades vão às ruas protestar contra a violência policial são acusados de serem bandidos ou de estarem a serviço de traficantes.

Os reacionários tentam apagar o fato de que os jovens também fazem parte da luta de classes e sofrem com os efeitos desta, sendo vítimas dos cortes de direitos básicos feitos pelo velho Estado e dos ataques armados do latifúndio e da polícia e, portanto, crianças e adolescentes podem também ser agentes ativos na defesa dos direitos do povo.


Nota:

1 – Matéria feita com base na reportagem “Bolsonaristas usam escolas paramilitares para doutrinar crianças”, da jornalista Vanessa Lippelt do jornal Congresso em Foco.

2 – Os Cavaleiros Templários eram membros de uma ordem religiosa e militar católica fundada em 1120 durante as Cruzadas.

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