FGTS para o capital financeiro

FGTS para o capital financeiro

O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço — FGTS é mais um dos grandes engodos impetrados pelo Estado, subserviente aos interesses do grande capital financeiro imperialista, para reforçar a exploração do trabalhador brasileiro. No entanto, é apresentado como uma garantia que deve ser defendida. Relações trabalhistas em que o detentor dos meios de produção sempre cria meios de alienar a produção daquele que vende sua força de trabalho.

A mesquinhez e a crueldade do sistema imperialista não vêm encontrando limites ao promover a involução assustadora das chamadas “garantias trabalhistas”, gradativamente destruídas, acelerando um inusitado processo de genocídio.

É no contexto da contra-revolução de 1964 que surge o famigerado FGTS, já na administração Castello Branco, em 13 de setembro de 1966. Além da assinatura do marechal, a caneta passou pelas mãos de Octávio Bulhões, L. G. do Nascimento e Silva e Roberto Campos, um dos maiores traidores e vendilhões da pátria, que não assinaria o seu nome em algo que não fosse lesivo ao povo brasileiro. O monopólio dos meios de comunicação, o Estado e demais empregados de luxo do imperialismo na área trabalhista conseguiram construir a imagem do FGTS como um direito, cuja opção, por sinal, era obrigatória. Vale lembrar, quando administrada pela parte patronal e o Estado (também patronal), as garantias econômicas como estabilidade, férias, indenizações, repouso semanal e 13°, seguros previdenciários e toda a legislação pertinente — que deveriam se constituir em condições mínimas de manutenção do trabalhador — torna-se um subterfúgio que o prende ao sistema.

Garantia de quê ?

A criação do FGTS foi uma desconstrução das relações de trabalho criadas por este mesmo sistema perverso que erigiu uma grande sofisticação na chamada Era Vargas, com reparos mais cruéis a partir do gerenciamento militar, com ininterrupto prosseguimento no atual apogeu do peleguismo; essa belle époque do oportunismo.

De acordo com legislação de 1940, os trabalhadores demitidos com menos de 10 anos recebiam uma indenização equivalente a um mês de salário por cada ano trabalhado. Ao completar 10 anos de trabalho, não poderia haver demissão, exceto nos casos de falta grave. No caso de demissões por conveniência do empregador, estabelecido um “acordo” de rescisão do contrato de trabalho, este pagava ao trabalhador uma indenização correspondente a 2 meses de salário por ano trabalhado. Já o FGTS é formado por depósitos mensais, efetuados pelas empresas em contas individuais no nome de cada um de seus empregados, no valor equivalente a 8% das remunerações. No caso de contrato temporário de trabalho (já uma “garantia” criada no apogeu do peleguismo) com prazo determinado, o percentual é de apenas 2%. Como os contratos temporários são curtos e os não-temporários não têm nenhuma garantia, o FGTS em nenhum caso é benéfico ao trabalhador, porque em qualquer caso o patrão hoje recolhe um percentual maior ou menor, à sua escolha, para se livrar daquele a quem explora quando bem entender.

Desta forma, estimula-se o chamado revezamento em detrimento da estabilidade do trabalhador que, findo o contrato, estará desempregado outra vez, recebendo pela expulsão do local de trabalho, ainda que sem justa causa, bem menos do que recebiam os trabalhadores antes de 64. Os cínicos defensores dos interesses monopolistas argumentam que a lei anterior gerava problemas, como a demissão sumária de trabalhadores ao completar os 9 anos de casa, isto é, antes que adquirissem a estabilidade. Ora, se o problema alguma vez residiu no fato dos trabalhadores serem demitidos aos 9 anos de serviços prestados, é que os monopólios dos meios de produção perseguem o objetivo do lucro (quer seja, da exploração), e não o de elevar a estabilidade material do homem produtivo; nunca o de lhe assegurar um emprego com pagamento condigno.

O FGTS reduziu a estabilidade, em média, de 9 anos para alguns meses, constituindo-se numa das mais sólidas garantias patronais conquistadas pela legislação anti-proletária no Brasil.

Além disso, o FGTS nem sequer é pago em muitos casos. Devido ao desemprego estrutural, corroborado por outros assaltos ao trabalhador, onde um arsenal de artifícios jurídicos e pressões econômicas obrigam o infeliz proletário a vender sua força de trabalho sem nenhuma garantia, sequer carteira assinada — movido pela única oportunidade de receber um mísero pagamento que o permite escapar da fome por um curto período de tempo.

A ditadura fazia política

Após o golpe seguiu-se uma violenta crise que atingiu em cheio a pequena burguesia nacional, particularmente os pequenos e médios comerciantes e industriais, com um acentuado processo de falências e concordatas, acirrando ainda mais as contradições entre o povo por um lado e as classes e setores contra-revolucionários por outro: o latifúndio e a burguesia monopolista basicamente. O terror implantado nos sindicatos, o arrocho salarial, a junção dos institutos previdenciários e o fim da estabilidade pareceu arrefecer os ânimos um tanto exaltados do pequeno e médio empresariado brasileiro — historicamente acostumado a descarregar seus prejuízos no adversário mais fraco. Mas a parte do empresariado nacional que mantinha contradições antagônicas com o imperialismo também foi prejudicada com o FGTS. Afinal, as leis fundamentais do país não são elaboradas nem mesmo para os ricos brasileiros, mas para socorrer os interesses do imperialismo, situação que os ricos nativos tratam de aproveitar em razão de seus privilégios de classe, até o ponto em que esses privilégios podem ser úteis.

No início, esses empresários obtiveram enormes vantagens sobre o proletariado, dado a grande e repentina desvalorização da força de trabalho. No entanto, com o passar do tempo, iniciativas como o FGTS revelaram que esse era um álibi do capital financeiro, notadamente estrangeiro. Os depósitos de “indenização” tornaram-se obrigatórios em banco, o que beneficiou em muito os banqueiros e o capital especulativo, como sempre. Desta forma, a vantagem que o pequeno empresário usufruia sobre o trabalhador teve que ser compensada com a obrigatoriedade do depósito em banco, mensalmente, simultâneo ao aumento dos encargos que já existiam, que aumentavam e se multiplicavam de uma maneira geral.

A fiscalização muitas vezes tornou-se impiedosa para os pequenos e médios empresários, embargando e alienando os bens da empresa inadimplente, ampliando o leque de situações insustentáveis de multas e juros. Além disso, a rotatividade criou também imensos problemas para as pequenas empresas, basicamente atacando as tradições de trabalho, de ofício, hábitos de trabalho, etc.

Data dessa época o espetacular crescimento no ramo da construção civil, por exemplo, cujas empresas, mais do que em qualquer outro setor da economia, se tornaram suficientemente aptas para dispensar levas de trabalhadores durante as etapas de cada obra, principalmente após concluírem os trabalhos de fundação. Desta forma, as construtoras e empreiteiras ampliaram enormemente sua capacidade de exploração da força de trabalho, já de tão baixo valor.

O FGTS, todavia, foi mais “democrático” em se tratando de desastres: o fenômeno se repetiu entre os assalariados dos setores administrativos atingindo as profissões mais “elitizadas”, como os chamados profissionais liberais, entre advogados, médicos, dentistas, engenheiros etc., categorias que, sem estabilidade e concorrendo com muitos outros profissionais da área devido a baixa oferta de emprego, viam acelerar sua proletarização, e o despencar de seus salários e da sua segurança — que o status de sua formação não mais lhes conferia.

O agravamento do quadro de desemprego estrutural, através da prática da rotatividade, aproximou todavia um dos preceitos socialistas de que os grandes meios de produção — edifícios comerciais, indústrias, centros empresariais entre outros — devem passar imediatamente para as mãos do povo trabalhador, evitando que os monopólios privados controlem a vida material do povo, arruinando inteiramente a nação.

Rastros da corrupção

A gestão do Fundo é feita por um Conselho Curador, formado por representação tripartite: da gerência, dos empregados e dos empregadores. Ou seja, do patrão, pelo patrão e para o patrão. A administração dos recursos do FGTS foi inicialmente realizada pelo BNH (Banco Nacional de Habitação), sendo, atualmente, administrado pela CEF — Caixa Econômica Federal. São destinados ao financiamento da Habitação Popular 60 por cento, e do Saneamento Básico e Infra-Estrutura Urbana 40 por cento. A Caixa está cada vez mais priorizando as suas atividades comerciais, pautando-se na geração de lucros em detrimento de sua função original que é a de atender à população.

O foco da Caixa Econômica Federal tem sido o de ganhar competitividade como banco comercial, com interesse voltado em ampliar o número de correntistas, liderando nas captações da caderneta de poupança do país, na administração de fundos de investimento e na ampliação de sua rede de agências para, novamente, servir aos grandes empreiteiros. O dinheiro do Fundo é emprestado por um custo muito baixo às grandes empreiteiras, especuladoras do mercado imobiliário e de outros ramos, para onde sempre retorna capitais a pretexto de novos empréstimos.

Os problemas de saneamento básico e habitação estão se agravando no país, conforme atesta Raymundo Oliveira, presidente do Clube da Engenharia em carta de sua autoria ao Ministro do Planejamento, publicada no site da instituição: “(…)Depois que a Caixa absorveu as funções do extinto BNH (Banco Nacional de Habitação), o que se viu foi o crescimento da população favelada, por falta de uma política habitacional, e o aumento da poluição de rios, lagoas e praias, provocada pela ausência de saneamento básico, e, no que tange ao suprimento de água potável, constatamos que não são mais realizadas, na dimensão necessária, obras de adução, tratamento e distribuição de água potável.”

E rende menos

A carta de Raymundo Oliveira segue atestando a incapacidade ou má vontade da Caixa até mesmo de gerir os recursos do FGTS na habitação e no saneamento básico, desta vez através de números “(…) depois que o FGTS passou a ser administrado pela Caixa, os recursos para habitação e saneamento tornaram-se escassos. No primeiro semestre deste ano, dos R$ 5 bilhões, destinados pelo Conselho Curador do FGTS para financiar a habitação, a Caixa aplicou apenas R$ 1,4 bilhão. (…) As reservas do FGTS já somam mais de R$ 100 bilhões. Este montante é mais do que suficiente para justificar a necessidade da criação de um agente de fomento para as áreas de Habitação e Saneamento, que tenha como foco a aplicação destes recursos.”

O imperialismo, seus mordomos de luxo e suas instituições danosas, entre elas destacando-se os bancos, se aprimoram na prática de rapinagem ao dinheiro do trabalhador. Como se já não bastasse o FGTS ter contribuído para o aumento do desemprego, tampouco ter sido utilizado em habitação e saneamento básico (independente dos sofismas empregados desde a consolidação contra-revolucionária do sistema em vigor iniciado na administração Castello Branco), ainda possui um rendimento ínfimo, muito diferente dos rendimentos vultuosos das ações milionárias de empresas imperialistas, em especial ianques.

O FGTS é formado por depósitos mensais, efetuados pelas empresas em contas individuais, em nome de cada um de seus empregados, no valor equivalente a 8% das remunerações. No caso de contrato temporário de trabalho com prazo determinado, o percentual é de 2%. Esses depósitos são remunerados com juros: de 3% a 6% ao ano, para quem optou pelo FGTS até setembro de 1971 e 3% ao ano para as contas abertas a partir daí. Um rendimento tão risível que a poupança, investimento ridicularizado e sinônimo de baixa remuneração, garante rendimento mensal maior, sendo de 0,5% + TR.

Hoje, no quadro da luta econômica dos trabalhadores e da construção das suas organizações classistas de novo tipo, em oposição aos sindicatos burocráticos, sem dúvida, se insere nos pontos programáticos uma resoluta e cabal atitude, cujo vigor de suas lutas se amplie à questão da estabilidade nos postos de trabalho.

Os empresários que têm profundas contradições com o imperialismo e seu suporte social interno necessitam negociar com os trabalhadores em condições mais justas. Por outro lado, isso ocorrerá na medida em que os trabalhadores desenvolverem suas formas de lutas, já que ninguém faz acordo com quem não tem forças.

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