“Luche, luche, luche,
no deje de luchar
por un gobierno obrero,
obrero y popular”
Palavra de ordem cantada nas ruas
de Córdoba, Argentina, em maio de 1969.
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Mobilização dos eletricitários
liderados por Augustín Tosco, maio de 1969
Em maio de 2009, completaram-se quatro décadas do maior levante operário já ocorrido na América Latina. O Cordobazo começou com uma sucessão de assembléias sindicais sem muita identidade de métodos e objetivos e terminou com a tomada da cidade que lhe dá nome — Córdoba, capital da província homônima — pela classe operária que formava a maioria de sua população.
Em 1969, a Argentina era o segundo país mais industrializado das Américas (perdendo apenas para o USA) e Córdoba era o segundo maior pólo industrial da Argentina, atrás apenas da região metropolitana de Buenos Aires; o peso relativo dos operários industriais em sua população era, porém, maior que na capital. Concentrava-se ali quase toda a indústria automobilística instalada no território argentino (à frente Fiat e Renault, através de suas controladas Concord, Materfer e Ika ) e todo um forte setor metal-mecânico. Além disso, havia também indústria alimentícia, têxtil, produção de vidro e diversos outros bens de consumo não-duráveis.
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Operários armaram barricadas e polícia debandou
A implantação e desenvolvimento do capitalismo burocrático na Argentina, ao mesmo tempo que colocou toda a economia a serviço dos monopólios transnacionais, criou uma poderosa classe operária. Para obter essas conquistas ou para defendê-las, já havia protagonizado ao menos três grandes acontecimentos: a semana trágica de 1919, o 17 de outubro de 1945 e a greve geral de 1959.
Em 1969 iniciou-se o período do auge tanto do sistema de exploração quanto do sistema de opressão. Se por um lado os monopólios, para se expandirem em busca do lucro máximo, só poderiam fazê-lo avançando sobre os direitos dos trabalhadores, a classe operária chegou ao limite de suportar o modelo corporativista implantado, principalmente, pelo peronismo.
O começo
A gerência do general Juan Carlos Onganía , instaurada em 1966, havia aprofundado a política anti-operária que os vários governos militares que sucederam-se após a queda de Perón vinham adotando desde 1955. O fechamento da comissão paritária encarregada de estabelecer o valor do salário mínimo; o congelamento geral de salários; as inúmeras intervenções nos sindicatos que se mostrassem combativos; o aumento da idade mínima para aposentadoria; e a redução da indenização a que os trabalhadores tinham direito quando demitidos foram algumas das medidas de Onganía e de seu ministro da Economia, Adelbert Krieger Vasena.
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Cordobazo ganha força com apoio estudantil
A mobilização dos sindicatos cordobeses — de início, cada um por si — teve início em razão de duas medidas, anunciadas no começo de maio de 1969: a imposição do trabalho em turno integral aos sábados e a permissão para que as indústrias da província pagassem salários menores que os pisos definidos em convenção coletiva. Iniciada com paralisações decretadas pelos sindicatos metal-mecânicos (SITRAC, da Concord ; SITRAM, da Materfer ; UOM e SMATA, que representavam o conjunto da categoria) e dos transportes (UTA), ela logo recebeu o reforço do Luz e Força, dos eletricitários, liderado por Agustín Tosco, que viria a se destacar como um dos quadros mais brilhantes e combativos do movimento sindical argentino.
A rebelião ganha corpo
Tosco, Elpídio Torres (SMATA) e Atílio López (UTA) foram os artífices da tomada da cidade pelos operários, ocorrida em 29 de maio. Com o apoio de entidades estudantis, começaram a por o plano em marcha no final da manhã daquele dia, que significava não apenas tomar os locais de trabalho como marchar deles até o centro da cidade. Os operários armaram barricadas, atacaram as instalações de monopólios transnacionais como Xerox e Citröen e fizeram a polícia debandar. Enviado a Córdoba ainda na noite de 29 de maio, o Exército precisou de três dias para retomar o controle da situação.
O saldo
A consequência imediata do Cordobazo foi a queda de Krieger Vasena e, pouco depois, a deposição de Onganía (em 1970) pelas próprias forças armadas. Tosco, Torres e López foram presos, julgados e condenados por um Conselho de Guerra, mas a combatividade dos operários cordobeses não arrefeceu.
O ápice do processo iniciado com o Cordobazo acontece, porém, poucos anos depois, fora de Córdoba. Entre 1973 e 75, escreve-se o capítulo mais radical da história do movimento operário argentino em Villa Constitución , província de Santa Fé. Diversas fábricas são tomadas por seus trabalhadores, o que culmina com a ruptura entre a seção local da União Operária Metalúrgica (UOM) e a direção nacional burocratizada. Os operários de Villa Constitución são massacrados pelo Exército em março de 1975, num ensaio do que aconteceria a partir da instauração da gerência de Videla , no ano seguinte. O golpe de Estado de 24 de março de 1976 e o sanguinário regime militar que seguiu-se a ele expressam o pânico dos monopólios transnacionais e seus sócios internos diante dos níveis de consciência e participação atingidos, a partir do Cordobazo .
Limites
Mais recentemente a classe operária argentina lançou-se em novos levantes que provocaram, inclusive, um rodízio de presidentes que só se estabilizou com a ascensão de Kirchner com a proposta de deter o processo de desindustrialização e desnacionalização posto em prática por Menem à frente da fração compradora da burguesia, colocando em seu lugar um projeto de retomada do capitalismo burocrático e dando ênfase ao fortalecimento da fração burocrática da burguesia. Seu plano contemplava a retomada do corporativismo peronista, segurando o ímpeto revolucionário das massas em benefício da aristocracia operária.
Os limites deste tipo de levantamento foram mostrados historicamente. Eles chegam a derrubar ministros, mudar políticas e até derrubar presidentes, mas, por se tratar de movimentos que partem de uma forte motivação econômica e têm sua organização respaldada na explosão espontânea das massas, carecem de uma organização e uma politização, capazes de colocar sua mobilização no rumo da tomada do poder político. Não há como negar que foram grandes ensaios mas que, se não souberem tirar proveitos dos erros cometidos, tenderão a perder o caráter revolucionário e cair no reformismo tão ao gosto dos oportunistas e dos revisionistas de ontem e de hoje.
A experiência do já demonstrou a necessidade de um partido verdadeiramente revolucionário que conduza a classe operária a conformar com o campesinato, principalmente pobre, a aliança operário-camponesa e, com as demais classes exploradas da sociedade, nuclear a Frente Única Revolucionária para a tomada do poder.