Hugo, no estúdio de onde comanda, há 45 anos, seu programa de frevo
Há alguns anos a prefeitura do Recife, gerenciada pelo PT, implantou um modelo que chama de carnaval multicultural. Segundo o radialista Hugo Martins, trata-se de “uma fórmula que permite importar músicos estranhos ao carnaval, que recebem seus pagamentos em dia e às vezes até adiantados, em detrimento dos pernambucanos. Este absurdo acontece inclusive na abertura do carnaval recifense, que agora é feita até por músicos estrangeiros”. Hugo tem razão e bagagem de sobra para formular suas críticas. Afinal de contas, há 45 anos que ele comanda o programa O Tema é Frevo, na Rádio Universitária FM, único programa a divulgar esse tipo de música o ano inteiro.
Paraibano de Rio Tinto, ele chegou a Pernambuco em 1948, aos 11 anos, e começou no rádio em 1956, como operador de som. Nesse período participou de algumas greves e mobilizações de sua classe. “Em 1962 cheguei a ser demitido na Rádio Jornal após uma paralisação dos radialistas. Muita gente perdeu seus empregos e fomos pro Rio de Janeiro, porque as rádios daqui não queriam nos empregar”.
“Em todas as épocas do ano se ouve música popular brasileira. E frevo é música popular brasileira!” — é um dos seus bordões prediletos, que ele repete no programa O tema é frevo, que ele pôs quando voltou para Pernambuco, em 10 de outubro de 1967, primeiramente pela Rádio Universitária AM, e depois pela FM. “Infelizmente a Rádio Universitária AM foi sucateada pela Universidade Federal de Pernambuco e, desde o ano passado, saiu do ar”. O programa foi transferido para a estação FM, mantendo o seu público com acesso às preciosidades que Hugo toca aos sábados, a partir das 16h.
Ele também comanda o programa Evocação, especialista em Bandas de Músicas, todos os domingos, às 7h, na mesma estação [www.tvu.ufpe.br]. “Os nossos programas sobrevivem porque é uma rádio da Universidade, que tem compromisso com a cultura. Em outras emissoras, os programas já teriam acabado”.
— O povo que não se orgulha da sua cultura não merece respeito de ninguém. Acho muito humilhante a prefeitura chamar gente de outros estados e países para abrir o carnaval. Pernambuco não precisaria de ninguém para abrir o carnaval. Porque o estado com maior diversidade musical é este. O Baile Municipal serve apenas para homenagear gente que vem de fora e que recebe o cachê na hora. Enquanto os músicos da cidade que tocam aqui só recebem um ano depois, e às vezes nem recebem.
Apaixonado pelo frevo, Hugo diz que “é um ritmo fascinante e alegre, que não tem igual no mundo”. Aposentado, mas sem parar de trabalhar, ele tem as gravações de todos os seus programas no acervo do Centro da Música Carnavalesca de Pernambuco, fundado por ele em 1986. E também produziu, a partir de 1977, a série de discos “O tema é frevo”, além de compor vários frevos.
— Mas veja que coisa curiosa: como paraibano, eu não consigo compor um frevo da mesma maneira do músico pernambucano. Apesar de viver aqui há tantos anos e estar plenamente identificado com a cultura, o meu frevo sai diferente, assim como saem os frevos de compositores baianos, por exemplo. Mas, infelizmente as autoridades não valorizam a nossa cultura como ela merece. Quando a cidade de Bonn completou dois mil anos, nós estivemos lá, a convite do governo alemão. Eles disseram que admiravam muito a nossa cultura e nos convidaram para representar o Brasil. Tudo era pago, menos as passagens. Falamos com a prefeitura do Recife e o governo de Pernambuco, mas eles não financiaram as passagens. Mas os alemães queriam tanto que a gente fosse que enviaram os bilhetes. Foi a orquestra de Ademir Araújo, o Maracatu Porto Rico do Oriente e uma escola de samba. A gente se apresentou também em Hanover, Berlim, e Bruxelas, na Bélgica. Ao final das apresentações o público não queria deixar a banda sair do palco, eles ficaram maravilhados com o frevo. E, por fim, apareceram músicos da Orquestra Sinfônica de Berlim e perguntaram como a gente tocava uma música tão difícil e ainda dançava. É essa música maravilhosa que as pessoas ainda não valorizam como ela merece — conclui.