No dia 3 de outubro dezenas de milhares de pessoas iniciaram uma retumbante marcha na Índia, prevista para durar quase um mês, atravessando o norte do país. Elas empunhavam bandeiras e entoavam canções de protesto para reivindicar terra e moradia para os milhões de trabalhadores que padecem com o desemprego ou o subemprego e vivem na mais absoluta miséria, em condições de vida precarizadas na proporção inversa ao tamanho do embuste do “desenvolvimento” daquela nação, dita “emergente”.
A marcha de protesto largou com o gigantesco número de 40 mil pessoas da cidade de Gwalior, no estado de Madhya Pradesh, e vai percorrer nada menos do que 350 quilômetros antes de chegar a Nova Deli, desfecho previsto para o dia 28 de outubro. A expectativa é de que o número de participantes da marcha aumente para cem mil.
Dados das Nações Unidas mostram que 17% dos moradores de favelas de todo o mundo, ou 170 milhões de pessoas, estão na Índia. Outros milhões vivem nas calçadas e nas inúmeras estações de trem do país.
Como na maioria dos protestos dessa magnitude realizados nas semicolônias do mundo, toda esta insatisfação popular e todo esse ânimo para a luta árdua correm o risco de ser cavalgadas por organizações oportunistas sempre prontas para acordos com os poderosos que resultam em quase nada em termos de benefícios para o povo e em algumas migalhas para os artífices da conformação com o inimigo.
No ano de 2007, numa outra marcha desse tipo, que contou com a corajosa participação de 25 mil pessoas, em grande parte camponeses endividados que exigiam o direito de acesso à terra e aos meios de subsistência para a produção de alimentos, chegou ao fim com um número de onze pessoas mortas. Na época, a gerência de Nova Deli criou um tal Conselho Nacional de Reformas da Terra, sob a chefia do “primeiro-ministro” Manmohan Singh, prometendo atender as reivindicações dos manifestantes, mas tudo resultou em nada.
Duas greves contra medidas anti-povo
Aliás, como no Brasil – onde vigoram as bolsas-esmola de toda sorte, e como em tantas outras semicolônias do mundo – na Índia abundam os programas assistencialistas demagógicos promovidos pelas sucessivas gerências que se revezam na administração do capitalismo burocrático local.
Assim, o Estado indiano promove um programa assistencialista alimentar, que “garante” o fornecimento de grãos subsidiados para os mais pobres do país; um programa assistencialista de emprego, batizado como Sistema de Garantia Nacional de Emprego Rural, que prevê cem dias de emprego “garantido” para os pobres rurais; e um programa assistencialista de habitação rural que distribui trocados para as pessoas classificadas como “abaixo da linha de pobreza”, para que elas possam construir uma casa.
Mas, a exemplo de seus similares brasileiros, a eficácia desses programas – se é que poderia haver alguma – se perde na podridão do velho Estado, nos limites estreitos do seu alcance ante as necessidades reais e imediatas das massas pauperizadas, e com sua própria natureza, conservadora e eleitoreira, passam ao largo das questões de classe fundamentais e urgentes.
Enquanto isso, a gerência de turno da Índia está agora mesmo empenhada em uma ampla e nova rodada de instituição de facilidades para as operações de transnacionais e do grande capital financeiro internacional naquele país. Uma das medidas é a liberação para o capital estrangeiro comprar até 49% dos fundos de pensão domésticos, onde repousam US$ 48 bilhões em ativos sob gestão, cobrindo cerca de 12% da população indiana, segundo dados da Associação de Câmaras de Comércio e Indústria da Índia. Outra medida infame é a abertura do comércio varejista indiano, de onde muitos trabalhadores tiram seu sustento, à exploração dos grandes “WallMarts” internacionais.
Não obstante tantas dificuldades e uma gerência semicolonial especialmente amiga das potências, as massas trabalhadoras indianas não cessam os protestos em massa em todo o país e a Guerra Popular, que segue infligindo derrotas ao velho Estado. Só neste ano já foram duas greves-gerais, a última levada a cabo no dia 20 de outubro exatamente em repúdio às medidas pró-monopólios e antipovo da gerência de Nova Deli.