Índios de Santa Catarina travam lutas contra Funai e madeireiros

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Índios de Santa Catarina travam lutas contra Funai e madeireiros

As nações xokleng e guarani de Santa Catarina estão mobilizadas desde o começo do ano, realizando ações de Resistência contra as classes dominantes, representadas por empresas madeireiras, gerências municipais (prefeituras) e gerência federal (Funai).

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O fechamento da estrada de acesso à reserva indígena Duque de Caxias
foi para evitar o uso indevido das terras por agricultores da região

Tudo começou em meados de janeiro, quando xoklengs de sete aldeias dos municípios de José Boiteux, Vitor Meireles, Itaiópolis e Doutor Pedrinho, no planalto norte catarinense, fecharam uma estrada na zona rural de José Boiteux.

O fechamento daquele acesso à Reserva Indígena Duque de Caxias, que contou com a participação solidária de índios guaranis, visava evitar que agricultores continuassem passando por ali e usando terras indígenas para suas lavouras.

Dias depois (26 de janeiro) alguns agricultores reagiram e um deles foi baleado. A polícia acusou os índios pelo fato.

Esses pequenos lavradores vêm sendo manipulados por ricos madeireiros e gerentes municipais, na velha e odiosa tática da burguesia de jogar povo contra povo.

No dia 30 de janeiro, após duas semanas, a Resistência xokleng/guarani continuava firme. "Uma cancela improvisada de madeira impede o acesso de agricultores à área. Um índio com um facão na cintura é quem controla o movimento de entrada e saída", noticiava com visível irritação o monopólio da imprensa.

O procurador federal Derli Fiúza prometeu aos índios que a demarcação de suas terras começará em breve, pois o que estava emperrando o processo eram as várias liminares aprovadas por juízes contra a reivindicação indígena. Agora, porém, essas liminares foram finalmente caçadas, o que possibilita o andamento da legalização das terras, que somam 37 mil hectares.

Mas os xoklengs/guaranis não estão acreditando muito na agilidade do processo. E o cacique Enoque Caxias Popó, da aldeia Figueira, já avisou: "Enquanto não for decidido definitivamente sobre as demarcações, as mobilizações vão continuar".

Tomada de madeireira

O movimento indígena realizado em janeiro, além do fechamento da estrada, envolveu também uma marcha até Itaiópolis. E ainda a tomada da Madeireira Arthur Kirschner e o confisco de uma carga de troncos.

Na região de Itaiópolis há um bom número de empresas madeireiras, e várias delas abatem árvores nas terras que pertencem aos xoklengs. Alguns proprietários são ricaços muito conhecidos no estado, como a família de Jorge Bornhausen, um dos líderes nacionais do DEM, ex-governador e senador de muitos mandatos. Outra é a família Marcheti, de Ibirama, com vários políticos que já exerceram cargos na cidade.

Agora a burguesia está tentando retaliar a ação dos indígenas e no dia 17 de março obteve do juiz Adriano Vitalino dos Santos, da vara federal de Mafra (SC), uma sentença condenando os xoklengs a pagarem R$ 56,8 mil de indenização à Madeireira Arthur Kirschner.

Os índios não aceitaram tal absurdo e estão entrando com recurso contra a decisão do juiz.

Vitória no litoral

A participação dos guaranis nas lutas dos xoklengs, nos últimos anos, é um fato histórico, antropológico e político importante. Pois as culturas jê e guarani são adversárias há muitos séculos. Até pouco tempo atrás seria impensável ver guaranis e jês (xoklengs e caingangues) travando batalhas contra as classes dominantes, ombro a ombro.

Além de apoiar os movimentos no planalto norte, os guaranis também estiveram ativos no litoral catarinense neste início de ano.

No dia 15 de março, com suas costumeiras pinturas faciais de guerreiros, dezenas de guaranis, representando 20 aldeias litorâneas, ocuparam o Núcleo da Funai sediado no município de Palhoça, próximo a Florianópolis.

Suas principais exigências eram o afastamento imediato do chefe do Núcleo, José João de Oliveira e sua substituição no cargo por um índio guarani.

Há muito tempo as aldeias vinham denunciando à direção da Funai o autoritarismo, a incompetência e a insensibilidade de Oliveira. "Estamos cansados do descaso com que o Chefe de Núcleo trata nossas comunidades", disse uma nota da Comissão Catarinense Guarani Nhemonguetá, formada por anciãos e caciques, que foi divulgada no primeiro dia da ocupação.

Eu mesma, como repórter do AND, tive oportunidade de verificar a atitude desleixada desse funcionário, nas enchentes ocorridas em Santa Catarina em novembro passado. Algumas aldeias ficaram isoladas (devido à lama acumulada nas estradas), sem alimentos e com suas lavouras perdidas. Vários dias após a inundação, quando lhe telefonei para indagar sobre a ausência da Funai frente à situação de fome daqueles índios, Oliveira ainda não tinha providenciado o envio de cestas básicas a eles. Ao ver que falava com um jornal, rapidamente disse que os alimentos seriam mandados no dia seguinte.

No dia 19 de março os guaranis obtiveram a vitória e encerraram a ocupação do Núcleo da Funai. José João de Oliveira foi afastado e, em telefonema, o presidente da Funai, Márcio Meira, prometeu passar o cargo, no prazo de um mês, a um guarani indicado pela Comissão Nhemonguetá.

O nome escolhido foi o de Werá Tupã (Leonardo), da aldeia Morro dos Cavalos. Até o fechamento desta edição, o prazo ainda não tinha se esgotado. Algumas dúvidas persistem: se Werá realmente será empossado e, em caso positivo, se esse líder guarani não será boicotado pela Funai no exercício de suas funções. Houve casos semelhantes, em outros estados brasileiros, quando indígenas que assumiram postos de direção foram sabotados e logo acusados de ineficientes.

A próxima luta dos guaranis, com apoio dos xoklengs, é a criação de uma Administração Executiva Regional (AER) da Funai em Florianópolis, já que hoje o atendimento oficial dos indígenas de Santa Catarina é subordinado ao Paraná.

Um documento assinado pelo cacique geral dos xoklengs, Aniel Priprá, afirma: "Entendemos que uma administração na região de Florianópolis irá proporcionar um melhor atendimento nas ações da educação, saúde e atividades produtivas, bem como termos um maior apoio na demarcação de nossas terras, além de estar mais próximos das comunidades e das ações administrativas do governo do estado de SC, estado em que se localiza a grande maioria das comunidades atendidas pela administração (da Funai) sediada no Paraná".

Povos indígenas retomam suas terras

Mato Grosso do Sul
No dia 20 de março cerca de 100 índios da nação Terena tomaram as terras do latifúndio conhecido como Fazenda Charqueada do Agachy, em Miranda, município localizado a 212 km de Campo Grande – MS.

Os Terena representam a segunda maior nação indígena residente no território do Mato Grosso do Sul. Suas terras originárias compreendem a região correspondente aos municípios de Miranda e Aquidauana.

As famílias indígenas desocuparam a área após a promessa da Funai de que as terras serão desapropriadas pelo governo do estado e entregues aos Terena até maio deste ano. Os índios afirmaram que, caso o governo não cumpra sua palavra, irão ocupar a área definitivamente.

São Paulo
Mais da metade dos 5 mil índios do Estado de São Paulo não possuem terra e vivem precariamente confinados em 17 mil hectares de áreas ocupadas. O próprio governo do estado estima que para atendê-los, precisaria demarcar no mínimo 50 mil hectares.

Essa situação degradante arrojou as nações indígenas residentes no estado à luta pela retomada das terras ocupadas há séculos pelos seus antepassados. Em fevereiro último, índios da nação Guarani tomaram uma fazenda da Igreja Católica, em Itaporanga, no sudoeste paulista.

Em São Paulo existem 28 aldeias, apenas 12 são reconhecidas, ainda assim, não como as terras pertencentes a uma nação, a um povo, mas como uma área de reserva. As terras não são demarcadas e mesmo a precária constituição se converte em letra morta. Enquanto a constituição federal determina que cada índio tem o direito a 250 hectares, em São Paulo esse número é de 3,4 hectares. Casos absurdos são relatados de tempos em tempos como o da aldeia de Jaraguá, também no estado de São Paulo, onde cerca de 300 pessoas vivem em uma área de apenas 1,75 hectares.

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