Em um país semicolonial como o Brasil, a subjugação nacional pode compreender momentos de maior ou menor saqueio por parte do imperialismo. Na atual situação, o imperialismo exige, e os gerenciamentos de turno dão, tudo que tenha capital estatal ou nacional. O que se vê na indústria naval, por exemplo, é um setor em crise, que gerou demissões em massa nos últimos anos, e tenta resistir às políticas entreguistas que os gerentes do imperialismo impuseram nas últimas décadas.
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Sede da ANTAQ em Brasília
Se traçarmos uma cronologia da desnacionalização desse setor, teremos que retroceder um pouco mais, provavelmente até o início da década de 1990, quando o capitalismo entrou em mais uma fase de espoliação sobre os países periféricos. No Brasil, o gerenciamento de Collor preparou e iniciou, e FHC ampliou a entrega do patrimônio nacional. Na navegação, o caso do Lloyd brasileiro é sintomático das trapaças feitas para sucatear o patrimônio público e, em seguida liquidá-lo (A esse respeito ver artigo O Lloyd resiste, de Luciano Ponce, em AND nº2).
Da abertura da economia no breve governo Collor, passando pela criminosa quebra do monopólio da exploração de petróleo patrocinada pelo gerenciamento FHC/PSDB, “o mais imoral e vende pátria de todos os tempos”, como bem lembrou a capa da edição nº 5 da AND, até a mais recente crise que implodiu a falaciosa política macroeconômica dos governos petistas, a indústria naval passou a sofrer verdadeiros ataques dos monopólios transnacionais que contam com a conivência da quadrilha que comanda o velho Estado brasileiro.
Posse estrangeira
E o setor da cabotagem teria que entrar na dança também. Responsável pelo transporte de mercadorias entre portos nacionais, é considerado, em qualquer lugar do mundo, um setor estratégico, que sofre forte regulação, além de ser intermediado por políticas de subsídios governamentais e reservas de mercado. Mas no Brasil acontece justamente o contrário. A Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) não regula nem fiscaliza as empresas armadoras estrangeiras de navegação que atuam no país.
Devido à falta de incentivo governamental, o transporte de longo percurso (entre portos brasileiros e estrangeiros), que atende às empresas importadoras e exportadoras brasileiras está nas mãos de empresas internacionais, mesmo tendo nacionais habilitadas para fazer esse serviço. Essa concentração faz com o preço do serviço seja inflacionado e prejudique a economia do país. O frete Ásia-Brasil, por exemplo, é o mais caro do mundo.
Em artigo publicado no site Portos e Navios no final do ano passado, André Seixas, editor do site dos Usuários dos Portos do Rio de Janeiro (USUPORT-RJ), falou sobre essa ameaça estrangeira: “A falta de regulação do transporte de longo curso brasileiro é evidente. As empresas armadoras estrangeiras cobram aquilo que bem entendem dos nossos exportadores e importadores, seja através do frete, ou de “taxas extra-fretes” e demurrages. O resultado é caótico, pois os fretes de importação da China para o Brasil, por exemplo, dobraram de preço no último trimestre do ano passado, sem que se prestasse um esclarecimento à ANTAQ. Pagamos e despejamos no exterior todos os anos bilhões de dólares para essas empresas estrangeiras e não temos o menor controle sobre essa imensa quantia”.
O Brasil possui uma costa navegável de quase oito mil quilômetros de extensão, mais de 30 portos organizados e inúmeros terminais de uso privativo. Portanto, seria natural que o setor de cabotagem fosse bastante utilizado no país, mas atualmente ele não chega a 10% da matriz brasileira de transporte de carga. Isso demonstra que a prioridade do país continua sendo o transporte rodoviário. Entre os fatores que explicam a importância da cabotagem para o desenvolvimento econômico nacional, encontra-se a elevada capacidade de transporte, o menor risco de roubo de carga, os reduzidos números de acidentes, o custo operacional, o menor impacto ambiental e o descongestionamento das malhas viárias e rodoviárias. Tudo isso já seria suficiente para que o governo incentivasse a indústria naval, no entanto, as políticas governamentais dos últimos anos, principalmente após Resolução 01/2015 da ANTAQ, estão acelerando a degradação do setor.
Domingos Peixoto
Navegação de cabotagem e o setor naval estão entregues às corporações imperialistas
Essa resolução modificou as regras de contratação temporária de navios estrangeiros por empresas brasileiras, alterando as exigências para o transporte de contêineres e cargas em geral. No dia 28 de fevereiro, o Tribunal de Contas da União (TCU) suspendeu a resolução 01/2015 da ANTAQ, afirmando que ela restringia a competição no setor, prejudicando não apenas o setor portuário como as arrecadações da União. “Embora compreensível a argumentação da Antaq de que a limitação visa proteger a indústria nacional, disso não se cuida. Cuida-se, sim, de restrição à competitividade e à livre iniciativa, o que favorece claramente às empresas de grande porte e contribui para acentuar a concentração de mercado no setor”, afirmou o Ministro relator Bruno Dantas.
Independentemente da resolução da ANTAQ, se faz urgente uma política nacional para proteger um setor tão importante e estratégico para a nossa economia como a cabotagem. Não custa lembrar que o transporte marítimo é a modalidade mais antiga de transporte existente no mundo, e que foi de suma importância, desde a antiguidade, para o transporte de pessoas e o desenvolvimento do comércio. O que devemos cobrar é que toda e qualquer mudança atenda aos anseios e necessidades dos trabalhadores brasileiros. No caso específico da cabotagem, atenda os anseios não apenas do ponto de vista dos navios, mas também dos trabalhadores dos portos, pois são eles os que mais sofrem. E as recentes paralisações dos estivadores do Porto de Santos no mês de março são um exemplo disso.