Faltam apenas três anos para a Copa do Mundo no Brasil, mas para o povo pobre que vive em várias favelas do Rio de Janeiro ela já começou. Isso porque o prefeito Eduardo Paes corre contra o tempo para adequar a estrutura da cidade às exigências do imperialismo para a realização dos mega-eventos esportivos que acontecerão na cidade. Na zona Norte da cidade, o Largo do Campinho está no caminho do corredor expresso de ônibus (BRT) Transcarioca, que irá cortar a cidade, e os moradores dessa favela são as mais novas vítimas da política fascista da prefeitura do Rio de expulsão de pobres de diferentes partes da capital para as mais remotas regiões.
O corredor expresso de ônibus (BRT) Transcarioca ligará o Aeroporto Internacional Tom Jobim à Barra da Tijuca, zona Oeste do Rio de Janeiro. Avaliada em 1,3 bilhão de reais, a obra prevê a remoção da favela Largo do Campinho, uma favela antiga, com casas tombadas pelo patrimônio histórico cultural.
Mas os moradores não estão nada satisfeitos com a ideia da prefeitura de expulsá-los do local, já que a única opção dada pelos gerenciamentos de turno foi uma casa no bairro de Cosmos, um depósito de pobres há 80 quilômetros do Centro da cidade. Todos serão incluídos no programa Minha Casa, Minha Vida, do gerenciamento Dilma-Luiz Inácio, mas alguns já chamam o programa de “Minha Casa, Minha Dívida”, já que todos que perderam suas casas e foram para Cosmos terão que pagar 120 parcelas de 50 reais para terem a escritura dos imóveis.
A moradora Luciana França, de 24 anos, é manicure e mora com o pai, que vive há 32 anos no local e tem uma loja que faz placas, cartazes e banners anexa a sua moradia. Ela se nega a ir para Cosmos e se queixa da indiferença da prefeitura com as particularidade dos moradores.
— Na lei orgânica do município, a 429, fala que toda família removida tem que ser reassentada próxima. Isso não está sendo cumprido, porque a nossa comunidade vai ser reassentada em Cosmos, que fica a 18 estações [de trem]de onde a gente mora. É mais de uma hora de viagem. Pessoas já perderam o emprego, crianças perdendo o ano letivo, pessoas de idade que vão perder tratamento no posto médico, e outras que estão desempregadas não vão poder pagar as contas que têm nesse apartamento. A gente não tem acesso ao contrato, não pode levar o advogado nem a defensoria pública. Eu não vou sair, só saio daqui quando eu for prévia e justamente indenizada ou reassentada próxima — afirma a trabalhadora.
— Eu cheguei num imóvel que foi abandonado pelo dono e não foi requerido em nenhum momento pela prefeitura, só agora. Eu sou obrigada a votar, mas não tenho o direito de escolher aonde viver? Se esse apartamento da Caixa vai ser financiado, eu tenho o direito de escolher aonde é que eu vou viver? Sou eu que vou pagar. Está errado, tinha que me dar de graça, porque esse aqui eu não pago nada e a lei diz que é meu — protesta.
Além disso, a demolição de cerca de 20 sobrados do Largo do Campinho, tombados pelo patrimônio histórico cultural, preocupa pesquisadores de grupos de preservação da memória daquela região, como o cartógrafo Jorge Furman, do Grupo de Pesquisa do Subúrbio Carioca.
— A gente lutou pela preservação do conjunto arquitetônico. A história de uma cidade também se faz com a preservação de elementos das memórias dos bairros. Construções antigas são uma raridade nos subúrbios e deveriam tentar ser preservadas. Se isso acontece na zona Sul, haveria comoção — lamenta.
De acordo com Marília Farias, defensora do Núcleo Terras e Habitação, o município ajuizou essas ações de desapropriação contra os antigos proprietários. Só que muitos deles desapareceram há décadas e deram lugar aos novos moradores. Ela também observou que faltam diálogo e transparência nesse processo de reassentamento, pois as pessoas não têm acesso aos contratos, que só podem ser lidos após o morador aceitar a proposta de ir para Cosmos.
— Os antigos proprietários abandonaram os imóveis, que foram aos poucos sendo ocupados por essas famílias que têm a posse há mais de 30 anos. A gente entende que esses possuidores fazem jus à indenização tal qual o proprietário do registro faria. A postura do município é simplesmente varrer as pessoas das comunidades e mandar para o mais longe possível — explica Marília.
— Estamos tentando, em termos jurídicos, incluir essas famílias no pólo passivo dessas ações de desapropriação, porque elas são dirigidas apenas aos proprietários antigos. Estamos tentando fazer essa inclusão justamente para batalhar por essas indenizações ou o reassentamento em local próximo, que é o que nos parece mais justo — afirma.
— O morador está deixando um imóvel que ele conseguiu construir na vida inteira, levando até 10 anos para conseguir levantar esses tetos, e não vai ter condição de pagar as parcelas dos apartamentos em Cosmos. Aqui na comunidade do Largo do Campinho muitas famílias são miseráveis, estão realmente abaixo da linha da pobreza, e não vão ter condições de arcar com esse ônus de morar longe, sem emprego, e com esse custo mensal. O que a prefeitura tem praticado é um sem número de arbitrariedades, tudo em prol dos mega-eventos esportivos de 2014 e 1016 — conclui a defensora.
No dia 2 de fevereiro — dois dias após o início do processo de remoção do Largo do Campinho — cerca de 50 moradores fizeram um protesto em frente à favela para denunciar mais essa ofensiva do fascista prefeito Eduardo Paes contra os bairros pobres da cidade. Contudo, os moradores da região prometem não se intimidar com as ameaças da prefeitura e lutar até o fim por suas moradias.