Luta pela terra

Luta pela terra

Cerco militar e ameaça de despejo em Santa Elina

Tropas do exército e da Força Nacional estão estacionadas na cidade de Cerejeiras, em Rondônia. Outras unidades da aeronáutica, que contam com helicópteros e aviões, estão em Vilhena. Desde meados de novembro há movimentações na região e são noticiadas operações na região sul do estado e movimentações dessas tropas na região fronteiriça.

O Comitê de Defesa das Vítimas de Santa Elina – Codevise denuncia que um dos objetivos da ostensiva presença militar na região seria realizar a retirada das mais de 260 famílias que retomaram as terras da Fazenda Santa Elina, palco da heróica resistência de Corumbiara em 1995. Há mais de um ano as famílias camponesas realizaram o corte popular das terras retomadas e estabeleceram a área revolucionária Zé Bentão.

Os camponeses denunciam que as forças de repressão do velho Estado “estão preparando uma onda de prisões e perseguições aos camponeses de Santa Elina. Um delegado que esteve na área disse que fariam como no sul do Pará, em alusão a chamada operação “Paz no Campo” levada a cabo pela então governadora Ana Júlia Carepa (PT) no despejo de 1.100 famílias da fazenda Forkilha em novembro de 2007. Nesta ocasião, cerca de 200 camponeses foram presos e torturados pela PM e doze ativistas que participaram da mobilização para a tomada da área foram assassinados posteriormente por pistoleiros a serviço do latifúndio”.

Na edição nº 84 de AND noticiamos que um camponês da região telefonou para a redação do jornal e relatou que, numa reunião realizada em 1º de dezembro em Vilhena – RO, o Ouvidor Agrário Nacional – o desembargador Gercino José da Silva – teria dito em tom de ameaça que haveria “sérias consequências caso os camponeses não obedeçam” a ordem de se retirarem das terras.

Atos em defesa dos camponeses de Santa Elina

Nos dias 7 e 9 de dezembro, nos campi de Porto Velho e Rolim de Moura da Universidade  Federal de Rondônia – Unir, dezenas de professores, estudantes, trabalhadores e apoiadores da luta camponesa participaram de atos políticos em defesa da posse das terras da Fazenda Santa Elina pelos camponeses que nelas vivem e produzem.

Essas atividades foram convocadas por docentes e estudantes da Unir, pelo Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos – Cebraspo e pela Associação Brasileira de Advogados do Povo – Abrabo.

O Dr. Nilo Batista, destacado criminologista carioca e defensor dos direitos do povo, enviou notas de apoio aos camponeses e de repúdio à tentativa de despejo das famílias da área Zé Bentão.

Em 9 de dezembro, novos atos em defesa dos camponeses de Santa Elina foram realizados no campus de Rolim de Moura. No auditório repleto, dezenas de pessoas prestaram sua solidariedade e declararam apoio à luta dos camponeses pelo direito à terra.


Dados da luta no campo em 2011

Tudo isso enfrentam os camponeses do Brasil


Camponeses da área revolucionária Zé Bentão retomaram e cortaram as terras da antiga Fazenda Santa Elina

Segundo dados parciais divulgados pela Comissão Pastoral da Terra – CPT que cobrem os meses de janeiro a setembro de 2011, 23 pessoas foram assassinadas em conflitos agrários. Desse total, 22 são camponeses de cinco estados diferentes e um indígena do Mato Grosso do Sul.

Apesar do esforço da CPT em registrar e denunciar os crimes e assassinatos cometidos pelo latifúndio e seus bandos de pistoleiros contra os camponeses em luta pela terra, esses números ainda (e infelizmente) são bastante incompletos. O primeiro ano do gerenciamento Rousseff, aprofundando a política de criminalização e brutal repressão do movimento camponês, particularmente do movimento camponês combativo, foi marcado por perseguições, torturas e assassinatos no campo.

AND repercutiu ao longo de todo o ano passado várias denúncias de assassinatos de camponeses por bandos de pistoleiros, algumas delas não registradas pela CPT:

Em 2 de junho, o camponês Marcos Gomes da Silva foi assassinado em Eldorado dos Carajás, Pará. Ele havia sido baleado e era levado para um hospital quando o carro onde estava foi interceptado e ele foi executado. O camponês também foi degolado e teve uma orelha cortada.

Em 24 de julho, o camponês Francisco Soares de Oliveira foi assassinado dentro do Assentamento Alto Bonito, no município de Dom Eliseu, no sudeste do Pará.

Período ainda não apurado pela CPT:

Em 22 de outubro, o camponês João Chupel Primo foi assassinado em Itaituba, Pará. Ele era uma liderança da Miritituba e vinha denunciando a exploração ilegal de madeira na região. João Chupel já havia recebido uma série de ameaças de morte e as havia denunciado para a polícia local.

Em 25 de novembro, José Gomes de Lima, liderança do MST e presidente da Cooperativa Rural do Assentamento Venâncio Tomé de Araújo, foi assassinado em uma emboscada em Campina Grande, Paraíba, em 25 de novembro. Ele foi assassinado com seis disparos de revólver calibre 38 que o atingiram nas costas e na cabeça. Seus familiares denunciaram que há vários dias ele vinha sendo ameaçado de morte por pessoas desconhecidas na região que questionavam a posse da terra onde ele e mais 20 famílias residem há cerca de 11 anos.

A esmagadora maioria desses assassinatos continua sem apuração e os executores e mandantes permanecem impunes. Somando as denúncias registradas pela CPT às publicadas por A Nova Democracia, são 26 assassinatos de ativistas e lideranças camponesas (até 25 de novembro) e mesmo esse número está aquém da matança que se processa no campo em nosso país, pois temos a grande limitação de lidar com dados veiculados nos órgãos de imprensa. Inúmeros assassinatos de camponeses sequer são registrados ou divulgados.

Acirramento das contradições no campo

Ainda de acordo com o relatório parcial da CPT, tomando como base o ano de 2010, em 2011 houve um crescimento de 107% do número de pessoas ameaçadas de morte. 172 ativistas e lideranças camponesas denunciaram ter recebido sucessivas ameaças.

Ainda não há um número definitivo, mas pelo menos 8 dos 22 casos de camponeses assassinados já haviam denunciado, seja à polícia, seja ao Incra ou a alguma organização dos chamados direitos humanos, que teriam sido ameaçados de morte.

O número de pessoas em acampamentos ou assentamentos atacados por bandos de pistoleiros também teve um crescimento significativo entre 2010 e 2011, subindo de 38.555 para 45.595 pessoas.

Também houve elevação do número de denúncias de trabalho escravo. Em 2010 foram registradas 177 denúncias envolvendo 3.854 pessoas, enquanto em 2011 (até setembro) foram 218, denúncias envolvendo 3.882 pessoas.

Apesar do silêncio do monopólio

AND repercutiu a grave denúncia de resistenciacamponesa.com que noticiou a prisão e tortura do camponês Luiz Antunes por policiais civis e militares do município de Buritis, no Projeto de Assentamento Rio Alto.

Luiz retornava da cidade quando foi fechado por três caminhonetes sem identificação próximo ao seu lote. Cerca de 15 policiais armados saíram dos veículos e, sem nenhuma explicação ou perguntas, o derrubaram e o torturaram durante duas horas para que ele assumisse a culpa por delitos ocorridos na região do PA Rio Alto.

Na sequência, os policiais levaram Luiz ao hospital municipal para que seus graves ferimentos fossem amainados e não denunciassem a tortura, e fizeram circular na internet a notícia de que o camponês “havia corrido de moto ao avistar os veículos e que seus ferimentos eram causados por uma queda que havia sofrido durante a fuga”. O camponês ainda ficou preso por dois dias na delegacia de Buritis antes de ser liberado.

Ação de bandos de pistoleiros

Denunciamos também a ação covarde de bandos de pistoleiros contra famílias camponesas da área Barro Branco, em Chupinguaia (RO), em Porto Calvo (AL), em Altinho e Agrestina (PE), e no assentamento Flor do Amazonas, em Candeias do Jamari (RO). Noticiamos o desbaratamento e prisão de bandos armados que agiam a soldo do latifúndio em Caruaru, Lagoa dos Gatos, Jaqueira e outras cidades da Zona da Mata pernambucana, em São Félix do Xingu (PA) e em Chupinguaia (RO).

Conquistas da luta combativa

Levamos ao conhecimento dos leitores de AND em todo o país as vitórias do movimento camponês combativo. Centenas de famílias organizadas pela Liga dos Camponeses Pobres – LCP tomaram a terra e realizaram o corte popular, iniciaram a produção e, em vibrantes assembleias populares, celebraram a entrega dos lotes e a posse da terra por quem nela vive e trabalha. Assim foi no Engenho Pau D’olho, no município de Catende, Zona da Mata Sul Pernambucana, através da luta conjunta da LCP e da Associação de Moradores e Trabalhadores do Engenho Pau D’olho que, unidos na luta, decidiram pela tomada das terras do antigo engenho, pelo corte e a moagem da cana por conta própria, e pelo o corte popular das terras.

Também noticiamos a grande festa do corte popular na área revolucionária Zé Bentão, área conquistada da antiga Fazenda Santa Elina, em Corumbiara, Rondônia. Narramos a emocionante cerimônia de entrega do certificado de posse da terra pelo Comitê de Defesa das Vítimas de Santa Elina (Codevise) às famílias durante a Assembleia Popular da área.

Um documento redigido pela organização da Festa do Corte Popular, lido durante a Assembleia, resumiu o significado daquele momento:

“Há 15 anos o sangue derramado pelos camponeses neste chão regou a semente da luta em nossos corações e mentes, esta semente cresceu, floresceu e deu frutos e hoje suas raízes são tão profundas que o latifúndio já não pode destruir. Pelo contrário, somos nós que podemos e devemos destruí-lo. Nunca devemos esquecer os combatentes que morreram assassinados pelas balas do latifúndio e pelas mãos malditas de seus carrascos. Estes companheiros carregavam consigo o sonho de ter um pedaço de terra para viverem e trabalharem com suas famílias e pagaram com suas vidas ao acreditar e lutar por este sonho”.

Luta dos povos indígenas

Em 2011 AND noticiou a resistência indígena, particularmente da nação Guarani-kaiwá, no Mato Grosso do Sul. Lideranças, homens, mulheres e crianças foram perseguidos e assassinados e a população duramente reprimida e perseguida por latifundiários e seus bandos de pistoleiros.

Números divulgados pelo Conselho Indigenista Missionário – Cimi, em 31 de novembro de 2011, dão conta de que, nos últimos oito anos pelo menos 250 indígenas foram assassinados no Mato Grosso do Sul. A maioria absoluta desses assassinatos foi em decorrência de conflitos pela posse da terra.

“São mais de 1200 famílias vivendo em condições subumanas à beira de rodovias ou sitiados em fazendas”, denuncia o Conselho Indigenista.

De acordo com o relatório do Cimi, o Mato Grosso do Sul concentrou 55,5% dos casos de assassinatos de indígenas no Brasil. No ano de 2008 foram 70%; em 2010, 57%, e nos primeiros nove meses de 2011, 27 indígenas foram assassinados no MS, sendo que o total do Brasil foi de 38 crimes, cifra que localiza no estado 71% das mortes.

Segundo dados do Cimi, de 2003 a 2010, 452 indígenas foram assassinados em todo o país, sendo 250 no Mato Grosso do Sul e 202 no restante do país.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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