Um contingente de aproximadamente mil camponeses, organizados em colunas, irrompeu pelas ruas de Montes Claros, dia 23 de maio, paralisando toda a área central da oitava cidade de Minas Gerais. Segundo a Coordenação da Liga dos Camponeses Pobres do Norte de Minas, os manifestantes vieram em cerca de 20 ônibus, partindo de mais de 15 áreas rurais diferentes.
Agitando grandes bandeiras vermelhas, os camponeses conclamavam a população (superior a 300 mil habitantes na cidade) às ruas e com desembaraço proferiam palavras de ordens, outras vezes pequenos discursos sobre o que parecia ser o seu programa agrário e aspirações políticas de governar o país.
As pessoas saiam de dentro das lojas, repartições e residências, ocupavam as calçadas congratulando-se com os manifestantes, reconhecendo entre eles muitos amigos. Quando as últimas colunas transpunham os trechos das ruas que as coordenações do movimento haviam indicado para percorrer, os que se concentravam nas calçadas, passavam a ler e a discutir alegremente os panfletos distribuídos, avaliando os pequenos discursos proferidos pelos manifestantes ou as seguidas notícias sobre o que os camponeses realizavam em outros pontos da cidade.
Os camponeses seguiam denunciando a "farsa eleitoral" e apontando a necessidade de "uma revolução agrária". Ao mesmo tempo, exigiam do governo uma série de medidas que, para eles, ao menos servisse para amenizar a grave situação em que se encontram os "trabalhadores pobres e médios", do campo e da cidade, assim como as classes que compõem o povo brasileiro de uma maneira geral.
Naqueles momentos, também alguns olhares cheios de pavor e de ódio foram identificados em meio à alegria do povo. A minoria de representantes dos latifundiários e seus empregados de confiança que transitavam por ali, outros lotados nas repartições públicas ou enfurnados num e noutro escritório, deixavam transparecer uma enorme preocupação e, temerosa pela presença dos camponeses na cidade, chegaram a ponto de mandar cercar o prédio da Prefeitura com o batalhão de choque da Polícia Militar. Tanto pior, porque a decisão manifestada pelos camponeses de levar às últimas conseqüências a sua causa ficou patente quando, por exemplo, os irrigantes do Projeto Jaíba chegaram à sede do projeto e atearam fogo em uma centena de contas de água e luz que, diziam, foram distribuídas para extorquir ainda mais dinheiro do povo.
Enquanto o fogo queimava as faturas registrando valores exorbitantes, que as administrações teimavam arrecadar dos camponeses, os altos funcionários do projeto, aterrorizados, se trancavam em seus gabinetes e imploraram reforços ao Batalhão de Choque. Todavia, ante a iminência dos camponeses ocuparem todas as entradas dessas repartições, os chefetes tiveram de sair de seus refúgios para atender os manifestantes.
Os camponeses também cercaram as agências do Instituto Estadual de Florestas, do Banco do Nordeste e da Cia. de Eletricidade de Minas — Cemig, exigindo que os altos funcionários ali recebessem uma extensa lista de direitos que aquelas administrações teimavam em não reconhecer.
Um ato de apoio aos camponeses dos acampamentos São Francisco e Bandeira Vermelha, em Itacarambi e Montes Claros, todos situados no pólo regional conhecido como uma das áreas mais pobres do Estado, onde mais de 300 famílias resistem às ameaças de despejo, encerrou a manifestação às 15 horas. Enquanto isso, a população da cidade se despedia admirada e orgulhosa de seus camponeses.