Maquiagem no Sambódromo expulsa famílias

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Maquiagem no Sambódromo expulsa famílias

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Na manhã do dia 25 de abril, funcionários da prefeitura do Rio de Janeiro foram até a favela do Sambódromo, ao lado da Marquês de Sapucaí, para remover os moradores. O destino das famílias que aceitaram sair foi o condomínio Oiti, em Senador Vasconcelos, a dezenas de quilômetros do local. Descontentes, muitas famílias resistiram à remoção. A maioria dos moradores reclama das péssimas condições de habitação dos apartamentos do projeto Minha Casa Minha Vida no Oiti, oferecidos pelos gerenciamentos de turno como única forma de indenização. A remoção da favela do Sambódromo faz parte do projeto da prefeitura de “revitalização e ampliação” da Marquês de Sapucaí até o carnaval de 2012.

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Moradores há décadas ao lado do Sambódromo são ameaçados de remoção

Dias antes da remoção de uma parte das famílias que vivem na favela do Sambódromo, a reportagem de AND esteve no local para ouvir os moradores que resistem. O objetivo das famílias seria permanecer no local, ou lutar por uma alternativa habitacional que não altere as suas rotinas, já que os condomínios oferecidos pelos gerenciamentos de turno em Senador Vasconcelos, além de estarem a 60 quilômetros do Sambódromo, não possuem escolas, hospitais ou bancos nas proximidades.

Em 1996, nós já estávamos aqui há muito tempo, já tínhamos a posse desse terreno. A dona do terreno tentou esbulhar a nossa posse e, através da defensoria pública, nós entramos com um pedido de manutenção de posse. Como a indenização que ela teria que nos pagar era muito alta, ela preferiu deixar o terreno conosco.

Então, esse terreno é nosso de direito. Por que eles querem indenizar com milhões os donos de mansões que estão no local de outras obras públicas e aqui querem nos remover pra um lugar que ninguém aqui nem sabe chegar? — pergunta o morador e advogado Roberto Ferrari, de 53 anos.

Me admira muito o secretário de habitação, Jorge Bittar, que pertence ao PT, que já cansou de subir em palanque para fazer discurso em defesa dos pobres, dos oprimidos, dos sacrificados, agora fazer um negócio destes. Vir aqui, de uma forma ditatorial, imperativo, dizendo que a gente vai ter que sair e vai ter que ir para Senador Vasconcelos e pronto. Ele está agindo como os militares agiam na época da ditadura. Agora é uma ditadura velada — conclui Roberto.

Moradores da favela do Sambódromo revelaram ao AND os desmandos da prefeitura e a sua indiferença à vontade dos moradores de ficar no local. Muitos deles vivem há décadas na região e dizem que só aceitariam se mudar se fosse para um local próximo. Contudo, a prefeitura se nega a negociar com os moradores e, descaradamente, descumpre a lei orgânica do município que, em seu artigo 429, prevê o “assentamento dos moradores em localidades próximas dos locais da moradia ou do trabalho, se necessário o remanejamento”.

—  Eles estão cometendo um crime. Querem maquiar a cidade para os estrangeiros verem e o povo pobre daqui eles tratam como lixo. Não existe nenhum projeto para o povo morar no Centro. O povo pobre, para a prefeitura, tem que morar longe. Não pode morar no Centro — reclama a moradora Leandra da Rocha, de 28 anos.

O meu sentimento é de revolta. Minha vida é aqui, meu trabalho é aqui. Eu sou manicure e as minhas clientes moram aqui. Já me conhecem há anos. Se eu for para Senador Vasconcelos, minha renda eu não terei mais. Meu marido pega no trabalho, aqui ao lado, às 4 da manhã. Imagine se a gente for para lá, duas horas de viagem daqui, que horas ele terá que acordar? Minha filha vai ter que sair da escola e, até agora, eles não nos deram nenhuma posição sobre onde nossos filhos vão estudar. Até onde eu sei, as famílias que aceitarem ir, os filhos vão perder o ano. Se me tirarem daqui, vai ser à força. Para eles, o carnaval é mais importante do que as nossas vidas — disse Patricia Damiana, de 35 anos.

A gente está sendo forçado a sair. Desde que eu coloquei os pés no condomínio de Senador Vasconcelos, não me senti bem. Não quero sair daqui e recomeçar a vida por lá. Eu sou nascida e criada neste lugar. Não existem oportunidades de trabalho naquela região. É um deserto. Médico, não tem. Aqui, nós temos o hospital Souza Aguiar para qualquer emergência. Aí, eles disseram que lá terá UPA [Unidade de Pronto Atendimento]. Mas todo mundo sabe que essas UPAs não prestam. Escola, também não tem em Senador Vasconcelos. O que nós vamos fazer lá? — pergunta a moradora Cristiane da Silva, de 25 anos.

No dia da tentativa de remoção da prefeitura, algumas famílias aceitaram sair, mas ao menos 15 resistiram e se disseram dispostas a lutar para permanecer no local.

Eles já chegaram pegando tudo, colocando dentro do caminhão de mudança e levando. Acordaram as pessoas que estavam dormindo, dizendo “acorda, acorda, que chegou o carro da mudança”. Não trouxeram ordem judicial, nada. Nem se identificaram. Pegaram as coisas dos meus vizinhos, como se fosse lixo e saíram jogando no caminhão — relata a moradora Jane da Silva.

Mesmo com as intimidações dos agentes da prefeitura, os moradores se mantiveram firmes e já preparam reuniões e participam ativamente dos encontros do Conselho Popular para se juntarem às dezenas de comunidades que compõem a resistência à política de remoções do terceto fascista Paes, Cabral e Dilma.


Vídeos de AND são exibidos em manifestação contra as remoções

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No dia 19 de abril, representantes de várias favelas ameaçadas de remoção pela prefeitura se reuniram nas escadarias da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, no Centro da cidade, para protestar. Ouvidores da Anistia Internacional também estiveram presentes na manifestação, assim como integrantes de várias organizações e entidades que apoiam a luta dos moradores de favelas e bairros pobres ameaçados de remoção.

Durante o protesto, além de faixas e cartazes, um projetor de filmes foi instalado ao lado da entrada da Alerj para atrair a atenção dos milhares de trabalhadores que passam pelo local todos os dias. Vários filmes produzidos por A Nova Democracia foram exibidos no local. Foi grande o número de pessoas que se interessaram e pararam para assistir as mais recentes produções de AND sobre a política de remoção de favelas dos gerenciamentos de turno. Ao fim das apresentações, muitos aplaudiram os vídeos e procuraram nossa equipe para conhecer o jornal e apoiá-lo.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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