Uma Medida Provisória editada no dia 28 de dezembro, fruto de um acordo entre o Ministério do Trabalho e a Confederação dos Trabalhadores da Agricultura — Contag — determinou o fim da obrigatoriedade do registro em carteira dos trabalhadores temporários no campo. O chamado contrato de trabalhador rural por pequeno prazo vem sendo severamente criticado por juristas e personalidades democráticas que consideram a medida um ataque frontal a conquistas históricas dos trabalhadores e mais um suporte legal para a existência da exploração de trabalho escravo pelo latifúndio.
De acordo com a "nova" lei, os trabalhadores contratados para colheitas de curto prazo, como o corte da cana-de-açúcar, não terão mais garantia de carteira assinada. É o que deixa claro o artigo 3º da Medida Provisória:
§ 3o O contrato de trabalhador rural por pequeno prazo não necessita ser anotado na Carteira de Trabalho e Previdência Social ou em Livro ou Ficha de Registro de Empregados, mas, se não houver outro registro documental, é obrigatória a existência de contrato escrito com o fim específico de comprovação para a fiscalização trabalhista da situação do trabalhador.
Associações de Juristas e membros da Ordem dos Advogados do Brasil, bem como entidades de defesa dos direitos humanos, criticaram a Medida Provisória nº 410 e denunciaram as mais de 20 mortes (registradas) de cortadores de cana no interior de São Paulo. A maioria dos cortadores de cana-de-açúcar, mesmo antes da publicação da MP já eram mantidos por contratos temporários e ganhavam somente por produção. O que obrigava um trabalhador a cortar até 12 toneladas de cana por dia, demandando milhares de golpes de facão, o que tem provocado dezenas de mortes e graves doenças por esforço excessivo.
Declarações recentes do juiz do trabalho e integrante da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho — Anamatra—, Zéu Palmeira, apontam que "a medida que deveria servir para aperfeiçoar os mecanismos de combate ao trabalho em condições degradantes, termina por incentivar a sonegação de direitos". Com o amparo da nova lei, os latifundiários e grandes empresas que exploram milhares de trabalhadores no campo, no momento da fiscalização, podem providenciar contratos feitos de próprio punho com valor (legal) de contrato de trabalhador rural por pequeno prazo.
A Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho — ANPT —, entidade que congrega os Membros do Ministério Público do Trabalho de todo país, repudiou a publicação da Medida Provisória. A MP acrescenta um artigo à Lei n. 5.889, de 8 de junho de 1973, alterando as regras para a aposentadoria do trabalhador rural, ficando este, de acordo com a nova lei, enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual, tendo que comprovar a prestação de serviço de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego.
Ophir Cavalcanti, membro do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), também manifestou-se contrário à Medida provisória. Em declaração publicada no site da Ordem, ele se contrapôs veementemente a esta lei que "agride conquistas históricas do trabalhador e fere o direito dos empregados de ter a carteira de trabalho como o espelho de sua vida profissional, até mesmo para efeito de contagem do tempo de serviço para aposentadoria", e ainda criticou "o fato de tais alterações terem sido acolhidas e assinadas por um presidente da República oriundo da classe trabalhadora que em sua história de sindicalista sempre combateu a informalidade e a precarização do emprego, tudo que os governos tidos como neoliberais pretendiam e não tiveram a coragem de introduzir a esse ponto".
Diante das severas críticas à Medida Provisória nº 410, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura — Contag—, entidade filiada à CUT, publicou na sua página na internet em 10 de janeiro último a defesa da MP. Manoel dos Santos, presidente da Contag, ao contrário dos defensores dos direitos dos trabalhadores, afirmou em nota que "o fim da exigência para a assinatura da carteira de trabalho de quem participa de colheitas de curto prazo (…) vai facilitar o acesso dos trabalhadores e trabalhadoras rurais aos benefícios da Previdência Social, além de ser uma arma contra o trabalho escravo."
Nada além do que se poderia esperar de uma entidade filiada à CUT, perante um decreto assinado por Luiz Inácio, Arno Hugo Filho, Carlos Lupi e Luiz Marinho.