No último dia 20 de março, Caio Silva e Fábio Raposo, ativistas acusados pela morte do cinegrafista Santiago Andrade, tiveram a liberdade concedida parcialmente. Assim como os outros 21 ativistas presos e perseguidos um dia antes da final da Copa da Fifa, a liberdade veio com medidas restritivas, que são a cassação dos direitos políticos. No caso deles, na prática, têm-se duas prisões domiciliares.
Para os ativistas presos e perseguidos na ocasião da final da Copa, as medidas restritivas resumem-se à proibição de ausentar-se da comarca, comparecer uma vez ao mês ao Tribunal de Justiça para justificar suas atividades e o impedimento de participar de atos públicos e manifestações. As medidas restritivas impostas a Caio Silva e Fábio Raposo vão além das impostas contra os outros ativistas presos e perseguidos políticos: comparecimento periódico ao juízo; proibição de acesso ou frequência a reuniões, manifestações, grupos constituídos ou não, bem como locais de aglomeração de pessoas de cunho político ou ideológico; proibição de manter contato com qualquer integrante do denominado “Black bloc”; proibição de ausentar-se da comarca da capital; recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga, principalmente nos fins de semana; e monitoramento eletrônico.
O que estas medidas cautelares demonstram é o aumento cada vez maior do cerceamento dos direitos de manifestação e organização que estamos vivendo. Algumas semanas atrás, a gerente de turno Dilma Rousseff disse em rede nacional que “Nunca mais no Brasil nós vamos ver pessoas, que ao manifestarem sua opinião, seja contra quem quer que seja, inclusive, a presidência da república, possam sofrer quaisquer consequências. Nunca mais isso vai acontecer”. Porém, o que essas medidas restritivas mostram é exatamente o contrário. Jovens estão proibidos de se manifestar, de participar de reuniões de cunho ideológico, de manter contato uns com os outros.
O caso mais emblemático de como essas medidas são, na verdade, a cassação dos direitos políticos são os casos dos jovens Igor Mendes, Elisa Quadros e Karlayne Moraes, que tiveram novamente um pedido de prisão expedido com a justificativa de que tinham desrespeitado uma das medidas cautelares, a que proíbe a participação em manifestação. Elisa e Karlayne estão foragidas e Igor está preso há mais de cem dias no Complexo Penitenciário de Bangu. Os jovens foram no dia 15 de outubro de 2014 a um evento cultural realizado na praça da Cinelândia em comemoração do dia do professor e em lembrança da manifestação que ocorreu um ano antes daquela data, onde mais de 200 pessoas foram presas.
Por mais que o gerenciamento oportunista do PT tente esconder, as próprias restrições impostas pelo judiciário demonstram o caráter político das perseguições e prisões de militantes no Brasil, em especial no Rio de janeiro. Se um homicida, ao estar em liberdade, não pode cometer homicídios novamente, elas deixaram bem claro que os ativistas não podem ir a manifestações e reuniões. Ou seja, não podem exercer seus direitos políticos mais básicos.
É fundamental ressaltar que está cada vez mais na ordem do dia a tarefa de levantar a bandeira de que lutar não é crime e defender o direito de livre manifestação e organização. E isto ocorre em um momento no qual quem está gerenciando o velho Estado, na primeira oportunidade, chora lágrimas de crocodilo ao falar dos mortos e torturados do regime militar. Isto só demonstra o quão falido está esse Estado e suas velhas instituições, e seja quem for que o gerencie continuará perpetrando a histórica e brutal repressão contra o povo e os movimentos populares que lutam de forma independente e combativa.
É dever de todas as entidades e organizações democráticas, progressistas, combativas e independentes, de intelectuais honestos, não deixarem que medidas restritivas como estas sejam aplicadas sem resistência e denúncia. Ativistas não podem ter a liberdade concedida com uma espada em suas cabeças. E aqueles que se calam diante de tal arbitrariedade, na verdade, colaboram e abrem caminho para que cada vez mais direitos minimamente democráticos de nosso povo sejam cassados.
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*Emerson Fonseca é estudante de História da UERJ e um dos presos políticos na véspera da Copa da Fifa em julho de 2014.