Sarkozy e Cameron “saudam” a “Nova Líbia”
Nem bem as tropas da Otan, secundadas pelos “rebeldes” do Conselho Nacional de Transição (CNT) da Líbia, derrubaram o governo de Khadafi em Trípoli, as potências imperialistas envolvidas no conflito começaram a arregaçar as mangas para dividir o butim.
Os bombardeios da Otan ainda eram lançados contra Sirte e Bani Walid, onde ainda há tropas fieis a Khadafi (especula-se que lideradas por seus filhos), quando Nicolas Sarkozy e David Camerom desembarcaram em Trípoli e Benghazi no dia 15 de setembro para “saudar” a “Nova Líbia”, no melhor estilo “o olho do dono é que engorda a cria”.
Os sabujos que ora montam o novo governo líbio reconheceram que “a vitória não teria sido possível sem a ajuda dos aliados”. Mustafá Abdel Jalil, presidente do CNT, disse que não teria feito nenhum acordo prévio com as potências da Otan, “Mas como um povo fiel, reconheceremos esses esforços e eles terão prioridade dentro de uma estrutura de transparência”.
Satisfeitos, os mandatários retornaram a seus países enquanto prosseguiam os combates e a procura por Khadafi.
Mais ligações de Khadafi com o imperialismo
A organização internacional Human Rights Watch, que está sempre no front das agressões imperialistas para cobrar uma face mais humana das chacinas e rapinas levadas a cabo pelas potências ao redor do mundo, encontrou no ministério líbio das Relações Exteriores centenas de cartas provando que ao longo de anos a administração Muammar Khadafi contribuiu prestimosamente com a “guerra ao terror”, nome genérico dado à face militar da ofensiva imperialista pela repartilha do mundo lançada pelo USA na sequência dos acontecimentos de 11 de setembro de 2001.
Os documentos relacionam Khadafi ao programa de sequestros de “terroristas” e prisões clandestinas da CIA. Na papelada há evidências da colaboração entre autoridades líbias e a CIA e o MI6 — o serviço secreto britânico — no trato com prisioneiros. Um desses prisioneiros foi um homem chamado Abdul Hakim Belhaj, capturado em 2004 na Tailândia por ser membro de uma organização denominada Grupo de Combate Islâmico Líbio, que, segundo o USA, tinha ligações com a Al-Qaeda no Magreb Islâmico. Ele foi entregue pela CIA à Líbia de Khadafi, onde ficou preso ao longo de sete anos e sofreu tortura de agentes britânicos. Hoje, Abdelhakim Belhaj é um dos comandantes militares dos “rebeldes” líbios.
Abdul Hakim Belhaj disse que a Grã-Bretanha foi conivente com a tortura na Líbia porque a Líbia aderiu à “guerra contra o terror”. Não obstante, o atual comandante militar de Trípoli prometeu que o incidente não impedirá que a “nova” Líbia tenha “relações ordenadas” com o USA e a Grã-Bretanha.
Também partiu da administração da Líbia derrubada um dito “programa de reabilitação de terroristas”, que concedia anistia para militantes que renunciassem à luta armada contra o regime reacionário de Khadafi. Conforme mostram documentos do WikiLeaks, o tal programa chegou a ser elogiado por funcionários da administração ianque há apenas dois anos como “modelo de combate ao terrorismo”.
Outros documentos da administração líbia, encontrados em um prédio do serviço secreto da administração deposta e revelados pela rede de TV árabe Al Jazeera, mostram que figuras influentes do imperialismo ianque tentaram evitar a queda de Khadafi. Mostram, por exemplo, que um ex-membro da administração Bush e atualmente um alto executivo da transnacional ianque de construção Bechtel Corporation tentou ajudar Khadafi a derrotar os “rebeldes”. David Welch se reuniu recentemente com representantes da velha raposa para dar orientações sobre como proceder em meio a uma “guerra de propaganda”.
Jogo duplo do imperialismo ianque
Registros da reunião mostram que Welch aconselhou o regime de Khadafi a tentar ligar os “rebeldes” a “grupos terroristas”, como o USA costuma fazer quando quer desqualificar quem quem que seja. Outros registros revelam ainda que um representante do deputado estadunidense Dennis Kucinich, do partido de Obama, encaminhou um pedido a um filho de Khadafi para obter informações sobre os “rebeldes” que pudessem ajudá-lo a convencer a administração Obama de que a melhor alternativa para o USA era acabar com a guerra e manter a velha raposa no poder.
Já o jornal britânico Sunday Telegraph revelou documentos mostrando que o ex-primeiro-ministro da Grã-Bretanha, Tony Blair, visitou Khadafi em junho de 2008 e em abril de 2009 viajando em aviões do ex-chefe da Líbia. As viagens de Blair antecederam a libertação na Escócia há dois anos de Abdelbaset al Megrahi, o homem acusado de ser o responsável pela explosão de um avião da Pan Am quando sobrevoava a cidade escocesa de Lockerbie em 1988. Khadafi teria negociado a libertação de Abdelbaset al Megrahi em troca de melhores condições para os monopólios britânicos na Líbia.
Além de tudo isso, documentos revelados pelo WikiLeaks mostram que tanto Bush quanto Obama tentaram vender armas à Líbia de Khadafi — com direito ao ex-candidato a chefe do imperialismo ianque John McCain fazendo as vezes de enviado especial para este fim — e que o USA negociava com membros da administração Khadafi e com militares da Líbia a integração do país ao famigerado Africom, o Comando Militar do USA na África.
Todo este jogo duplo do imperialismo ianque em relação à Líbia mostra que para as aves de rapina o que interessa é a carniça. Quanto ao carniceiro, pouco importa se é o “ditador” de ontem ou se é o “rebelde” domesticado da “nova Líbia”, desde que o serviço seja bem feito.