O caminho para a emancipação da mulher

O caminho para a emancipação da mulher

Nota da Redação de AND: Publicamos a seguir a segunda parte de vários documentos do Movimento Feminino Popular (MFP) expondo a concepção marxista-leninista-maoista sobre a opressão sexual. Nessa parte, o MFP destaca como a sua superação está intimamente ligada com a luta de classe do proletariado pela sua ditadura e pela eliminação completa e cabal das classes. Luta que, no Brasil, dado seu caráter de sociedade semicolonial e semifeudal, inicia-se com a Revolução Agrária como primeira etapa da Revolução Democrática, Agrária e Anti-imperialista. O documento pode ser encontrado no site do MFP (sites.google.com/site/brasilmfp).

Victor Prat
O MFP tem como principal objetivo inserir as mulheres na luta revolucionária. Norte de Minas, 2015
O MFP tem como principal objetivo inserir as mulheres na luta revolucionária. Norte de Minas, 2015

Contra o feminismo pequeno-burguês

Nas últimas décadas debate-se muito sobre o aumento da participação social da mulher. As organizações feministas pequeno-burguesas propagandeiam como conquistas as políticas públicas voltadas para as mulheres, as quotas obrigatórias de candidatas nas eleições, a ocupação por mulheres de cargos de direção no mercado empresarial e de postos na máquina de Estado e de governos. O principal argumento usado pelas feministas para defender a importância desta participação, além do direito da mulher como cidadã, é que as mulheres têm uma “sensibilidade especial” conferida por características próprias do gênero. As mulheres são melhores que os homens? Um mundo mais feminino seria mais humano, menos injusto?

A tese reacionária da natureza feminina

O argumento da “sensibilidade especial” das mulheres, aparentemente novo, tem a idade da sociedade de classes. Ao longo dos diferentes estágios dessa sociedade, desenvolveu-se uma pseudo-teoria da “natureza humana” que nega a luta de classes e a contradição inconciliável entre os seres humanos das classes exploradoras e das classes exploradas, opressores e oprimidos. A partir dessa premissa afirma-se a concepção de que sempre houve pobres e ricos, que a divisão social existente é uma fatalidade inevitável, faz parte da “natureza humana”. Como variante dessa “teoria”, idealista e reacionária, apresenta-se a tese da “natureza feminina” (que nos tempos antigos fazia-se acompanhar do adjetivo “deficitária”). O objetivo é o mesmo: afirmar que existe uma natureza feminina em geral (características próprias de gênero, inerentes a todas as mulheres) eterna e imutável.

O feminismo burguês retira o adjetivo “deficitária”, ou melhor, troca-o por “sensibilidade especial”, não alterando em nada a essência idealista e reacionária. Por quê? Porque fogem de uma análise de fundo, da origem da opressão sexual sobre a mulher, defendendo que basta que nós ocupemos os “espaços democráticos” e o mercado de trabalho, provando inclusive que somos melhores. Por que as mulheres em geral seriam melhores que os homens? Uma latifundiária tem mais “sensibilidade” para tratar o problema agrário e camponês? Ela não expulsaria aqueles que tomassem suas terras? As empresárias exploram menos seus operários, pagam-lhes melhores salários? As mulheres parlamentares fazem leis mais justas e são menos corruptas? As juízas são mais justas que seus colegas homens? As policiais femininas são menos violentas ao reprimir o povo?

O mundo não tem que ser nem mais nem menos feminino para ser mais justo. Entendemos por mundo mais justo o fim da exploração do ser humano pelo ser humano, o fim desta sociedade de homens e mulheres exploradores que sugam o suor de homens e mulheres explorados.

Emancipação versus libertação

O problema da concepção feminista é o de que aparenta reduzir a causa da opressão da mulher ao patriarcado. Isto não é mais que uma concepção burguesa. Ao se recusar a ver que as raízes do patriarcado estão na sociedade de classes e que ele vem se perpetuando desde o escravismo, feudalismo e etapa imperialista do capitalismo, o feminismo defende que a luta feminista é de todas as mulheres, independente da classe social a que pertençam. Sendo assim, advogam que é possível alcançar os direitos das mulheres na sociedade de classes, no capitalismo. Portanto, para esta concepção trata-se simplesmente de lutar pela igualdade com os homens para ser revogada a opressão particular das mulheres. Só que a luta contra o patriarcado sem levar a luta contra a exploração de classe é puro engodo. É necessário combater esta concepção porque sua difusão gera um grande obstáculo, não só para a participação mais efetiva das mulheres na luta revolucionária proletária, como traz um prejuízo enorme para a luta proletária em geral, na medida em que as mulheres trabalhadoras são a metade da classe, das massas populares e nelas reside uma força poderosa que precisa ser liberada para impulsionar a revolução. O feminismo pequeno-burguês se afirma somente na aparente luta contra o patriarcado e não contra a exploração e opressão de classes. A concepção marxista afirma que o patriarcado é consequência da sociedade de classes antagônicas e que só acabará quando construirmos uma sociedade livre da exploração e opressão de uma classe sobre outra.

A ação do movimento feminino revolucionário não é uma atividade paralela ou solidária à luta do povo. Somos parte das classes que compõem nosso povo: proletários, camponeses, estudantes, intelectuais comprometidos com as causas populares. A causa feminina pertence ao proletariado, ao campesinato, às classes oprimidas e exploradas em todo o mundo. As chamadas bandeiras específicas das mulheres – creches para nossos filhos, salário igual para trabalho igual, fim da violência sexual e doméstica, combate à visão da mulher como objeto sexual, descriminalização do aborto –, pertencem também aos homens de nossa classe. Estamos na vanguarda dessas lutas por sermos as que sofrem diretamente na pele a dupla opressão – de classe e de gênero, porém os homens das classes trabalhadoras também precisam elevar sua consciência de que esta falta de direitos tem reflexos na vida do conjunto das classes oprimidas e exploradas pelo capital.

O movimento feminino revolucionário deve levar junto da luta de classes, na luta pelo programa revolucionário, todo esclarecimento e lutar contra todas as manifestações de discriminação, opressão e violência contra as mulheres. Estas lutas, de forma geral, não podem se dar separadas da luta revolucionária, pois a causa que as engendram é uma só: a exploração de classe, enfim, a propriedade privada.

Assim sendo, a tese da libertação feminina nos marcos da sociedade de propriedade privada é uma tese burguesa. E por isso mesmo deve ser combatida implacavelmente. Pois, libertação das mulheres de quem? Dos homens de sua própria classe? Esta tese se desmascara cada vez mais como feminismo burguês, que coloca como contradição principal a luta entre homens e mulheres, omitindo a origem de classe dessa opressão. Com sua proposta de “união de todas as mulheres” exploradas e exploradoras, o feminismo divide o movimento popular e afasta as mulheres do povo da luta contra a opressão. O feminismo burguês, na verdade, encobre o problema e legitima as instituições carcomidas deste velho Estado, instrumento do imperialismo e das classes reacionárias, opondo-se assim ao desenvolvimento de um movimento feminino popular, classista e revolucionário, sob a direção e condução do proletariado revolucionário.

Conquistas das trabalhadoras no capitalismo

Se compararmos a condição da mulher no início do capitalismo com as condições atuais, verificaremos que muita coisa mudou. Uma série de conquistas, mesmo que restritas às classes dominantes e às camadas de classe média terminam por alcançar também as mulheres trabalhadoras. O movimento feminista comemora a entrada da mulher no mercado de trabalho como uma conquista, ao lado do direito ao estudo universitário, no qual algumas áreas as mulheres são maioria hoje; do divórcio; do fim do pátrio poder, entre outras. É claro que houve avanços. E todos eles são fruto de muita luta da classe operária, principalmente, e das demais classes trabalhadoras. É importante, porém, ressalvar que a entrada da mulher na produção capitalista não foi necessariamente uma conquista, não partiu de uma reivindicação da classe. Pelo contrário, o desenvolvimento do maquinário, tornando supérflua a força física, permitiu ao capitalismo explorar a força de trabalho feminina e infantil. Como afirma Karl Marx:

“O gigantesco instrumento criado [o maquinário] para eliminar trabalho e operários converteu-se imediatamente em meio de multiplicação do número de assalariados, colocando todos os indivíduos da família operária, sem distinção de idade e nem de sexo, sob a dependência imediata do capital.”.

Esta situação, portanto, não significou uma melhoria nas condições de vida das classes trabalhadoras, pois o que fez o capitalismo foi dividir entre todos os membros trabalhadores da família o salário do antigo chefe da família. Já que o maquinário diminuiu a força física empregada na produção, o salário foi depreciado. Assim, uma família que antes era sustentada por um salário do homem, passa a receber três salários, por exemplo, com a entrada da mulher e do filho. Porém, o montante a ser pago aos três é igual ao que se pagava ao operário sozinho antes do maquinário. A grande indústria ampliou o número de trabalhadores e aumentou também o grau de exploração sobre a classe.

Cresce contingente feminino na produção

É necessário destacar o grande contingente social que representa hoje em nosso país a mulher trabalhadora. São dezenas de milhões. Massas populares constituídas por operárias, trabalhadoras em serviços, vendedoras ambulantes, empregadas domésticas, comerciárias e muitas outras assalariadas. Entre estas mulheres, como resultado da degeneração do sistema capitalista em sua fase imperialista, há um gigantesco e crescente contingente de mulheres pobres que são chefes de família, separadas de seus maridos ou mães solteiras, principalmente jovens, que têm de se virar sozinhas na batalha pela sobrevivência de seus filhos. Todo este contingente representa um tremendo potencial revolucionário, que na verdade é a grande conquista dos trabalhadores com a entrada da mulher na produção.

Banco de dados AND
MFP exige punição para torturadores do regime militar-fascista em protesto no dia 8 de março de 2012, no centro do Rio de Janeiro
MFP exige punição para torturadores do regime militar-fascista em protesto no dia 8 de março de 2012, no centro do Rio de Janeiro

A consciência de classe

O que a mulher trabalhadora ganha com seu ingresso no processo produtivo é algo muito maior do que o celebrado pelas feministas burguesas. A mulher operária amplia seus horizontes para muito além da cerca doméstica, ganha consciência de classe, desenvolve sua politização, entra na cena da luta de classes ao lado de seus companheiros de infortúnio, agregando uma força fabulosa à luta de todos os trabalhadores. O capitalismo amplia a exploração sobre toda a classe operária com o ingresso da mulher na produção, porém, ao mesmo tempo cria as bases materiais para que a mulher lute por seus direitos, o que é um ponto de partida para sua emancipação.

As mulheres do povo são capazes de matar e morrer para defender seus filhos e historicamente têm dado mostras de sua heroica combatividade nas lutas populares. Mas, certamente, ao compreenderem a origem de sua opressão e exploração milenar em todo o mundo, através da participação nos movimentos revolucionários de sua classe, entre eles o movimento feminino sob a direção do proletariado, elevam sua condição de combatente defendendo não apenas seus filhos, mas os filhos do povo, toda a sua classe.

Quanto às outras conquistas, são resultado direto dessa contradição. O divórcio e o fim do pátrio poder, por exemplo, foram conquistados pelas mulheres na revolução burguesa na França em 1789. Tão logo a burguesia instalou-se no poder retirou esses direitos por representarem ameaça à propriedade privada. O acesso à universidade, reivindicado já no século XIX, pouco representava àquela época e segue representando pouco para as mulheres operárias e camponesas, que só chegarão massivamente à universidade quando sua classe estiver no poder.

O feminismo burguês se afirma somente na luta contra o patriarcado e não contra a exploração e opressão de classes. A concepção marxista afirma que o patriarcado é consequência da sociedade de classes antagônicas e que só acabará quando construirmos uma sociedade livre da exploração e opressão de uma classe sobre outra.

A mulher jamais se libertará ou será completamente emancipada dentro do sistema de exploração capitalista. Em primeiro lugar, porque quando falamos em libertação estamos falando de toda a classe. Em segundo lugar, porque a emancipação da mulher não significa apenas a incorporação de um grande número de mulheres à produção. É necessário que todas as mulheres sejam incorporadas e em condições de igualdade com o homem. Para isso é fundamental atacar a raiz dessa desigualdade, que o trabalho doméstico seja reduzido ao mínimo possível, capaz de ser realizado por homens e mulheres, ao ponto de não representar uma sobrecarga para nenhum dos dois. E isso não ocorrerá no capitalismo, pois por mais que a produção cresça em determinados momentos, o sistema não pode e não quer incorporar toda a população pobre à produção e de maneira especial não o fará com todas as mulheres. Muito menos ainda abrir mão do trabalho não pago da mulher trabalhadora, transformando o trabalho doméstico em indústria social (creches, lavanderias coletivas, restaurantes coletivos): a unidade econômica representada pela família é condição da qual o sistema não abre mão, pois ela potencializa a extração da mais-valia ampliando em níveis altamente rentáveis a exploração da força de trabalho.

O que afirmamos e reiteramos é que o capitalismo assenta as bases para a emancipação das mulheres trabalhadoras, quando incorpora parte delas na produção, uma vez que ao fazer isso inevitavelmente lança-as na luta de classes. Assim as mulheres iniciam sua participação política nos sindicatos operários e ligas camponesas, em organizações populares e estudantis, até a militância revolucionária organizada, politizando-se e elevando sua consciência de classe.

A emancipação das mulheres e a revolução

Em decorrência do caráter de classe da opressão feminina, a emancipação da mulher só pode se realizar de fato através da emancipação de toda a sua classe.

Somente a revolução proletária que derroca o capitalismo e constrói o socialismo pode conduzir à emancipação da mulher, completando-se com o advento do comunismo. Para tal, as mulheres trabalhadoras devem lutar lado a lado com seus irmãos de classe explorada pela emancipação social, criando assim as bases materiais e subjetivas para sua completa libertação.

Na sociedade socialista as massas de mulheres são integradas na produção social, as atividades domésticas são industrializadas, entre um conjunto de medidas que libertam objetivamente a mulher trabalhadora da escravidão doméstica, além da plena igualdade jurídica com o homem.

Mas, somente com a passagem ao estágio superior do socialismo, o comunismo, quando não mais existirão classes sociais antagônicas, aí sim, a emancipação da mulher será completa.

As concepções burguesas e pequeno-burguesas afirmam que a “libertação da mulher” se dará pela via da luta e disputa com os homens por equiparar-se na sociedade; por uma suposta igualdade de direitos debaixo da exploração e opressão capitalistas, através da “união do sexo feminino”, ou da suposta “sensibilidade especial” das mulheres.

Ao contrário, afirmamos que somente através da revolução proletária a emancipação da mulher será realizada. Só com emancipação da classe proletária ao conquistar o socialismo e o comunismo terá fim toda opressão sobre a mulher. No caso do Brasil, como corresponde, o caminho da revolução socialista passa pela revolução de Nova Democracia que se desencadeia como Revolução Agrária.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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