De 12 de maio a 13 de junho, o Peru se viu às voltas com uma greve que paralisou cerca de 1,8 milhão de trabalhadores, entre professores, pequenos e médios agricultores (mesmo os assalariados rurais), médicos, enfermeiros e demais funcionários do setor de saúde.
Além desses setores, aderiram à greve os estudantes que apoiavam os professores em suas reivindicações e a crescente massa de desempregados e insatisfeitos com o governo de Alejandro Toledo.
As manifestações de grevistas, em várias partes do país, foram dispersadas violentamente
A deflagração da greve foi seguida pela decretação do estado de emergência pelo presidente Toledo, e uma grande repressão desabou sobre os grevistas. As manifestações de milhares de grevistas nas principais cidades do país foram dispersadas violentamente, resultando em aproximadamente 100 professores e estudantes presos, além de 50 feridos pela ação da polícia e do Exército e um estudante assassinado.
Depois de assenhorear-se da direção do movimento grevista, traindo os professores, o Sutep negociou um aumento de cerca de 100 sóis (menos de R$ 33) para os professores, valor muito aquém do reivindicado: 210 sóis.
Luta de classes
Segundo Luis Arce Borja, diretor do periódico El Diário Internacional, “a greve dos professores e o conjunto da luta sindical no Peru é um fenômeno que tem que ser abordado como parte da agudização da luta de classes no país. Neste terreno, a greve magisterial surgida desde as bases, e não desde a cúpula do Sutep (Sindicato Único de Trabalhadores em Educação do Peru), constituiu um passo adiante na luta contra as classes políticas que dirigem o Estado e contra os partidos políticos e dirigentes sindicais que, desde uma aparente posição de esquerda, colaboram com os regimes de turno.”
“A onda grevista dos últimos meses é o melhor sinal de que o governo de todas las sangres (de todas as nacionalidades e classes sociais) de Toledo já não pode seguir enganando e roubando miseravelmente as massas pobres. Essas lutas revelam que os dirigentes corruptos (como os do Sutep) já não conseguem conter a luta das massas. Essas greves em cadeia são uma prova de que os trabalhadores começam a se livrar do temor, da chantagem e da repressão a que foram submetidos pelas forças armadas, as forças policiais e os grupos paramilitares. As lutas e mobilizações sociais voltam ao primeiro plano das contendas sociais.”
Toledo, conhecido como o cholo (mestiço) de Harvard, prometeu o que seria o governo de “todas las sangres” e catalisou o apoio dos pretensos partidos de esquerda, como o Pátria Roja que controla o Sutep, num “acordo nacional”. Seu discurso populista, que incluía pronunciamentos em quéchua (língua indígena mais falada no país) antes das eleições, escondia a mesma política aplicada pelo traficante e agente da CIA Alberto Fujimori, que se constituía – além da obediência às ordens dos patrões imperialistas ianques e menores -, numa ferrenha repressão aos movimentos populares, com justificativas que fazem corar de vergonha os mais hipócritas dirigentes de ONGs da modalidade “direitos humanos”. Basta dizer: o secretário-geral do Partido Comunista do Peru (PCP), Doutor Abimael Guzmán, capturado e imediatamente lançado a uma cela subterrânea em 1991, tem paradeiro ignorado, desde então. O governo “humano” de Toledo e seus sequazes da falsa esquerda são incapazes de revelar se o presidente do PCP, Gonzalo, está vivo ou morto. Todo este sistema de tortura, genocídios, saque e pirataria, aliado ao tráfico de drogas e de armas, foi gerenciado por Vladimiro Montesinos e Fujimori, que fugiram do país em 2002.
A política econômica imposta pelo imperialismo e aplicada por Toledo, ainda que com retoques popularescos, não conseguiu disfarçar o arrocho salarial e a pilhagem de riquezas do país. No plano das políticas sociais, a gerência de Toledo recebe a justa denominação de “fujimorismo sem Fujimori”.
Os chamados partidos de esquerda no Peru, assim como nas demais semicolônias da América Latina, encontram algum espaço nos parlamentos, se contentam com cargos menores em outras esferas do governo, além de remendar o aparato dos sindicatos oficiais, inclusive o Sutep, onde, todavia seus afiliados deflagraram a greve de maio/junho.
As bases ultrapassaram os dirigentes
Depois de 12 anos de aparente passividade, novamente o Sutep, e principalmente as bases das províncias, empurrando e ultrapassando a direção nacional, marcaram uma greve geral, a partir do dia 14 de maio, para reclamar seus direitos rejeitados e congelados durante os últimos 12 anos. A direção nacional, encastelada durantes os últimos 14 anos no CEN (Comitê Executivo Nacional – oportunista e corrupto, pertencente ao Pátria Roja, um grupo de perfil trotskista e politicamente irmão e identificado com o pretenso partido comunista “unidade”, seguidores de Nikita Kruschev), não teve outra melhor idéia que “adiantar-se” às bases de província e chamar a greve para o dia 12 de maio, com a finalidade de confundir e enganar os professores, no afã de manter-se em seus cargos, mascarados novamente como “lutadores sociais da primeira linha de combate”.
Causa curiosidade esta atitude do CEN e do Sutep, que durante os últimos 12 anos se dedicaram a acalmar, silenciar e congelar os justos reclames de mais de 280 mil professores peruanos, sobretudo porque quiseram convencer aos professores de que a luta direta das massas não era o caminho a seguir e se dedicaram de corpo e alma à “luta parlamentar”. Por isso formaram grupamentos de nomes sugestivos ante os olhos dos empobrecidos professores – “Esquerda Unida”, “União de Esquerda Revolucionária (UNIR)” e, a última moda, “Movimento de Nova Esquerda (MNI)” – e nestes 12 a 14 anos últimos anos se dedicaram a conviver no parlamento burguês com a pior marca política da sociedade peruana.
Delatores oficiais
Não esqueçamos que Pátria Roja, de mãos dadas com a Unidade e com o Apra, puseram a faixa presidencial em Fujimori, em 1990, depois do famoso segundo turno eleitoral. Mas não só deram seus votos a Fujimori, senão também um apoio solapado durante os 10 anos de ditadura fuji-montesinista, afogando os protestos dos professores e negociando as listas de reivindicações do Sutep nas costas das bases, delatando seus opositores dentro do sindicato como “terroristas”, “senderistas” e oficializando, desta maneira, o miserável papel de delatores de mestres ante os serviços de inteligência e aniquilamento de Fujimori e Montesinos.
Centenas de professores desapareceram durante os governos de Alan Garcia e Fujimori. A grande maioria desses professores, assassinados e/ou encarcerados, nunca foram terroristas nem muito menos senderistas, simplesmente eram professores afiliados ao Sutep que discrepavam abertamente da direção nacional usurpada pelo Pátria Roja.
Mas a cartilha do Pátria Roja continua sendo a mesma. Os “pseudodirigentes nacionais do Sutep” continuam acusando alegremente, nos noticiários de televisão e imprensa escrita, de “terroristas”, de “pró-senderistas” os dirigentes de base do magistério, sobretudo os de província – pelo fato de virem de Puno, Cuzco, Apurimac, Ayacucho, Huancavelica, Junin e Cerro de Pasço e de não estarem de acordo com a manipulação mafiosa do sindicato.
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