Ha sete anos fazendo teatro de rua em Rondônia, o coletivo O Imaginário realiza produções voltadas para temas regionais, buscando na mitologia amazônica e nas histórias da região, no imaginário popular, possibilidades de se comunicar com o público. Político e crítico, o grupo apresenta uma realidade muitas vezes desconhecida de muitos e a coloca em debate.
– Surgimos a partir da ideia de construir um coletivo que pensasse o teatro, o público e o lugar, que pode ser a cidade, a floresta, o rio, disseminando-o e ganhando a cena na região e a nível nacional. Dentro da questão da criação, do fazer artístico, pensávamos um jeito inovador de trabalhar o teatro na Amazônia. Assim fomos desenvolvendo projetos e ocupando praças e ruas de Porto Velho – conta Chicão, diretor do grupo.
– Sem nunca perder o nosso foco, procuramos trabalhar com a questão ecológica, patrimonial, o cotidiano do povo daqui, a mitologia amazônica, que são acontecimentos que fazem parte da vida do amazônida, do imaginário do caboclo. Ele cria essa mitologia para explicar ou justificar certos fatos do seu cotidiano – fala.
– Isso é muito rico e não para. A todo momento tem uma nova lenda sendo criada. E é desse imaginário popular que foi escolhido o nosso nome, porque estamos inseridos nesse lugar, nesse imaginário que é o viver do amazônida, o seu habitar – explica.
O coletivo também procura seguir uma linha de teatro que denuncia, ficando atento a tudo que acontece na região.
– No momento temos sofrido com a construção das usinas de Santo Antônio e Jirau, lá no Rio Madeira. Com a ida de muita gente para o local aumentou a violência, o abuso da criança e do adolescente. Estamos conectados com temas assim e, entre outras coisas, não aceitamos receber recursos de empresas que estão lá devastando – afirma Chicão.
– Estamos também em um processo de discussão da ideia de trabalhar mais com o tema da luta pela terra. Temos acompanhado não só a questão das terras de ocupação de pequenos agricultores, como também das reservas indígenas, a questão escravista, o garimpo, os problemas que afligem o povo do Norte. É um enfrentamento para que as coisas não aconteçam como bem entendem, prejudicando a comunidade – expõe.
O último espetáculo do coletivo estampa em cena uma crítica do que foi a construção da estrada de ferro Madeira-Mamoré, entre 1907 e 1912.
– A Ferrovia dos Invisíveis é baseado em uma pesquisa nossa voltada para os trabalhadores da estrada de ferro, representando toda epopeia que foi aquela construção. Mais de 70 mil pessoas de todo o mundo foram para lá, mais de 40 mil etnias, nacionalidades e, praticamente, todos exterminados – fala Chicão.
– Isso sem falar dos indígenas e dos povos da floresta, que também foram eliminados quando surgiu aquela obra. E justificaram essas mortes em função de um “progresso”, construindo uma ferrovia que saía do nada e ia para o lugar nenhum. Hoje em dia está desativada – continua.
Seguindo com cultura e denúncia
– Nessa linha, temos também dois espetáculos muito fortes: Filhas da Mata, que fala da presença feminina no início do século, mostrando as mulheres que sofriam violência de todo tipo; e Memória de Guerra, que denuncia a falta de possibilidades das pessoas se expressarem. Através do projeto Palco Giratório apresentamos Filhas da Mata por várias partes do país – comenta Chicão.
– Atualmente O Imaginário está trabalhando um novo espetáculo, Mulheres do Aluá. Contaremos a história das mulheres que foram condenadas, entre 1910 e 1960, por crimes banais. Nossa preocupação constante é trazer à cena histórias que aconteceram aqui na região, nos tornando o teatro que mostra a verdade e alerta para que as pessoas possam dar um grito de libertação – declara Chicão.
O panorama atual para o teatro em Rondônia e na região Norte como um todo, segundo Chicão, é muito interessante no aspecto da popularização.
– Temos, por exemplo, um festival em Porto Velho, chamado Amazônia encena na rua, realizado sempre no mês de julho, que reúne aproximadamente 50 mil pessoas. É uma grande aglomeração em torno do teatro de rua, um fenômeno de público – expõe.
– Muito importante também são as caravanas que vêm acontecendo no Norte e especialmente em Rondônia. Fizemos uma, por exemplo, saindo de Porto Velho indo até Manaus sobre as águas, passando por 7 rios, 174 comunidades, sempre com muita gente prestigiando – continua.
O grupo conta no momento com 20 atores, entre estudantes e profissionais em exercício, e uma sede para realizar seus projetos.
– Compramos um terreno e construímos a nossa sede, chamada Tapiri, onde temos uma escola livre de teatro, capacitando pessoas de todas as idades, e uma biblioteca física e virtual para pesquisas. Assim, temos ocupado as praças de Porto Velho e conseguido levar o nosso teatro para várias partes do país – conclui Chicão.
www.oimaginarioro.com.br é o contato do coletivo.