O incremento da guerra civil reacionária contra o povo no Ceará

Guerra civil reacionária que assola também o Ceará é resultado das políticas antipovo dos governos (foto: Paulo Whitaker)

O incremento da guerra civil reacionária contra o povo no Ceará

Banditismo por uma questão de classe.

Chico Science

Ataques a instituições do velho Estado

Na madrugada do dia 1o de abril, prédios de instituições do velho Estado foram atacados em Fortaleza: a Secretaria Executiva Regional IV e o 18º Juizado Especial, além da Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor). Os ataques deixaram 70 veículos queimados, incluindo 10 ônibus.

Paulo Whitaker
Guerra civil reacionária que assola também o Ceará é resultado das políticas antipovo dos governos (foto: Paulo Whitaker)
Guerra civil reacionária que assola também o Ceará é resultado das políticas antipovo dos governos

Em Cascavel, região metropolitana, cerca de 10 carros e 50 motocicletas foram incendiados no pátio da Secretaria Estadual de Infraestrutura (Seifra). Em Sobral, interior do estado, coquetéis molotov foram arremessados contra o prédio da Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops).

Segundo informações veiculadas pelo monopólio de imprensa, os ataques seriam uma represália das facções criminosas que controlam o tráfico varejista de drogas ilícitas na região (PCC, Comando Vermelho, Guardiões do Estado e Família do Norte) contra a decisão do governo cearense de colocar bloqueadores de celular em todos os presídios do estado. 

Cresce a violência em Fortaleza

O estado do Ceará teve número recorde de homicídios em 2017. Foram 450 mortes violentas no estado em dezembro e 5.134 durante todo o ano, conforme dados oficiais divulgados no dia 12 de março pela Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS).

A quantidade de homicídios cresceu 50,7% em relação a 2016, quando a SSPDS havia confirmado 3.407 homicídios em todo o estado. O maior crescimento ocorreu em Fortaleza, com 96,4% mais mortes em 2017 que em 2016. Apenas neste ano, quatro chacinas ocorreram na capital cearense. Na primeira delas morreram 14 pessoas na casa noturna “Forró do Gago”, em janeiro. Soma-se a este quadro as recorrentes rebeliões em presídios no estado que contabilizam dezenas de mortes.

A generalização da delinquência

Não é de hoje que o povo cearense sofre com assassinatos, chacinas e demais mazelas decorrentes da delinquência. Ainda que o recente incremento de crimes violentos em Fortaleza esteja relacionado com as disputas pelo controle do tráfico varejista de drogas, suas causas têm raízes mais profundas e estruturais. Joguemos um pouco de luz sobre a questão:

I) a miséria que condiciona a existência de um contingente permanente de homens e mulheres, particularmente jovens, dispostos a ingressar nos tortuosos caminhos da delinquência e o predomínio do latifúndio, que impõe migrações forçadas de camponeses pobres para os grandes centros urbanos em busca de trabalho para a subsistência de suas famílias.

II) os políticos que clamam por mais investimentos em repressão são os mesmos que aprofundam a condição semicolonial e a consequente desindustrialização do país, gerando desemprego em massa ao investirem os recursos dos impostos pagos pelo povo prioritariamente no modelo agroexportador do “agronegócio” (latifúndio de novo tipo): soja, cana, laranja, café, carne bovina etc.

III) o tráfico atacadista de toneladas de drogas ilícitas e armas é gerenciado pelo próprio Estado. Alguns exemplos: o tráfico de armas por integrantes das Forças Armadas como recentemente denunciado na edição 207 de AND; as apreensões de toneladas de cocaína nas propriedades de eminentes políticos como o senador Zezé Perrella e o atual ministro da agricultura Blairo Maggi e a facilidade com que toneladas de drogas ilícitas e armas de uso exclusivo das Forças Armadas transpõem diariamente as fronteiras do país que deveriam, constitucionalmente, ser protegidas por estas mesmas Forças Armadas.

IV) as forças policiais (particularmente civis e militares) também gerenciam o mercado varejista de drogas. Sobre isso, não faltam provas, mesmo nos monopólios de imprensa, apesar dos recorrentes episódios de “policiais traficantes” serem tratados sempre como “casos isolados”. Não é de se estranhar que, nas estatísticas oficiais do que o Estado e os monopólios de imprensa denominam genericamente de “violência”, sejam ignorados os assassinatos perpetrados por policiais ou por milícias compostas por policiais ou ex-policiais. A este respeito declarou recentemente Leonardo Sá, professor de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará (UFC) e pesquisador do Laboratório dos Estudos da Violência (LEV): “Há notícias de alguns segmentos de policiais que atuam fazendo venda de armas. E isso não se investiga, é um tabu, pois elas movem interesses muito poderosos, que historicamente estão ligados ao chamado sistema de pistolagem”*.

V) a situação de mais completo abandono vivenciado pelas massas pobres de todo o país é uma “política de Estado” e não a “ausência do Estado”. Não é isso o que vemos nos sucessivos gerenciamentos de turno por meio da não efetivação da política de reforma agrária que consta na própria constituição? Não foi este Congresso de bandidos corruptos que recentemente aprovou o congelamento dos investimentos em saúde e educação para os próximos anos? Não é este mesmo Congresso que, com a sua contrarreforma, busca impor o desmonte da previdência social?

As massas responderão à guerra reacionária

A calamitosa situação no Ceará gerou tensões entre os gerenciamentos estadual e federal. Após troca de farpas sobre a responsabilidade pelo crescimento da delinquência no estado, entre o governador Camilo Santana/PT, o Ministro da Justiça Torquato Jardim e o presidente Michel Temer/MDB, já foram anunciadas medidas pelo poder executivo federal que prenunciam o incremento da guerra civil reacionária no Ceará, com a intervenção da Força Nacional já em curso e a presumível intervenção das Forças Armadas.

O Ministro da Justiça afirmou ainda que está trabalhando na elaboração de uma Política “Nacional de Segurança Pública” e já houve a divisão do próprio ministério em duas pastas distintas: uma de justiça e outra de Segurança Pública. Assistimos à centralização das forças repressivas no Executivo federal, especialmente nas Forças Armadas, e é questão de tempo para que a intervenção das Forças Armadas na “segurança pública”, iniciado no Rio de Janeiro, ganhe status de “política pública” por todo o país, como preparativo para um golpe de Estado contrarrevolucionário.

Enganam-se aqueles que acreditam que o povo aceitará passivamente a tantos desmandos. Com as violências sem fim cometidas contra os pobres, na cidade e no campo, pouco a pouco, as massas vão aprendendo pela sua própria experiência que somente por meio de sua justa violência poderão impor a paz tão desejada e preparam, silenciosamente, uma nova onda de grandes rebeliões! Não são apenas as facções criminosas que elegeram entre os seus alvos preferenciais os órgãos do velho Estado – ainda que estes o façam por interesses pontuais. Muito antes disso prefeituras, delegacias, fóruns, ministérios e o próprio Congresso Nacional já estão na mira do povo. Bem-vinda seja a tempestade!

Referência:

* https://www.cartacapital.com.br/sociedade/Por-que-os-homicidios-nao-param-de-crescer-no-Ceara

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