O joio e o trigo em Tropa de Elite 2

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O joio e o trigo em Tropa de Elite 2

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Tropa de Elite 2 foi lançado com estardalhaço durante a apoteótica campanha das Unidades de Polícia Pacificadora nos morros cariocas, discurso único encampado pelas campanhas eleitoreiras no Rio de Janeiro, projetado nacionalmente pelo PT, com a nacionalização das UPP’s e aclamado pelo PSDB que chegou a projetar a criação de um ‘Ministério da Segurança Pública’.

O Bope é a ponta de lança das invasões em todas as favelas, invadindo os morros na calada da noite, disparando armas de guerra de dentro dos caveirões e espalhando a morte.

Mais de uma dezena de Unidades de Polícia Pacificadora foram implantadas seguindo à risca os planos dos gerenciamentos municipal, estadual e federal no Rio. Primeiramente na zona Sul, agora elas se estendem à zona Norte da cidade. O terror imposto à população das favelas pelo tráfico varejista armado agora é gerenciado por policiais nas “comunidades pacificadas”. É a política da paz dos cemitérios para as massas.

Exatamente nesse contexto foi lançado o Tropa de Elite 2.

Um pedido de desculpas

“Há quem me considere fascista”, diz Nascimento, promovido a tenente-coronel, em uma clara resposta aos críticos de Tropa de Elite 1. Aliás, todo o enredo de Tropa de Elite 2 é, de certo modo, uma resposta às críticas ao primeiro filme, notadamente um reconhecimento do diretor José Padilha de que “errou na medida” do que resultou em uma obra fascista.

Apesar de, na abertura, o diretor marcar que “se trata de uma obra de ficção”, o filme faz alusões a Luiz Fernando da Costa (conhecido como Fernandinho Beira-Mar); um Sérgio Cabral Filho de aparência frágil e dura política antipovo; Álvaro Lins, ex-chefe da Polícia Civil do Rio, condenado pela CPI das milícias; o ex-professor de história e deputado estadual Marcelo Freixo; um cômico-oportunista-reacionário Wagner Montes, promovido de apresentador de TV a deputado estadual.

O filme começa com o capitão Nascimento comandando uma unidade do Bope para reprimir uma rebelião de presos em Bangu I. Ele acompanha a rebelião pelas câmeras de segurança da penitenciária e percebe que  líderes de facções rivais matam uns aos outros. Ele coordena tudo para que os presos se trucidem e dá o comando à unidade do Bope para que só entre em ação para “terminar o serviço”.

O coronel Nascimento consulta seus superiores e diz que é a oportunidade aguardada para massacrar os líderes do tráfico. A ordem é deixar o Fraga (personagem que representa Marcelo Freixo) entrar no presídio e negociar. Durante as negociações, os presos se rendem. Um dos comandados do coronel Nascimento descumpre a ordem e dá um tiro de fuzil na cabeça do líder da rebelião.

Fraga denuncia o genocídio promovido pelo Bope em Bangu I e a repercussão é interpretada como negativa pelos círculos de poder. Nascimento será exonerado, mas quando vai se entender com seus superiores em um rico restaurante, é ovacionado pelos frequentadores do lugar. A reação positiva das classes abastadas faz com que os chefes do fascista Nascimento retrocedam e “anulem” exoneração do coronel, promovendo-o ao cargo de sub-secretário de segurança pública.

“O outro”

Nascimento se rejubila com seu trabalho, até o momento em que percebe que onde antes a polícia não ingressava, alguns de seus elementos agora reinavam matando, extorquindo, controlando todos os serviços prestados nos morros.

“Agora, o inimigo é outro”: é a filosofia que Tropa de Elite 2 pretende, e muitas vezes consegue, fazer passar. Muitas pessoas vêm apontando o filme como “progressista” e que representa uma dura crítica à corrupção na polícia, na política e até mesmo contra o “sistema”.

Tropa de Elite 2 tenta convencer o público de que a polícia é uma coisa e que os “desvios de conduta” são obras de “maus policiais” e que o que se precisa é “moralizar as instituições e a política”. Nesse ponto do filme, tudo gira em torno da “CPI das milícias”. Esta CPI, fato real presidido pelo deputado estadual Marcelo Freixo em 2008, investigou a ligação de parlamentares do Rio de Janeiro com grupos paramilitares e culminou na prisão e cassação do mandato do ex-delegado e deputado Álvaro Lins.

O coronel Nascimento assume o papel de um homem alquebrado pela sobrecarga de trabalho, que teve o casamento arruinado devido à sua entrega total ao Bope, que sofre por não ter uma boa relação com seu filho, cuja ex-esposa se casou com seu maior desafeto, o “intelectualzinho de esquerda” (segundo suas próprias palavras) deputado Fraga, e se vê constrangido e sem resposta quando o filho lhe pergunta por que ele mata as pessoas.

Assim, o torturador e assassino comandante do Bope dá lugar ao sofrido e empenhado subsecretário de segurança pública, que se vê cercado de inimigos e obrigado a agir clandestinamente para apurar o porquê da ação mafiosa de policiais no controle de favelas.

Metamorfoseado, o subsecretário Nascimento comanda uma patrulha com agentes do Bope, surpreende e espanca um político corrupto envolvido com os grupos de extermínio, após o seu filho ser baleado em um atentado que visava assassinar o deputado Fraga.

Assim como o título do filme demarca que “o inimigo agora é outro”, notadamente o Nascimento agora também é outro.

De que sistema fala Nascimento?

À medida em que se choca com suas desilusões pessoais e profissionais, o coronel Nascimento busca as chaves para romper o “sistema”. Por “sistema” ele tratou o tráfico varejista de drogas, tratou os policiais corruptos, os grupos paramilitares que passaram a controlar as favelas, os parlamentares envolvidos com esses grupos, cada um em separado, até finalmente dar a tudo isso junto essa designação.

Mas o fundamental disso tudo, é que quem faz esses questionamentos, quem interpreta e dá a visão ao público sobre todas essas questões é o policial Nascimento, comandante do Bope e subsecretário de segurança pública do Rio de Janeiro.

No ápice do filme, no plenário da câmara dos deputados do Rio, o decepcionado coronel Nascimento, lado a lado com seu ex-desafeto Fraga, profere um apaixonado discurso, dizendo que “não sabe porque matou”, que grande parte dos políticos presentes lá “deveriam estar presos” e que a “polícia do Rio de Janeiro deveria acabar”. O “sistema” de Nascimento passa a ser julgado como se fosse uma grande “banda podre”, um “desvio de conduta” do velho Estado.

E para desmantelar o “sistema”, com uma cena panorâmica, num sobrevoo em Brasília, Nascimento  prevê uma espécie de projeto “ficha limpa” que livrará o Brasil de todos os seus males.

Fica para a maioria do público a imagem de um Bope romantizado, que foi “mal utilizado” e serviu inconscientemente para a proliferação do “inimigo”. A mensagem é a de que: apesar do fascismo explícito de Tropa de Elite 1, somente ele não basta, também é necessário ser “ficha limpa”, como o “herói” Nascimento.

A Globo e seus heróis

Transpirando todo o seu fascismo, cumprindo seu papel de espia e mensageiro das forças de repressão e da reação, o monopólio Globo mais uma vez reclamou para si o papel de paladino da matança de pobres. Reverberando seu costumeiro reacionarismo, Alexandre Garcia, em seu comentário do Bom dia Brasil de 26 de novembro, após a invasão da Vila Cruzeiro pelo Bope, comemorou dizendo que “está havendo uma torcida no Brasil inteiro pelos heróis do Rio de Janeiro. E quem são esses heróis? Principalmente, os homens de preto do Bope. Assim como nos Estados Unidos, em que o cinema ajudou a mudar corações e mentes contra a Guerra do Vietnã, aqui o Tropa de Elite ajudou também”. E que “as pessoas que estão vendo as imagens do Rio de Janeiro veem em cada homem de preto um Capitão Nascimento”.

Assim, Garcia apresenta essa solução para todos os problemas do mundo.

Torna-se desnecessária qualquer outra indagação de a que serve o Tropa de Elite.

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