O materialismo histórico dialético

Karl Marx fundou a doutrina por meio do trabalho teórico e da luta de classes prática

O materialismo histórico dialético

Ciência das leis gerais que regem o desenvolvimento da sociedade, o materialismo histórico dialético é a aplicação da filosofia marxista (materialismo dialético) ao estudo da história do desenvolvimento da sociedade em seu conjunto. Seu objetivo é responder como determina-se um certo regime social, como se condiciona o desenvolvimento social, como e por que se alteram no decorrer da história o regime social, a relação entre o regime social e o Estado — além do direito, moral, psicologia e a ideologia dos homens de modo geral.

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Karl Marx fundou a doutrina por meio do trabalho teórico e da luta de classes prática
Karl Marx fundou a doutrina por meio do trabalho teórico e da luta de classes prática

A humanidade percorreu uma longa e complexa trajetória que vai desde o regime da comunidade primitiva (relações comuns dos meios de produção, chamado também comunismo primitivo), passando pela escravidão, feudalismo e capitalismo até o socialismo, hoje em briga para impor-se. Ao contrário do idealismo histórico, que centra sua explicação no desenvolvimento histórico da sociedade humana nas ideias, na ação de governantes ou na decisão subjetiva deste ou daquele, o materialismo histórico explica o desenvolvimento social baseando-se na capacidade dos homens de produzirem e como organizam-se para tanto.

Forças produtivas e relações de produção

Segundo o materialismo histórico dialético, uma sociedade entra em bancarrota quando seu modo de produção entra em crise intestina, ou seja, quando a capacidade de produção (forças produtivas) desenvolve-se tanto que entra em antagonismo com as relações de produção (formas como os homens se organizam e se relacionam para produzir).

A sociedade burguesa, por exemplo, entrou em crise às bordas da bancarrota quando as forças produtivas se desenvolveram de tal maneira que as relações entre proletários e burgueses (relações de produção) entraram em antagonismo. Com a grande indústria, os homens passaram a produzir em abundância e, no entanto, os proletários e o povo em geral não podiam adquirir as mercadorias por causa do baixo salário que recebem. O baixo salário, por outro lado, é uma necessidade do grande capitalista para extrair o máximo de mais-valia, ou seja, para explorar ao máximo o proletário; e, para piorar, a grande indústria, ao se desenvolver, passa a gerar uma enorme massa de desempregados, pois o grande capitalista substitui-os pelas máquinas objetivando mais produtividade (a máquina produz mais mercadorias em menos tempo, aumenta intensidade) e ter menos gastos com salários. Sem isso, o grande capitalista não pode tirar o máximo de lucro e, se não tirá-lo, será engolido pela concorrência. Mas, se não há quem compre a mercadoria, o ciclo da mais-valia não se concretiza e o grande capitalista não consegue retirar o lucro do capital aplicado. Essa complexa relação de produção, dado o desenvolvimento das forças produtivas, gera as crises cíclicas e profundas do capitalismo e, nesses momentos, os grandes capitalistas param a produção para não aumentar ainda mais a falência econômicas de grandes empresas. Eis aí um exemplo de antagonismo surgido com a grande indústria entre forças produtivas e as relações de produção capitalistas (a forma como burguês e proletário se relacionam, os termos econômicos dessa relação); antagonismo no qual as relações de produção, ou seja, a burguesia impede o desenvolvimento da sociedade, impede o avanço das forças produtivas.

Essa contradição, quando se antagoniza, é e sempre foi o que gerou revoluções sociais. Foi assim que a humanidade passou das comunidades primitivas ao escravismo, do escravismo ao feudalismo, do feudalismo ao capitalismo e é igualmente por isso que o socialismo e o comunismo são inevitáveis. As próprias relações capitalistas de produção geram miséria, repressão, opressão e decompõem diariamente a sociedade burguesa, tornando-a moribunda e atiçando as forças produtivas (essencialmente, as massas trabalhadoras) contra o seu regime social.

As forças produtivas, então, levantam-se violentamente para destruir a forma de propriedade que geram essas relações de produção: assim aboliu-se a propriedade escravista e surgiu a feudal; igualmente assim aboliu-se a feudal e gerou-se a capitalista; e assim aboliu-se, em uma parte do mundo no século passado, a propriedade capitalista e gerou-se a propriedade social (pôs-se fim à propriedade privada). Ou seja, o antagonismo surgido entre as forças produtivas e as relações de produção determinam o antagonismo entre as classes que estabelecem essas relações, ou seja, é a própria base da luta de classes e do seu desenvolvimento inevitável. Assim, portanto, o marxismo (do qual faz parte o materialismo histórico) põe acento nas massas e no seu grande poder transformador, reconhecendo que as grandes personalidades são produtos casuais de uma necessidade objetiva.

 

A estrutura e a superestrutura

O materialismo histórico dialético sustenta, além disso, que as ideias, a ideologia, a consciência, a moral, o direito e sua forma social mais complexa, o Estado, são reflexos da forma como os homens organizam-se economicamente para produzir. Marx chamou o modo de produção (a economia própria de uma sociedade e como os homens organizam-se e relacionam-se para realizá-la) de estrutura ou base econômica, enquanto as concepções políticas, ideológicas, jurídicas, morais, filosóficas e religiosas e as instituições e demais relações sociais de superestrutura. Ele diz que a estrutura determina, em última instância, a superestrutura; o modo como os homens produzem determina a sua consciência, as instituições dessa sociedade, os pensamentos, a arte, a ideologia dominante dessa sociedade etc. E, como é lógico, em uma sociedade de classes – onde cada classe tem uma dada relação com a propriedade – a superestrutura tem um caráter de classe. Cada classe, portanto, possui concepções políticas, ideológicas, artísticas etc. que lhes servem e que lhes são próprias, antagônicas entre si.

Aquela classe que é economicamente dominante, que detém a riqueza social por conta da forma de propriedade e das relações de produção que estabelece junto às forças produtivas erige, a seu interesse, o Estado para defender seus interesses. Assim, a moral, o direito e o Estado são fenômenos relativos, são historicamente determinados e não eternos; transformam-se ao longo da história conforme transforma-se o modo como os homens produzem.

A consciência, a arte, a cultura e a ideologia dos homens também são reflexos do modo de produção de uma sociedade. A forma como os homens relacionam-se entre si para produzir e a consequente luta entre eles geram determinados conhecimentos e percepções distintas da realidade. Concepções de mundo e de vida, formam a sua psicologia, mentalidade, atitude, enfim, a sua ideologia. O homem, historicamente, transformou — ao passo em que transformou-se o regime social — sua própria concepção do mundo.

Apesar de a ideia ser reflexo da matéria, ou seja, do modo de produção estabelecido, ela tem relativa independência e desempenha um papel ativo. O marxismo, uma ideia não-dominante na sociedade burguesa por questões objetivas, ao penetrar nos homens e mulheres, sobretudo nos de sua classe correspondente — o proletariado — transforma os próprios e estes transformarão a sociedade, destruirão o regime social dado e construirão outro. No entanto, o próprio marxismo só pôde surgir com as bases materiais criadas pelo capitalismo (o surgimento da propriedade privada burguesa e do proletariado, as experiências da classe operária na luta de classes, o grande conhecimento acumulado sobre as ciências naturais graças ao desenvolvimento das forças produtivas etc.). Eis a relação entre a superestrutura e a estrutura e a relação entre o ser social e a consciência social.

* Baseado no Manual Materialismo histórico, Academia de Ciências da União Soviética, 1951.

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