Manifestação pró Evo Morales em La Paz
A radicalização da burguesia compradora e dos latifundiários nos departamentos da autodenominada Meia Lua — Santa Cruz, Beni, Tarija e Pando — começou com a tomada violenta de instituições estatais. Por sua vez, o governo convocou a população e fundamentalmente aos grupos corporativos que consegue manejar para defender a democracia contra o "golpe de Estado cívico-prefeitural" (como o governo denominou as medidas tomada pela Meia Lua) produzindo-se enfrentamentos entre adeptos do MAS e grupos de choque das prefeituras e comitês cívicos, até desembocar no massacre de camponeses no departamento de Pando, cometido por sicarios que obedecem as ordens do poder gamonal-latifundiário desse departamento. Este fato serviu para o governo retomar a iniciativa e conseguir o respaldo internacional e instaurar o Estado de sítio no mencionado departamento.
Apesar de ainda não haver dados finais relativos à quantidade de mortos no massacre, segundo fontes oficiais, o número está entre 10 e 14 mortos. Também não se tem o número exato de desaparecidos; algumas fontes falam em 50, outras em 100 desaparecidos. É claro que em Porvenir se realizou um massacre contra os camponeses e não um enfrentamento como querem fazer crer os apaniguados dos latifundiários. Governo e oposição se lançaram em uma campanha de acusações, na qual, finalmente, relegam o papel das massas neste conflito. As mesmas massas que suportam a opressão dos grandes latifundiários.
A conjuntura mostra que o problema da terra não foi resolvido, e se estende por todo o país. Há dois meses o governo declarou Pando um "territorio livre do latifundio", mas a realidade mostra que em Pando sobrevive a semifeudalidade, expressa no poder gamonal à base da propriedade da terra e da servidão a que estão submetidas as massas camponesas. Não é por acaso que deram o nome de "Cacique" a Leopoldo Fernández, que até pouco tempo era prefeito (governador) deste departamento e agora está detido na prisão de São Pedro, em La Paz. Ele é um dos donos de grandes extensões de terras e está acostumado a manejar a política departamental como seu feudo, submetendo aos que se opuserem. Esta é mais uma manifestação do poder gamonal neste departamento.
Em Pando, há famílias que ostentam o poder pela possessão de grandes extensões de terra (famílias como: Sonneschein, Hecker, Becerra Roca, Vaca Roca, Vargas Rivera, Peñaranda, Barbery Paz, Claure e Villavicencio Amuruz, que concentram a maior quantidade de terras. Elas oscilam entre 12.782 e 290.197 de hectares [Dados do INRA publicados no jornal La Razón, 21 de setembro de 2008, Págs. A16] e desta forma administram as instituições estatais e regionais. Ao lado do poder gamonal, existem relações de servidão com as comunidades que vivem dentro das terras dos latifundiários e que estão submetidas ao trabalho gratuito ou outras formas de prestação que incluem o pagamento de diárias. Estas são características claras da semifeudalidade, que enquanto não forem eliminadas por completo, o problema da terra não será resolvido e as disputas e abusos por parte dos latifundiários (empresários exportadores de castanha, principalmente) sobre os camponeses será contínua, independente da distribuição de terra que o governo propor. A única forma de eliminar a semifeudalidade, a servidão e o poder gamonal-latifundiário é mediante uma transformação radical da sociedade atual, algo que o governo reformista do MAS não busca fazer.
A negociação
O governo soube capitalizar o massacre em Cobija, aparecendo como vítima ante a opinião pública nacional e internacional, conseguindo colocar os representantes do poder gamonal-latifundiário e da burguesia compradora, os prefeitos da Meia Lua — a mesa de negociações, onde o governo busca impor a aprovação de seu projeto de constituição política, reflexo do programa da burguesia burocrática.
A investigação e o julgamento pelos crimes ocorridos em Pando está nas mãos do poder judiciário, organismo que padece da secular enfermidade da corrupção, nepotismo, tráfico de influência e todos os males que possamos imaginar. Enquanto os familiares das vítimas e a população em geral vem realizando várias marchas exigindo justiça, o poder judiciário se embaraça em mesquinharias jurídicas, que servem apenas para estender o processo.
Duvidamos seriamente que a justiça deste ou de outro governo possa dar solução a estes fatos. Apenas em um verdadeiro governo popular, onde o povo possua o controle do Estado, é que haverá uma justiça popular.