Imperialismo ianque e gerente Luís Inácio atuam juntos para transformar o Haiti numa plataforma de exportação de artigos produzidos com mão-de-obra escrava e semi-escrava. Enquanto isso, a resistência popular é massacrada com o respaldo da ONU.
A ocupação militar no Haiti, liderada pelo governo do gerente Luiz Inácio, segue massacrando a população do país caribenho. Segundo organizações de "direitos humanos", inúmeras pessoas foram assassinadas e feridas pelos capacetes azuis da Minustah (Missão para Estabilização do Haiti da ONU, na sigla em francês), a partir de 2004. Desde então foram registrados massacres, torturas, estupros e outras agressões contra a população civil, sobretudo nas favelas.
O episódio mais violento foi registrado em 6 de julho de 2005, quando as forças da Minustah, com mais de 300 soldados, 18 tanques e pelo menos um helicóptero, realizou uma grande ofensiva em Cité Soleil. O alvo oficial era Dread Wilme, acusado de ser um líder de gangues. Evidências coletadas por diversos investigadores logo após a ação indicam que a Minustah foi protagonista de um enorme massacre. Dois dias depois, o general Augusto Heleno Ribeiro Pereira e o coronel Jacques Morneau afirmaram que desconheciam acidentes com civis e caracterizaram a operação como um sucesso. O coronel Morneau levantou a hipótese de que as mortes foram obra das gangues. No entanto, as provas coletadas contradizem esta afirmação e indicam que a Minustah, incluindo soldados situados no helicóptero, atiraram em civis desarmados, dentro de suas casas, destruindo-as. Cerca de 60 corpos foram encontrados.
A Minustah — que atualmente conta com aproximadamente 8.800 efetivos, 6.800 soldados e 2.000 policiais — foi destacada pouco depois da derrubada do ex-presidente Jean-Bertrand Aristide em uma revolta armada em fevereiro de 2004. A força é formada por tropas dos seguintes países: Argentina, Benin, Bolívia, Brasil, Canadá, Chade, Chile, Croácia, França, Jordânia, Nepal, Paraguai, Peru, Portugal, Turquia e Uruguai. Com 1.200 homens, o Brasil é o país com o maior número de militares e vem liderando a missão desde 2004. Entretanto, não se tem notícia de que a situação tenha melhorado de lá pra cá.
O Haiti continua sendo o país mais pobre da América, onde 75% da população vive com menos de US$ 2 por dia e apenas a quarta parte das rodovias são pavimentadas. Com a guerra e os golpes de Estado, a indústria têxtil haitiana diminuiu cerca de 80%, mas ainda representa 10% do PIB e 68% das exportações do país. Falta energia elétrica todos os dias e cerca de 80% da população está desempregada. Pelas tabelas oficiais, uma costureira na capital, Porto Príncipe, deveria receber US$ 0,50 por hora, contra US$ 3,27 no Brasil e US$ 16,92 nos EUA.
Tropas colombianas no Haiti?
A novidade é que a Colômbia estuda enviar tropas para se juntar à Minustah, segundo noticiou o jornal colombiano El Espectador no final do ano passado. Como se sabe, as forças armadas colombianas, sob o comando do narco-presidente Álvaro Uribe, juntamente com os grupos paramilitares associados a grupos políticos de direita, estão envolvidas no assassinato de milhares de camponeses e ativistas.
No dia 25 de fevereiro de 2008 a Suprema Corte da Colômbia ordenou a prisão de dois senadores e dois deputados por entender que havia indícios de vínculos com grupos paramilitares. Os senadores Ciro Ramirez e Luiz Fernando Almario, do Partido Conservador Colombiano, e os deputados Dixon Tabasco e Pompillo Avedaño, do Partido Liberal Colombiano, se juntaram a outros 14 parlamentares na Penitenciária La Picota, em Bogotá, todos acusados de envolvimento com grupos paramilitares, que controlam determinadas comunidades, tiranizam a população local e negociam votos em períodos eleitorais. No total, são 63 congressistas envolvidos no escândalo da "para-política". A maioria desses políticos pertence à base de sustentação do presidente Álvaro Uribe.
Esses grupos paramilitares foram reunidos sob o comando de Carlos Castaño num grupo conhecido como Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC) e foram treinados e equipados durante décadas sob o pretexto de combater os traficantes de drogas que, segundo o USA e Uribe, têm como principais representantes no país sul-americano as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc-EP). Por outro lado, organizações populares e as próprias Farc-EP denunciam o presidente Álvaro Uribe e Washington como os maiores interessados no tráfico internacional de drogas e armas.
Esse é o tipo de gente que está cotada para reforçar as "forças de paz" no Haiti.
Interesses estrangeiros
Para além do discurso oficial da ONU, de que a Minustah é uma missão humanitária e blá-blá-blá, os fatos concretos apontam para uma intervenção em defesa da manutenção de interesses estrangeiros associados às classes dominantes locais. Prova disso é a declaração do comandante da Minustah, o general brasileiro Heleno Ribeiro Pereira, que diante de uma comissão parlamentar no Congresso Brasileiro afirmou sobre o USA, Canadá e França: "Estamos sob extrema pressão da comunidade internacional para usar a violência". Em 2004, em entrevista à Rádio Metrópole, o general afirmou: "Nós temos que matar os bandidos, não qualquer um, só os bandidos".
Bandidos, no caso, são aqueles que se opuseram e se opõem à ocupação de seu país por tropas estrangeiras. Do outro lado estão as classes dominantes haitianas, latifundiários e grandes burgueses, cerca de 3% da população, representada essencialmente pelos grandes empresários Reginald Boulos, Charles Henry Baker, Jean Claude Bajeux e Andre Apaid.
Os interesses estrangeiros são representados sobretudo pelo USA, país que sempre acompanhou com atenção os acontecimentos e exigiu a adequação do Haiti ao receituário imperialista, subordinado aos organismos dos banqueiros internacionais. O objetivo era garantir o controle de um país estrategicamente situado entre Cuba e Venezuela. Além disso, é interessante para o governo estadunidense a criação de mais um pólo de indústrias maquiladoras, onde corporações como Nike e Adidas possam produzir seus artigos esportivos pagando um salário de fome aos trabalhadores.
— Pagam salários baixíssimos aos funcionários, que trabalham em verdadeiros campos de concentração, extremamente militarizados, para exportar produtos a preços irrisórios para o USA — denunciou Sandra Maria Quintela Lopes ao AND. Economista, formada na Universidade Federal de Alagoas e pós-graduada na Universidade de Bremen, na Alemanha, além de mestre pela Coppe (UFRJ), Sandra trabalha na Rede Jubileu Sul, entidade que luta para provar a ilegitimidade das dívidas externas e internas dos países do Hemisfério Sul. Em 2005, ela esteve em Porto Príncipe pela Missão Internacional de Investigação e Solidariedade ao Haiti.
O sub-imperialismo brasileiro
Além do imperialismo ianque, empresas brasileiras também estão se aproveitando da situação miserável a que vem sendo submetido o povo haitiano. A Construtora OAS, empresa envolvida no consórcio Linha Amarela, acusada de causar o famoso buraco do metrô, em São Paulo, que matou sete pessoas, obteve licitação de uma rodovia no Haiti por US$ 145 milhões.
Além da OAS, a empresa da família do vice-presidente brasileiro, José de Alencar, está prestes a se instalar no Haiti. A Companhia de Tecidos Norte de Minas (Coteminas) pretende utilizar o país como plataforma de exportação para o USA, aproveitando-se do Tratado de Livre Comércio (TLC) com tarifa zero entre Caribe e EUA para fugir da taxa média de 17% imposta às exportações têxteis brasileiras. Para tanto, deve convencer o congresso ianque a alterar o Hope ("Haiti Hemispheric Oportunity Trough Partnership Encourajement", cuja sigla em inglês ironicamente significa "esperança"). Criado quase junto à ocupação da Minustah, segundo o Hope, a cada 1m² de roupa feita com tecido estrangeiro para exportação ao USA, o Haiti deve usar 3m² de tecido local, do USA, ou de países que têm TLCs com os EUA.
Em 2007 a Coteminas já havia aprovado a instalação de um moinho têxtil na República Dominicana, com capacidade de produção estimada em 40 milhões de metros quadrados de jeans, para corte e confecção no Haiti, e estuda a instalação de outras fábricas na América Central e Caribe. Devido à ocupação do Haiti pela Minustah, a empresa defende ainda que os USA conceda ao Brasil, apenas no caso do Haiti, o mesmo tratamento dado a países com TLCs. Em entrevista ao jornal Valor Econômico, o atual presidente da Coteminas Josué Gomes da Silva, filho do vice-presidente da República, afirmou que "O Brasil é um reconhecido colaborador do processo de resgatar o Haiti. O país tem o direito de pleitear um tratamento preferencial".
Diante do monumental massacre imposto ao povo haitiano, Rachel Beauvoir Dominique, antropóloga, pesquisadora e professora da Universidade do Haiti, percorreu onze países para denunciar: "essa missão não é para a ajuda tão necessária ao Haiti, como na saúde, na educação e nos elementos de desenvolvimento de um povo. É uma missão de dominação porque a população dos bairros populares são atacadas, mortos". A antropóloga enfatizou a influência do USA e lamentou a ingerência do gerente Luíz Inácio em seu país:
— A embaixada americana tem uma presença enorme na política do Haiti. A embaixada americana e a embaixadora, pessoalmente, durante as seções legislativas, está presente. Assim também, nos vários ministérios, a presença da União Européia. É trágico, para nós, que a Minustah e a ONU, atualmente vimos isso muito claramente, até Kofi Hanan, são dirigidas por poderes econômicos. Estes mandam nas forças políticas e as forças políticas nos militares. Por isso, pensamos que é uma tragédia que o presidente Lula da Silva ofereça-se a essa farsa e permita aos poderes econômicos, capitalistas e imperialistas disfarçar-se de tropas brasileiras, matando o povo.
Por fim, cabe lembrar que no século XVIII, o Haiti se torna a mais próspera das colônias francesas graças aos povos africanos escravizados, que produziam açúcar, cacau e café. Logo o Haiti se torna o primeiro país latino-americano a se tornar independente, e o fez de modo muito especial. A partir de 1791, o povo negro e mulato escravizado promove sucessivas revoltas contra o exército francês, que garantia a permanência da exploração colonialista. Em 1804, o ex-escravo Toussaint Louverture lidera a revolução que tornará o país livre pela força do povo, diferentemente dos processos de independência vistos em outras nações, geralmente comandados pela burguesia. O massacre contra o povo haitiano tem entre seus objetivos inibir a força do exemplo, como assinala a economista Sandra Maria Quintela Lopes:
— Os haitianos são extremamente combativos, determinados. É preciso lembrar que o Haiti foi o primeiro país latino-americano a se tornar independente. E um detalhe muito importante: pelas mãos dos escravos. Não foi uma revolução crioula ou burguesa, foi uma revolução de escravos negros. Então, o imperialismo precisa acabar, destruir, apagar a memória desse povo combativo. Outro ponto que identificamos é o treinamento de soldados no Haiti para depois serem usados nas favelas brasileiras. Nós reparamos que os mesmos soldados que ocuparam os morros da Mangueira e da Providência, em março do ano passado, estiveram servindo no Haiti. As ruas são muito parecidas, são estreitas. Este ponto está de acordo com o que o USA quer para os países do Hemisfério Sul: que as Forças Armadas exerçam apenas a função de polícia…