Opiniões – 34

Opiniões – 34

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Quem são os bandidos

Amigos do AND.

É com muita satisfação que envio esta carta. Sou leitor do jornal há algum tempo. Recebo os exemplares de companheiros da LCP e gosto muito quando chega um jornal novo. Envio um relato da situação de Jacinópolis para que coloquem na seção de cartas.

O jornal Folha de Rondônia traz como principal manchete que a LCP está aterrorizando Jacinópolis. Tenta impingir que o povo e todo o estado estão contra a Liga dos Camponeses Pobres, mas, na verdade, tudo o que existe em Jacinópolis foi o povo e a Liga que fizeram.

O Ibama e o Ministério Público, juntamente com outras instâncias da chamada justiça, vêm mostrando seu desrespeito para com os pais de família e cidadãos trabalhadores de Jacinópolis, inventando que aqui tem grupos de guerrilha, bandidos e baderneiros. Mas não vê que em Jacinópolis falta estrada, escola, saúde, transporte e assistência à agricultura.

Enquanto o povo de Jacinópolis está trabalhando, a polícia de Buritis dá suporte a fazendeiros que são os verdadeiros grileiros de terras da União.

Na região vizinha, Campo Novo, que tem mais de 20 anos, as terras ainda não foram regularizadas. As famílias não têm acesso aos direitos "assegurados" pela chamada reforma agrária, como os créditos de fomento e moradia. Não podem requerer auxílio maternidade, auxílio doença, aposentadoria por invalidez, por idade e outros. Em nossa região é muito comum idosos em idade de aposentadoria viverem sem qualquer assistência do Estado. Após terem trabalhado a vida toda, ainda são tratados como baderneiros e bandidos.

Também temos outras cidades vizinhas, como Buritis, Rio Pardo e Minas Novas. Buritis também foi palco de grandes tomadas de terra e hoje abriga mais de 40 mil habitantes na cidade e nas linhas. Rio Pardo e Minas Novas também têm 10 anos de luta e trabalho, todos os anos seus habitantes sofrem ameaças de expulsão à base de ações aterrorizantes; um total desrespeito com as famílias que ali estão. São mais de oito mil habitantes que vem trabalhando e produzindo alimentos para sua sobrevivência.

Esta pressão exercida pelo Ministério Público, Ibama, Incra, Poder Judiciário, Polícia Ambiental. Até a Sucam faz o trabalho de investigação nas áreas com objetivo de entregar as terras para fazendeiros e criação de reservas para os norte-americanos, como forma de pagamento pelo financiamento de suas campanhas eleitorais e negando o direito da própria nação às suas terras.

O Estado, com seu bando armado promoveu em julho do ano passado, em Jacinópolis, um cerco de violência e truculência, assustando o povo, prendendo caminhões e tratores, quebrando serrarias, roubando motores e madeiras dos pátios. O povo sabe que entre os pobres não estão os bandidos. O Estado procura impor mais um massacre na história do país. Mas nós, que trabalhamos, não vamos nos intimidar com ameaças. Mais do que nunca, estamos conscientes de quem são os nossos companheiros e de que não adianta mais: agora o povo deve fazer a sua própria segurança.

O Estado só tem massacrado o povo pobre, negado os direitos do cidadão e a dignidade de sobreviver. Sabemos que terras existem, mas estão sob negociação com os países imperialistas, principalmente o USA.(…)

Um abraço a todos.

Derci Francisco Sales
Jacinópolis – Rondônia

Nota da redação – Depois de 14 de fevereiro, dia em que enviou esta carta, Derci foi preso e torturado pela polícia de Rondônia, sendo solto vários dias depois.


Como pode?

No dia 16 de março, Lula disse que seus ministros são heróis por trabalharem com vencimentos de R$ 8.400,00. Já no dia 20, o mais ignorante dos "presidentes" do Brasil cometeu outro discurso, onde chamava os usineiros de álcool de "heróis nacionais e mundiais".

Ora, quanto aos ministros, o Sr. Lula precisa ser informado de que R$ 8.400,00 é mais de 22 vezes o salário mínimo, salário a que o mesmo Lula condenou o brasileiro a viver.

Quanto aos usineiros, desde o início da colonização do país, em 1530, representam a classe mais retrógrada e reacionária do Brasil. Hoje, além de explorarem os camponeses com relações semifeudais, entregarem terras para as corporações estrangeiras etc., ainda recebem inúmeros subsídios do governo desde o Proalcool.

Mas, chegará o dia em que essas pessoas, com o Sr. Lula à cabeça, perceberão quem realmente são os heróis nacionais. Aí será tarde, porque o povo que hoje já se levanta aqui e ali, se erguerá no seu real tamanho para libertar o país e varrer essa corja que pensa que governa o Brasil.

Viva o povo brasileiro!

Airton Pereira da Silva
Salvador, BA


Política em três tempos

Paulo Queiroz
(por e-mail)

1 – Sem-terra sem sorte

(…)o agricultor Geraldo Pereira dos Santos, 43 anos (…), não é o que se pode chamar de um sujeito de sorte. Mas é, em boa medida, por conta da força emblemática do que lhe sucedeu por estes dias, que se justificam iniciativas como o Ato Público Contra a Criminalização do Movimento Camponês (…) No entanto, as atribulações recentes que lhe sobrevieram encerram bem uma síntese de tudo quanto move o Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos (Cebraspo) (…)

O Cebraspo, no seu propósito maior de "defender de forma intransigente e inarredável os direitos do povo brasileiro" (aqui entendido, o segmento mais absolutamente destituído da população), vem erguendo barricadas contra a opressão onde quer que enxergue uma iniqüidade. Por aqui, o ato em questão foi organizado para denunciar a forma como a imprensa nativa vem abordando os movimentos locais dos agricultores sem terra, com foco numa reportagem publicada pelo jornal Folha de Rondônia sobre a região de Jacinópolis (cerca de 370 quilômetros de Porto Velho), onde os integrantes da Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia (LCP) acampados no local são tratados como "invasores, baderneiros e bandidos". (…)

2 – Cotia incriminadora

Mas o que tem Geraldo Pereira a ver com isso? Tudo, leitor, tudo. A começar pelo fato de que, enquanto os sem-terra de Jacinópolis ainda estejam organizados em torno de uma LCP que lhes sirva de trincheira e contem com a presteza de um Cebraspo que lhes socorra como caixa de ressonância, aquele lá nem coisa nem lousa. Igualmente acampado há anos a espera de que as autoridades lhe providenciem o ansiado assentamento, Pereira é o cabeça de uma das 257 famílias que, com sua mesma expectativa, vivem no acampamento "Flor do Amazonas", na Fazenda Urupá (cerca de 50 quilômetros de Porto Velho), em Candeias do Jamari.

(…)Sua família (mulher e filho) também sobrevive com a ajuda de uma cesta básica distribuída mensalmente pelo governo federal, contendo apenas arroz, feijão, óleo, macarrão, café e açúcar. A falta de recursos com que comprar uma "mistura", a solução é caçar ou pescar. Pois bem. No dia 17 passado (março), a Polícia Ambiental (…) prendeu Geraldo Pereira, recolhendo-o ao (…) sinistro "Urso Branco". Junto com o agricultor foram apreendidas uma espingarda, a munição e uma panela (…)que cozinhava uma cotia.

(…) Réu primário, sem quaisquer antecedentes que pudessem comprometer-lhe a conduta, foi libertado pela Justiça no dia 27, mas vai responder a processo por crime ambiental e porte ilegal de arma. (…)

3 – Notícias enquadradas

(…) De caso mais do que pensado, salvo exceções que confirmam a regra, a imprensa embarca resolutamente nestes discursos (…) O que implica em consequências cruciais, pois os veículos que postulam representar a "esfera pública", na verdade, são agentes do sistema e das classes sociais que o dominam.

Estas, desse modo, tratam de eleger o foco dos processos de criminalização pela imprensa conforme este ou aquele segmento esteja representando a ameaça mais concreta da hora às fontes dos seus privilégios, patrimônios, poder e controle da sociedade. Não faz muito tempo, o alvo eram o movimento sindical urbano e suas incômodas greves, onde pululavam "baderneiros". Hoje, o saco de pancadas são os sem-terra. Na verdade, como adverte o Cebraspo, o objetivo de tais "matérias" é o de criar um ambiente de terror, estigmatizar a luta pela terra e legitimar ações de pistolagem comandadas por latifundiários.

Artigo publicado no sítio tudorondonia.com.br (04.04.07) e no jornal O Estadão, Porto Velho (05.03.07)

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