O líder do MST — Movimento dos Sem Terra — José Rainha, está preso na cadeia de Presidente Venceslau, na região do Pontal do Paranapanema, São Paulo. Entrevista, somente com a autorização do Juiz de Teodoro Sampaio, cidade onde o líder estava preso até o dia 7 de setembro, sábado, antes de ser transferido. No dia 12 a reportagem do jornal A Nova Democracia esteve na região do Pontal para conhecer a real situação dos líderes camponeses presos conforme decisão da Justiça.
Era o dia de visitas aos presos. Entre as dezenas de familiares que aguardavam a distribuição de senha, um grupo de sem terra para visitar José Rainha. Ao contrário da sua prisão no início do ano, nenhum político do PT, representante ou qualquer outro oportunista foi visto, neste momento de forte repressão ao movimento naquela região. Os trabalhadores estão sendo presos sem motivos, ou acusados de pequenos roubos. Os militantes, apesar de demonstrarem sua insatisfação e revolta pelas prisões arbitrárias e as perseguições aos dirigentes, estavam tranqüilos. Ao saírem da visita, disseram que José Rainha "está animado e sem nenhum abatimento".
A prisão
Sob a acusação de formação de quadrilha, José Rainha foi preso no dia cinco de setembro no Acampamento Che Guevara, no Pontal do Paranapanema. Ele foi obrigado a ficar na clandestinidade enquanto tentava, na Justiça, derrubar o mandado de prisão preventiva decretado pelo Juiz de Teodoro Sampaio. Outros quatro companheiros de José Rainha continuam na clandestinidade, enquanto mais três são mantidos presos pela mesma acusação feita a eles. Na mesma região do Pontal, outros oito camponeses pobres estão presos acusados de roubo de gado, por estranha coincidência, todos ativistas do movimento. Os que cantam a democracia brasileira em prosa e verso são os primeiros a tratar a questão social como caso de polícia. É claro que a tática de tratar a situação evoluiu — ficou refinada – de acordo com a estratégia da guerra de baixa intensidade, defendida por Margaret Tatcher e Bush pai, de desmoralizar, isolar e destruir.
Como age o oportunismo
Quando da prisão de José Rainha no início do ano muita gente boa correu para a porta da cadeia para ficar bem posicionado na frente dos refletores e dos flashes. Aquele era um bom episódio para pegar uma carona e aparecer na mídia. Agora com o horário eleitoral gratuito e com sua candidatura a presidente nas cabeças, graças a todo o tipo de compromisso com a classe dominante, o PT quer distância de José Rainha e talvez até torça para que ele fique de molho mais um tempo.
Nenhum segundo do horário eleitoral gratuito foi desperdiçado para denunciar a arbitrariedade da prisão de Rainha. Nada contra a justiça do latifúndio, ao invés da denúncia política…conselhos.
Indagado por um jornalista sobre qual a posição do PT sobre a prisão de José Rainha, o seu presidente José Dirceu retrucou que ele tinha advogado para fazer a sua defesa e que se por acaso houvesse algum abuso de autoridade esta seria denunciada. Por outro lado, seu esforçado advogado, Luiz Eduardo Greenhalg, talvez cansado pelo esforço da campanha eleitoral e diante de mais este estorvo, declarou à imprensa que "Já disse para ele (Rainha) não voltar para lá, se ele voltar logo virá outra preventiva" e emendou "Não há local pior, para quem quer se esconder, ficar num assentamento onde as pessoas entram e saem o tempo todo".
Dois pesos e duas medidas
A ação do Estado através da polícia, da Justiça e da burocracia quando se trata dos latifundiários, seus agentes e jagunços é totalmente diferente. Por exemplo, como foi o procedimento em relação à ocupação da fazenda Santa Fé, no sábado, sete de setembro como parte das atividades do movimento para aquele dia. Segundo a reportagem do jornal Folha do dia 11 de setembro, o inquérito sobre o tiroteio dos fazendeiros contra os camponeses acampados omitiu o nome do neto do fazendeiro, ele e avô continuam soltos assim como o prefeito de Sandovalina, Divaldo Pereira de Oliveira. Testemunhas apontam-no como participante do tiroteio e o movimento acusa-o, ainda, de ter forjado os tiros contra sua casa no dia seguinte para esconder a sua atuação no episódio da fazenda Santa Fé.
O PSDB cria seu MST
Tendo como guia a política de favorecimento do latifúndio, por um lado, e por outro o clientelismo eleitoreiro, o ITESP (Instituto de Terras do Estado de São Paulo), aproveitando-se também das contradições no seio do movimento dos sem terra na região, criou o Mast – Movimento dos Agricultores Sem Terra – para, de forma burocrática e politiqueira, aliviar a tensão sobre os latifundiários grileiros, jogando camponeses pobres contra eles mesmos e suas lideranças.
Bancado pelo Governo do Estado, é o desdobramento do jogo teorizado pelos intelectuais agrários do PSDB e que provocou o episódio que deu motivos para a Justiça impingir a acusação de formação de quadrilha aos dirigentes do MST do Pontal.
O ITESP insistia em colocar quatorze famílias do Mast no assentamento Guanamirim, em Euclides da Cunha, contra a vontade das quarenta e oito famílias do MST já selecionadas para o referido assentamento. Foi a imposição do ITESP que provocou o choque entre os camponeses pobres que, após o incidente que resultou na decretação da prisão dos dirigentes do movimento, voltaram a se reunir e chegaram a um acordo que possibilitou a saída de quatorze famílias do Mast para a entrada de outras quatorze, ficando o episódio resolvido entre os camponeses, inclusive com a lavratura de uma ata que mesmo inserida no processo não demoveu o Juiz de Teodoro Sampaio de manter presos os dirigentes dos camponeses.
Não é apenas o ITESP que desenvolve esta política de jogar camponeses contra camponeses. O INCRA também pratica o mesmo método. Tudo indica tratar-se de uma estratégia do governo dos latifundiários. No Noroeste do Paraná, Marli Brambila, da coordenação do MST, acusa o Incra de ser responsável pelos confrontos entre camponeses nos assentamentos Santo Ângelo e Sebastião Camargo Filho. Neste caso, a PM agiu com presteza e sem demora e prendeu os participantes dos dois lados. Mais uma vez o rio é culpado pela correnteza e não as margens que o oprimem: o Juiz de Teodoro Sampaio, baseado "Juris Futuristicus", argumentou, ao negar o relaxamento da prisão, que Rainha poderia fazer tudo de novo.
As contradições
Os integrantes que visitaram José Rainha, antes de saírem para comprar frutas, doce e jornais para o companheiro preso, falaram para a nossa reportagem. Denunciaram as armações do ITESP, e opinaram sobre as contradições entre os camponeses, sobre o preço do feijão que está por volta de R$ 65,00 a saca de 60 quilos e a mandioca que não tem preço, já que R$ 22,00 por tonelada, não compensa nem o trabalho de arrancar, quanto mais o de plantar, reclamam. Anunciaram ainda seus planos em relação à despolpadeira da Cooperativa e o plantio de mamão papaia.
De Presidente Venceslau a reportagem do jornal AND seguiu para Teodoro Sampaio, onde está a casa de José Rainha. Lá, encontramos Diolinda, sua esposa e Carlos Rainha, seu irmão e concludente do curso de Direito em Presidente Prudente, que naquele momento retornava do Fórum trazendo consigo mais uma negativa do Juiz para o pedido de soltura dos dirigentes do movimento.
Com a filha mais nova no colo Diolinda, apesar de no primeiro momento demonstrar desapontamento pela decisão judicial, momentaneamente recuperou a firmeza, demonstrando a confiança de que logo o Zé e os seus companheiros estarão livres.