A gerência FMI-PT, o oligopólio dos meios de comunicação que opera no Brasil e o patronato nacional estão empenhados — e afinados — em mais uma campanha orquestrada contra o povo trabalhador. Trata-se da ladainha segundo a qual está sobrando empregos com carteira assinada no país e o que estaria faltando mesmo é gente capaz de desempenhar com competência as funções próprias destes postos de trabalho.
Seria apenas um deboche, se não fosse um triplo embuste. Em primeiro lugar, porque tentam fazer o povo brasileiro acreditar que ele próprio é o culpado pelo desemprego e pelo subemprego que o penalizam dia após dia, ano após ano. Na verdade, trata-se do exato contrário: desemprego e subemprego são duas das mais eficazes armas sistematicamente utilizadas pela burguesia contra os trabalhadores, desde que o capitalismo é capitalismo.
Em segundo lugar, esta farsa tem por objetivo diluir a luta de classes em palavras ocas, caras ao patronato explorador, como "especialização", "qualificação" e "treinamento". O ardil consiste em tentar fazer vistas grossas ao antagonismo entre a burguesia e o proletariado, a fim de substituir as lutas populares contra o capital pela adequação do povo às necessidades da produção capitalista. Tenta-se ainda trocar a possibilidade de uma educação política voltada para o trabalho emancipador por um sem número de cursos técnicos destinados a formar a mão-de-obra que o empresariado quer.
Por fim, a conversa fiada sobre a abundância de empregos e a escassez de trabalhadores dignos destes empregos remete a uma imagem tão curiosa quanto inverosímil, a do patrão solitário em sua fábrica novinha em folha, pronto para compartilhar as benesses do seu empreendimento com quem se esforçar para aprender direitinho o ofício. Mas a realidade é bem menos cor-de-rosa: enquanto se exige do trabalhador mais esforço, mais produtividade, mais qualificação — sob pena de, caso contrário, cair ou permanecer no limbo do desemprego —, o que a burguesia oferece em troca são salários baixos e menos direitos e garantias.
Além de tudo isso, chega a ser uma injúria ao povo brasileiro quando algum membro da administração Luiz Inácio, algum representante de entidades patronais ou algum jornalista pouco familiarizado com a gente comum, quando algum deles vai para a TV pedir às pessoas que arranjem tempo e dinheiro para investir na própria "reciclagem" profissional.
Assim, a burguesia apresenta ao trabalhador duas opções: ou ele se vira para competir com outros trabalhadores por um lugar na linha de montagem, ou é desqualificado, descartado, humilhado. Mas os trabalhadores sabem que a escolha é outra, e urgente. E é entre a rendição à vontade do capital ou a luta contra a exploração.
A propaganda picareta da burguesia
Na verdade, não é que os empregos estejam sobrando; trata-se de uma estratégia dos patrões para qualificar o exército industrial de reserva a fim de garantir que até mesmo os desempregados saibam manejar a moderna maquinaria industrial — maquinaria instrumentalizada para servir à lógica capitalista, de acordo com o objetivo último que o poder econômico atribui à ciência e à tecnologia: substituir o trabalhador.
Pode parecer uma ironia da história, mas é apenas fruto da concorrência e da acumulação de capital: o trabalhador substituído pela máquina — ou que não arranjou emprego por causa dela — é exortado a aprender sobre o manejo desta mesma máquina. A propaganda burguesa afirma que deve fazer isso para o seu próprio bem, para o de sua família e para sua sobrevivência profissional.
Mas a propaganda burguesa, além de simplesmente vender o peixe da burguesia, é mentirosa. E o povo sabe disso. Sabe que quando recebe ordens da burguesia para se "reciclar", o que ela quer de verdade é garantir seu poder de chantagem sobre aqueles que estão mal empregados em suas empresas, recebendo baixos salários graças à permanente ameaça com o olho da rua.
Uma certa quantidade de força de trabalho desempregada é uma característica do modo de produção capitalista e um trunfo na manga do patronato. A concorrência e a necessidade de acumulação de capital tendem a aumentar a demanda por produtividade, mas não necessariamente por mais gente trabalhando. Isto porque grande parte desta necessidade de maior produtividade é suprida pelo trabalho mecanizado. A quantidade de trabalhadores recrutada pelos patrões será, portanto, determinada pelo equilíbrio entre a demanda por maior produtividade e o quanto essa demanda pode ser suprida pelas novas tecnologias de produção.
O que sobrar, o que não for necessário, é o exército de reserva do trabalho, que é usado como massa de manobra — de chantagem mesmo — para minimizar os gastos com o trabalho humano e aumentar os lucros.
Sempre foi assim. A diferença no Brasil de hoje — o Brasil onde a burguesia agora exorta a força de trabalho a se "reciclar" — é que as elites perceberam que, com sua ganância e truculência, sequer se deram ao trabalho de garantir um exército industrial de reserva com formação técnica e profissional suficiente para permanecerem de prontidão, à mercê dos interesses do capital.
Agora tentam correr atrás do prejuízo, com sua infinidade de cursos técnicos e profissionalizantes, tão badalados e anunciados aos quatro ventos como a única saída para a população marginalizada.
Mas o prejuízo é dos inimigos do povo, não do povo, como tentam fazer crer. É da burguesia, que tenta reduzir a grandeza e a força do povo à mera força de trabalho, empregada ou desempregada, à serviço dos interesses do patronato. Os trabalhadores não podem se deixar seduzir pela propaganda enganosa dos empregos fáceis e abundantes. Não podem, e não deixam: eles sabem que são os protagonistas de um processo revolucionário que não pode ser minado pelas tentativas do poder econômico de "reciclar" o povo a seu bel-prazer.
Exploração não é um destino
Uma das principais divulgadoras da propaganda enganosa da burguesia e desta mais nova campanha de difamação contra os trabalhadores brasileiros é a Rede Globo. A emissora abraçou de forma entusiástica a mentira de que sobram empregos e falta um povo capaz, e usa todo seu aparato para fazê-la repercutir. Em seus telejornais e programas de entretenimento, faz isso como uma espécie de atualização da velha ladainha desde sempre repetida pelas elites brasileiras: a de que a culpa pelos infortúnios das massas é das próprias massas — que, segundo os difamadores, seria constituída por um povo indolente, desonesto e incapaz.
Desde abril de 2007 o programa dominical Fantástico, da Rede Globo, um dos mais assistidos da grade de programação da emissora, colocou no ar uma série chamada "Emprego de A a Z", concebida e levada a cabo para insultar os trabalhadores brasileiros. O primeiro programa da série, por exemplo, foi intitulado "A de Aumento". Nele, a Globo tentou minimizar diante de seus telespectadores a questão salarial — objeto de tantos embates dramáticos e históricos, entre patrões e trabalhadores ao longo da história do país — reduzindo-a a um escárnio. O responsável pelo texto da série escreveu:
"A maneira mais prática de pedir um aumento é chegar no chefe, encarar olho no olho, e dizer: ‘Chefe, eu quero, preciso e mereço um aumento de 20%’. Nesse momento, o chefe poderá ter uma de três reações: 1. Gargalhada; 2. O chefe dirá ‘Veja bem’. E dará uma longa explicação. 3. O chefe dirá: ‘Mas 20% é pouco. Por que não 40%?’ Essa reação, até hoje, só foi conseguida com cobaias, em testes científicos de laboratório. Na vida real, isso nunca aconteceu".
O responsável pela redação deste deboche para com o povo trabalhador é Max Gehringer, que os marqueteiros do programa Fantástico apresentam ao público como "o seu consultor particular de carreira". Nada mais apropriado aos propósitos da Globo de incitar a divisão e a competição entre os trabalhadores.
Assim, a primeira lição que o "consultor particular" tenta empurrar goela abaixo da população é que lugar de trabalhador explorado é na sala do chefe, implorando pequenas porcentagens de aumento sobre seu salário de miséria, e não nas assembléias, reuniões e outras formas de articulação coletiva legítimas, realmente comprometidas com os interesses das massas, que devem ir além das negociações pontuais e apostam na combatividade de todo o mundo do trabalho.
Fazendo bico na Rede Globo, Max Gehringer não é "o seu consultor particular de carreira"; ele é um gerente, um oportunista, um administrador dos interesses da classe dominante, reconhecido capataz, com enorme prestígio entre a burguesia nacional. Foi diretor de várias grandes empresas multinacionais, como a Pepsi e a Elma Chips. Em 1999 foi escolhido em uma pesquisa da Gazeta Mercantil como um dos "30 executivos mais cobiçados do mercado". Quando fala para o povo, fala em nome dos inimigos do povo, ainda que apareça na TV com pele de cordeiro.
Gehringer é o garoto-propaganda das elites para incitar os trabalhadores a procurarem se "reciclar". No episódio "F de Formação", ele aparece dizendo o seguinte:
"Na década de 60, um jovem precisava de 3.000 horas de estudo para conseguir um emprego, ganhando três salários-mínimos por mês. Hoje para conseguir o mesmo emprego ganhando os mesmos três salários-mínimos, um jovem precisa de 12.000 horas de estudo. Quatro vezes mais tempo estudando, para ganhar a mesma coisa. Isso é justo? Isso é a realidade do mercado de trabalho".
É preciso rejeitar e denunciar os trombeteiros da burguesia e sua insistência em dizer que a realidade de exploração é um destino que deve ser aceito, e não algo que precisa ser derrotado pela força revolucionária dos trabalhadores. Diante disso, não adianta desligar a TV. O que adianta é resistir, lutar contra esta propaganda.
Entre um 'plim-plim' e outro, mentiras
O deboche das Organizações Globo para com o povo brasileiro permeia todos os ramos dos seus negócios. O oportunista Max Gehringer costuma repetir o lema patronal da "reciclagem" também na rádio CBN, de propriedade da Globo. Há algum tempo o Jornal Nacional, carro-chefe do jornalismo da empresa, vem exibindo matérias nesse sentido no último bloco do programa, como a do dia 7 de novembro, na qual se dizia que "de cada quatro vagas abertas pelas fábricas para profissionais qualificados, uma não é preenchida". A campanha de desqualificação dos trabalhadores chegou também à internet. No sitio G1, da Globo, o alvo é a juventude, logo ela, maior vítima do desemprego: "A falta de interesse dos jovens em formação técnica faz sobrar vagas de trabalho no país".
Segundo a Rede Globo, o trabalhador brasileiro não vem sendo explorado, aviltado, usurpado em seus direitos e garantias, ganhando mal e trabalhando em condições ruins. Segundo o material audiovisual produzido por ela, o trabalhador brasileiro vem sendo é preguiçoso.
No último mês de agosto, a emissora chegou a dedicar uma edição inteira do Globo Repórter a essas provocações. "O Globo Repórter revela um Brasil onde sobram vagas e faltam trabalhadores", dizia a chamada do programa. Em um dos trechos, intitulado "agricultores que semeiam casas", contou-se a história de um camponês do interior do Rio Grande do Sul que precisou fazer um curso de pedreiro para construir sua própria casa, e que agora mantém esperanças de conseguir um emprego na construção civil:
"O operário Izael Fagundes faz parte da turma que vai receber o diploma de pedreiro. A cerimônia é na obra mesmo, lugar que representa o esforço dos mais de setenta aprendizes que já participaram do projeto. São beijos, famílias orgulhosas, gente saltitando. E, nas mãos, uma ferramenta a mais para construir o próprio destino".
Como se vê, não importa saber os motivos que levaram o camponês Izael a abandonar a vida no campo e ingressar no exército de reserva da construção civil, um setor conhecido pelo talento de seus gerentes e diretores para fazer às vezes de capatazes da peãozada, tratando-os na base da truculência e da chantagem.
Para a Rede Globo o que importa é realizar, assim, entre um "plim-plim" e outro, o sonho maior da burguesia: ver os trabalhadores sendo explorados com um sorriso no rosto. Mas assim como é uma farsa — além de uma afronta o ardil das elites de dizer que o povo não está à altura dos empregos que lhe jogam na cara, a maior parte do jornalismo da Rede Globo também é ficção. Ou será que os camponeses brasileiros comprometidos com sua própria liberdade trocariam de bom grado os esforços e a luta pela terra pelo chicote de um feitor vestido de empreiteiro?