Peruanos defendem a vida e dizem não ao Projeto Conga
No último mês, após cinco mortes, o governo decretou estado de emergência em Cajamarca e aprovou uma série de leis que criminalizam a luta popular. O povo peruano vem enfrentando a instalação de grandes mineradoras na região de Cajamarca e Celendín há quase uma década. A população grita “Conga, no va!” e não aceita o apoio governamental às mineradoras em detrimento de suas condições básicas de existência, já que as mineradoras ameaçam a água e a natureza da região.
No dia 12 de julho, manifestantes saíram às ruas em Lima, capital do país, para repetir os brados de “Conga, no va!” e “Há ouro, há cobre e o povo continua pobre”. Os manifestantes exigiam o cancelamento do Projeto de mineração Conga, em Cajamarca, o fim do estado de emergência na província, a liberdade para 15 presos durante as manifestações que ocorreram no início do mês e a punição dos responsáveis pelas cinco mortes de cajamarquinos, ocorridas durante as manifestações. Alguns manifestantes foram presos, acusados de pichar um dos monumentos da praça onde a manifestação era realizada.
Apesar do estado de emergência, o povo saiu massivamente às ruas em Chimbote, Bambamarca e Ica. Nessa última, cerca de mil trabalhadores chegaram a bloquear uma das estradas que dão acesso à cidade. Os manifestantes pediam a renúncia de Oscar Valdés, primeiro ministro e maior defensor do Projeto Conga no governo. Em Bambamarca, os protestos levaram mais de mil pessoas nos dias 11 e 12 de julho às ruas.
Em Cajamarca, as manifestações se repetem quase diariamente desde 21 de junho. Em 12 de julho, até mesmo o presidente da província saiu às ruas, enfrentando o estado de emergência. Mas, enquanto isso, o povo bloqueava uma via no povoado de Chota, resultando em 30 pessoas presas. Todos os comércios estavam fechados e mais de 10 mil pessoas protestavam contra o projeto Conga.
Estado de emergência, repressão e morte
O governo de Ollanta Humala não titubeou em criminalizar os protestos do povo cajamarquino. O estado de emergência entrou em vigor no último 28 de maio, restringindo o exercício dos direitos civis e políticos, tais como a liberdade de expressão, de reunião, de associação e principalmente a liberdade de protestar.
A polícia, os militares e os seguranças privados das empresas mineradoras vêm cometendo inúmeras violações de direitos humanos. Também foram aprovadas leis no Congresso que eximem a polícia de responsabilidade penal, permitindo-lhes a impunidade no uso de armas letais nos conflitos. Além disso, foram introduzidas mudanças no organograma do Poder Judiciário, criados juizados especiais em Chiclayo e Ica para julgar aos manifestantes contra a contaminação mineira.
Estudantes se uniram aos manifestantes no repúdio ao projeto
Mas não se podia duvidar da valentia do povo cajamarquino. Os protestos se sucederam em Celendín, Bambamarca e Hualgayoc e foram brutalmente reprimidos. Em Celendín, a prefeitura foi tomada pelos manifestantes no dia 4 de julho, quando a paralisação já contava 33 dias.
O aparato repressivo apelou para a maquinaria midiática reacionária, que para justificar o uso indiscriminado de armas de fogo pela polícia que já levou cinco vidas e deixou dezenas de feridos, saiu afirmando que a polícia não tinha alternativa, já que eram menos de cem policiais para enfrentar a três mil pessoas.
Além disso, prenderam a Marcos Arana, líder do Movimento “Terra e Liberdade”, que há vinte anos vem denunciando a proliferação dos projetos de mineração lesivos ao meio ambiente em Cajamarca. O dirigente foi agredido, torturado e insultado pelos policiais que o prenderam e sua advogada, Mirtha Vásquez, também foi insultada.
Humala e os meios de comunicação afirmam que os moradores de Cajamarca provocaram a polícia. Chegando ao cúmulo do cinismo, negaram o direito dos cajamarquinos de levar, durante o cortejo fúnebre de seus mártires, cartazes denunciando os assassinatos. O governo exigiu que o funeral fosse realizado sem conotações políticas quando as mortes tiveram uma profunda raíz política e econômica, conectada com os interesses da transnacional Newmont. Ollanta Humala, que se enfeitava com o rótulo de esquerdista, impõe o projeto de mineração Conga a sangue e fogo.
Protestos do povo cajamarquino
Durante estes anos de devastação pelas mineradoras, o povo cajamarquino vem resistindo aos golpes das transnacionais. Em fevereiro, houve uma marcha nacional pela água, saindo de Cajamarca até a capital, Lima. Nessa marcha, o povo identificou claramente às empresas Newmont e Buenaventura como suas inimigas.
As mortes destes cinco cajamarquinos encheram o povo de luto e dor. O povo está em luto regional por 30 dias, desde 4 de julho. O pároco Antonio Sáenz, que esteve presente em muitos dos funerais dos mártires, afirmou, em seu sermão: “o governo respeita o ouro e não a vida”.
Agora o governo peruano tenta apelar à conhecida teoria de resolução dos conflitos, para ganhar tempo, desmobilizar o povo, confundir e cooptar os moradores. A igreja e a Defensoria do Povo do Peru se proclamaram instâncias mediadoras dos conflitos; diálogo que sempre foi recusado pelo governo.
Um pouco de história
A história peruana sempre esteve ligada fortemente à mineração. Na última década, os governos dos gerentes Toledo, García y Humala, não foram a exceção e cumpriram a tarefa de aprofundar a mineração nas cidades de Ancash, La Libertad, Lambayeque, Tumbes, Piura, Cajamarca, Tacna, Huancavelica, Moquegua, Junín e Cerro de Pasco, etc.
O aumento da mineração não contamina só a água, mas gera uma concorrência pelo líquido em favor da mineração, ou melhor dizendo, dos lucros das transnacionais mineradoras. A concorrência é desleal porque essas empresas não pagam pela água e muito menos pelos danos ambientais gerados.
As transnacionais não se importam com as condições em que ficam a água, a terra e o ar para que a agricultura se mantenha viável. Também não se importam com as pessoas, camponeses, operários das minas, em muitos dos quais foi encontrada uma grande quantidade de chumbo e outros minerais no sangue. Além disso, pretende-se desalojar milhares de pessoas que vivem há décadas em espaços urbanos consolidados, pois já se sabe que debaixo das cidades de Cajamarca há veios de ouro, que já foram desenhados em projetos de mineração transnacionais.
A defesa dos interesses transnacionais que vão em detrimento da qualidade de vida de dezenas ou centenas de milhares de peruanos chega a tal ponto que nas esferas estatais se ignora em absoluto que os Estudos de Impacto Ambientais são, em geral, desfavoráveis à execução dos projetos, principalmente em Cajamarca e Celendín, onde agora querem executar o projeto de mineração chamado Conga.