A economia capitalista, em especial a do USA, se desmorona diante da atual crise mundial. Mais uma vez ficam evidentes muitas verdades sobre o capitalismo, tais como o livre mercado ou a livre concorrência não são mais que uma mera retórica ilusionista, que o capitalismo se edifica a partir de uma série de especulações capazes de converter as coisas, os gostos, os cheiros, os sabores em fetiches cujo valor de troca é determinado por Wall Street, entre outras coisas.
Por outro lado, a atual crise mundial também nos mostra descaradamente que o USA, o "centro" do mundo capitalista, longe de ser um Estado empreendedor baseado na democracia e em oferecer oportunidades a todos os indivíduos, como reza a velha e repetitiva propaganda ianque — escutada até no último canto do mundo — tira o porrete para aniquilar pessoa, organização política ou situação que comprometa sua posição hegemônica, sobretudo em tempos de crise, quando apela a um militarismo descoberto.
Diante das circunstâncias difíceis, era de se esperar que mais uma vez o imperialismo do USA apelaria para a velha política da "cenoura e do porrete", cuja marca registrada é ostentada pelo Partido Democrata ianque, agitada em mil conjunturas, em especial durante os governos dos supostos "paladinos da democracia": John F. Kennedy e James Carter.
Hoje, essa mesma velha política é levantada por Barack Obama, que seduz com uma "cenoura étnica" e com milhares de promessas de frear suas guerras e invasões ao invés da clara agressão imperialista. No entanto, cumpre ao pé da letra os planos estruturais do imperialismo ianque, particularmente com uma série de ameaças militares às nações oprimidas da América Latina.
Barack Obama, igual a todos seus antecessores na Casa Branca, não deixou de alardear sobre todo seu poderio bélico em diversas partes do mundo e frente ao colapso econômico mundial, pretende preservar a condição hegemônica ianque através do fortalecimento do militarismo, especialmente naquelas áreas geopoliticamente estratégicas, seu histórico "quintal".
Para tal sórdido motivo, não faltaram alcoviteiros do imperialismo que solícitos vêm acudindo a satrapia ianque, tais como Felipe Calderón do México, Álvaro Uribe da Colômbia e Alan García do Peru — com maior abjeção que outros governos. Estes governantes e Estados servis são os atuais esteios na logística armada para a reativação da Quarta Frota. Sem se envergonhar, transformaram o México, a Colômbia e o Peru, em bases de apoio dos quadros militares imperialistas na América Latina, a partir de planos sinistros como a iniciativa Mérida no México e na América Central, o Plano Colômbia — atualmente reciclado como Plano de Segurança Democrática — na Colômbia e o Plano Novos Horizontes no Peru e América Latina.
A presença militar ianque não é novidade na América Latina. Desde 1903 se instalou numa de suas principais bases militares em Guantánamo, situada a 920 km de Havana e a 643 km de Miami, no sul de Cuba, terra que pôde ser recuperada pelo Estado cubano. Esta base abrange uma área de 117,6 km², pela qual paga a irrisória quantia de US$ 4.000 anuais, depositados em um banco suíço, diante da negativa do Estado cubano de recebê-los. Atualmente Guantánamo está habitada por uma tropa de 500 soldados, 2 mil residentes civis, além de 395 prisioneiros de 40 nacionalidades diferentes, pois logo após os acontecimentos de setembro de 2001, esta base passou a ser também uma prisão e centro de torturas.
Barack Obama se comprometeu a fechar o centro de detenções, mas não a base militar que continua funcionando como campo de concentração. Apesar da retórica demagógica, este mandatário decidiu manter as comissões militares que julgam os prisioneiros acusados de terrorismo em Guantánamo.
Quarta frota intimida os mares
Uma das últimas agressões imperialistas ianques contra as nações latino-americanas foi a reativação da Quarta Frota pela marinha de guerra ianque, em julho de 2008. A Quarta frota foi criada em 1943 no fragor da Segunda Guerra Mundial, como um instrumento de controle do Atlântico Sul e foi dissolvida em 1950. Agora foi reativada para patrulhar — feito um guardião — pelos mares da América Latina e Caribe.
A importância geopolítica dos mares latino-americanos para o USA está marcada por algumas cifras contundentes. Por exemplo, 40% do comércio exterior ianque e 50% de suas importações petrolíferas costumam transitar pelos mares da América do Sul(1). Além disso, 34% do petróleo que o USA importa é de origem latino-americana, ao que deve se somar a obsessiva pretensão de controlar os recursos naturais e estratégicos da região, bem como garantir uma área segura para seus investimentos e mercadorias. Pois adicionalmente nesta região do mundo existem importantes reservas de petróleo, como as encontradas recentemente no Brasil, gás, água, minerais, além da presença de 900 milhões de habitantes nesta região que não deixa de ser um mercado atrativo.
A reativação da Quarta frota é uma alternativa que permite à marinha do USA operar militarmente com auto-suficiência, ante a eventual negativa dos países latino-americanos de permitir a instalação de bases militares ianques, como já vem ocorrendo com o Equador, que se negou a continuidade do USA na base de Manta.
A Quarta Frota tem sua base principal na cidade de Mayport, na Flórida, e está dirigida pelo chamado Comando Sul do USA, em Miami. Na América Latina, 4 navios de guerra do USA operam em suspeitas ações anti-drogas, como também a Força Tarefa do Porta-Aviões George Washington e o U. S. Boxer. A marinha ianque tem entre 10 e 15 navios na América Latina por dia, com 5 a 7 mil militares, 1 porta-aviões do tipo Nimitz, com um deslocamento de até 104 mil toneladas de carga máxima, cujo convés tem 333 metros de comprimento e 76,8 metros de largura; conta com 2 reatores nucleares, cuja velocidade pode chegar a 56km/h, com a capacidade de 90 aviões de guerra. O próximo porta-aviões, o U.S. Gerald Ford terá tecnologia Stealth que é invisível aos radares e armas eletromagnéticas.
A Quarta Frota navega liderada pelo porta-aviões nuclear George Washington, está equipada com submarinos, fragatas porta-mísseis, sistema de defesa aéreo, dúzias de aviões bombardeiros F-14, lançadores de mísseis como os que arrasaram o Iraque e o Afeganistão, além de contar com um grupo de comandos de elite SEAL (Sea, Air, Land / Mar, Ar e Terra).
A evidente ação intimidatória e militarista sobre a região não fica só na reativação da Quarta Frota, estando também baseada em certos acordos com Estados — abertamente títeres — para instalar bases de apoio que servirão de zonas de descanso e treinamento para seus comandos, bem como de abastecimento e víveres. Nesse marco, se inscrevem o Plano Peru, Novos Horizontes, o Plano Colômbia, a iniciativa Mérida, o assentamento de bases militares em El Salvador, Honduras e Paraguai.
Plano Peru e Novos Horizontes
Em 2006, estava a ponto de ser aprovado, entre o Peru e o USA, o Tratado de Livre Comércio (TLC). Através dele não só iam realizar acordos estritamente comerciais, como também clandestinamente fariam acordos militares. Logo, o acordo comercial de preferências alfandegárias (ATPDEA, sigla em inglês) entre o USA e os países da Comunidade Andina de Nações (Colômbia, Peru, Equador e Bolívia), já alojava algumas cláusulas referentes à repressão ao narcotráfico.
No entanto, o servilismo do Estado peruano não teria limites. Apesar do ambiente de oposição generalizado à assinatura deste tipo de tratado em grande parte da América Latina, terminou aceitando uma série de imposições. Para além de uma cooperação bilateral comercial que inclui realizar simples operações cívicas ou de luta contra o narcotráfico, o Estado peruano assumiu abertamente uma atitude entreguista e mercenária, que agora permite que tanto a Quarta Frota como os comandos ianques do plano "Novos Horizontes" ingressem no Peru à vontade para monitorar os países vizinhos e também para se abastecer de combustíveis, alimentação, víveres e sexo.
Para isso, o Congresso peruano aprovou a autorização do Exército Combinado de Treinamento Conjunto e de Ação Cívica Humanitária denominado "Novos Horizontes" no ano de 2006. A partir disso o governo de Alan García solicitou inúmeras vezes uma série de autorizações para que entrassem tropas, navios e aviões do USA em território peruano(2).
No mesmo ano o governo de García Perez decide modificar o artigo 5º da Lei nº27856, que corresponde à lei de requisitos para a autorização e consentimento para a entrada de tropas estrangeiras no território da República. Logo, através da Lei nº 28899, foi possível modificar e ampliar as "atividades de assistência cívicas, de planejamento de futuros exercícios militares, academias de instrução ou treinamento com o pessoal das Forças Armadas Peruanas ou para realizar visitas de coordenação ou de protocolo com autoridades militares ou com o Estado peruano".(3)
Estas mudanças legislativas permitiram "agilizar" as autorizações para a entrada militar ianque em território peruano, a ponto de encarregar operacionalmente esta tarefa só ao Ministério da Defesa. Inclusive, em atitude oprobriosa, cada vez mais as autorizações de ingresso não só permitem a entrada de pessoas, como também a de militares armados do USA .
Por outro lado, está evidente a intenção de instalar uma base ianque em Pichari, encravada nos vales dos rios Apurímac e Ene (VRAE), ação pretensiosa, porque sua intervenção é encoberta e maquiada pelas operações cívicas do Plano "Novos Horizontes".
Paralelamente, o Congresso peruano permitiu a entrada das forças militares do USA no Porto de Salaverry (cidade de Trujillo, norte do Peru) e no Porto de Callao. Além de existir intenções de se instalar uma base anti-droga ianque na região amazônica oriental de Loreto, zona de fronteira com a Colômbia, Equador e Brasil com vias de acesso fluviais à Venezuela.
Plano Colômbia
O plano For Peace, Prosperity and the Strengthening of the State — Plano para a paz, a prosperidade e o fortalecimento do Estado, mais conhecido como Plano Colômbia(4) surgiu em 1999, durante o governo de Andrés Pastrana.
Através deste Plano, o USA exerce sua geopolítica de dominação e agressão imperialista sobre a América Latina, instalando uma série de bases militares, fundamentalmente na região sul da Colômbia, local que facilita o monitoramento das ações do Estado venezuelano, assim como a permanente avaliação das jazidas de petróleo tanto colombianas como venezuelanas.
O pretexto da presença de narcotraficantes, guerrilheiros e delinquentes se mantém como argumento para o assentamento ianque em território colombiano, estendendo as ações do Plano Colômbia (hoje denominado pelo presidente Álvaro Uribe de Plano de Segurança Democrática), já não só as áreas rurais, incluindo agora as áreas urbanas e suburbanas.
Iniciativa Mérida ou Plano México
Utilizando também a mesma argúcia da luta contra as drogas e a delinquência, em especial às quadrilhas da América Central — denominadas maras — o Estado ianque invade o México, Belize, Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua, Panamá, República Dominicana e o Haiti, por meio da Iniciativa Mérida, iniciada em 2008.
Menciona-se que este plano não inclui a intervenção de tropas militares do USA, mas sim o financiamento milionário de ações repressivas e coordenadas entre estes países. Além disso, o fornecimento de helicópteros e tecnologia de ponta para o "combate ao crime organizado", como, por exemplo, o intercâmbio de impressões digitais de supostos criminosos de todos os países inseridos na chamada Iniciativa Mérida, bem como o emprego de sofisticados sistemas de radar, combinados a repressão com ações cívico-sociais no marco de uma política de guerra de baixa intensidade.
Dentro do grupo de países "colaboradores" desta Iniciativa, encontra-se o aparente governo anti-ianque de Daniel Ortega, que não teve nenhum ressentimento em firmar o acordo que permitia executar o Plano Mérida também em solo nicaraguense e se colocar sob a batuta dos artífices deste Plano, o governo do USA e o mexicano, sob a presidência de Felipe Calderón.
Mariscal Estigarribia no Paraguay
O militarismo ianque também está presente na estratégica zona do Chaco Paraguaio, mais especificamente no aeroporto Mariscal Estigarribia, na tríplice fronteira entre a Argentina, Brasil e Paraguai, desde 2003 com o consentimento dos governos dos mencionados países latino-americanos.
Novamente, o mesmo pretexto para se instalar nesta zona estratégica é a luta contra o terrorismo, o que permite monitorar estes três países. Encontra-se também próxima ao Sistema do Aquífero Guarani, uma das maiores reservas de água doce no mundo.
Em 1º de junho de 2005, o Congresso paraguaio celebrou um convênio com Washington para conceder que uma tropa de 500 militares ianques entrasse em território paraguaio durante 18 meses.
A presença militar do USA na América Latina se vê também reforçada com a vigência da tenebrosa Escola das Américas, que hoje funciona com o nome de Instituto de Cooperação e Segurança do Hemisfério Ocidental (WHINSEC), sua nova sede está situada em Fort Benning, Geórgia. Assim como outras bases militares em Honduras (Soto Cano/Palmerola), El Salvador (Comalapa) e a base militar de Vieques em Porto Rico.
Todas estas ações militares na América latina põem em manifesto alguns pontos:
1O caráter estratégico militar da América Latina para o USA, o contrário dessas vozes que manifestam que esta parte do mundo já não é mais tão atrativa para a maior potência imperialista do mundo.
2A colaboração de governos títeres latino-americanos para este plano, com a cobertura por parte dos Estados do México, Colômbia e Peru, nos quais não se escapam alguns governos supostamente anti-ianque como o da Nicarágua.
3A continuidade da política militarista, intervencionista e imperialista de Obama faz cair por terra todo seu sermão pseudo-democrático.
4A atual crise mundial do capitalismo tem proporcionado ao imperialismo ianque se desmascarar e adotar ações intervencionistas para garantir militarmente seu fluxo comercial e sua espoliação dos recursos naturais da América Latina.
Notas:
1 – Ver o Editorial AND 53
2 – Um registro detalhado das autorizações do ingresso de navios, tropas e aviões do USA no Peru, pode ser observado no hiperlink a seguir, http://mariategui.blogspot.com/2009/05/peru-plataforma-militar-multiuso-al.html
3 – Ibidem.
4 – Para maiores informações sobre o Plano Colômbia, veja em AND 52 o artigo: "60 anos de permanente "exceção" e aberta repressão na Colômbia".