A privatização é a meta a ser obtida a qualquer preço, sob a direção da dupla da rua K, em Washington: o Banco Mundial e o FMI |
Não se pode negar que privilégios colossais corroem o Brasil. Não é, porém, na Previdência Social que eles estão. E, como os beneficiários das absurdas disparidades controlam a política, a "reforma" da Previdência é perversamente usada para aumentá-las, em vez de corrigi-las. Grupos financeiros, não contentes com os mercados cativos de que desfrutam, querem as contribuições sociais dos servidores: daí o teto para a previdência pública. A privatização é a meta do estupro em andamento, a ser obtido a qualquer preço, sob a direção da dupla da rua K em Washington D.C., EUA: o Banco Mundial e o FMI.
A lógica do processo é sempre a mesma. A política econômica cria os déficits, abaixa a renda, dizima o emprego e faz aumentar a insatisfação. Isso serve de desculpa para extrair mais dinheiro dos que nada têm a ver com esses déficits. Quem se apropria dos recursos do país e os transfere para o exterior? Exatamente os que capitalizam a insatisfação para obter novas e desmedidas vantagens. Assim foi: 1) com as "privatizações", objeto de monumental corrupção; 2) para tirar do Estado a regulação das atividades econômicas, transferida para agências advogadas dos concentradores.
Então, chega de jatos de espessa fumaça sobre os nossos olhos. É verdade que temos graves problemas. Pior: a magnitude deles leva-nos à ruína. Mas a questão é não se deixar confundir a respeito da origem do mal. Em suma, desmontar a farsa. Eis um de seus scripts: 1) as tarifas dos serviços públicos privatizados, como telefones, energia elétrica, fornecimento de gás, etc., são elevadas seguidamente, conforme contratos ilegais que estipulam a indexação, terminantemente negada aos assalariados; 2) os oligopólios, quase todos nas mãos de transnacionais e suas matrizes estrangeiras, arbitram à vontade os preços dos produtos cujos mercados controlam. Em vez de remover as causas da inflação, o que faz a política econômica governada pela dupla da rua K e por banqueiros de Boston, Nova York e Londres? Sob o mentiroso pretexto de combate à inflação, mantém intoleráveis taxas de juros, as quais: a) já sugam 70% das receitas somadas da União, Estados e Municípios; b) servem de ponto de partida para que os bancos arranquem juros astronômicos de autônomos e assalariados, pequenas e médias empresas, inviabilizando-as.
Essas são as hemorragias que se têm de estancar urgentemente. Não há déficit da Previdência. Ademais, são tão pífias e discutíveis as economias que a "reforma" produziria, que não se pode considerar senão como farsantes os que pretendem enfocar a questão sob esse prisma. Há, ademais, o fito de desferir o golpe de misericórdia no serviço público do Brasil.
Mais notável é o eco que encontra na opinião a sustentação moral que o sistema de poder concentrador pretende dar à "reforma". Segundo a falaciosa campanha, ela reduziria injustiças, ao retirar privilégios de altos funcionários e oficiais superiores das Forças Armadas. Ora, os servidores públicos com maiores salários têm pleno direito à aposentadoria integral e às pensões, nada mais devendo pagar por esses "benefícios", pois estes têm sido pagos com sobras. Estabelecer limites de idade para a aposentadoria dos atuais servidores, mesmo que tenham contribuído por 35 anos, é discriminar contra os que começaram a trabalhar mais jovens, ou seja, os originários das camadas mais desfavorecidas. Acabar com a paridade entre ativos e inativos acelera a erosão dos proventos destes, já reduzidos, como os dos ativos, pela inflação acumulada e pela ausência de reajustes.
Para entender porque alguém crê na "reforma" emanada da rua K, há que atentar, ainda, para outra ação perversa dos concentradores. A política econômica aviltou tanto os rendimentos do trabalho, que muita gente pensa serem fantásticos os salários mensais acima de 4 ou 5 mil reais. Não cogitam de que 60% disso é consumido por impostos, taxas e contribuições, sem que, em troca, haja acesso a serviços públicos gratuitos, ou educação decente, pois o dinheiro vai para os encargos da dívida. Em resumo, o sistema de poder gerou miséria generalizada, e os poucos que ela ainda não assola são vistos como privilegiados, apesar de terem a vida sacrificada por dificuldades, quando não ceifada pela violência, sempre em alta, como os preços.
Este é um dos efeitos mais terríveis da dominação globalizante: a idéia de que a miséria é o natural, e a justiça consiste em tornar todos miseráveis. Mais espetacular é que as pessoas não se dêem conta da existência dos reais privilegiados. Esses residem no exterior, ou transitam entre fortalezas inexpugnáveis e ambientes inacessíveis. A mídia e os políticos amestrados encarregam-se de apresentá-los como benfeitores. Resultado: há ignorância sobre fatos como: 1) as 300 maiores empresas em atividade no Brasil têm receita líquida igual a 50% do PIB; 2) excetuada a Petrobrás, ainda não de todo privatizada, esses 300 grupos quase não pagam imposto de renda de pessoa jurídica, mágica que obtêm transferindo ao exterior, como despesas, o grosso de suas receitas; 3) a arrecadação do imposto de renda das pessoas físicas é maior do que a das jurídicas; 4) na destas, mais de 80% vêm das pequenas e médias empresas. A "reforma" tributária deixa tudo isso intocado.
Quando esses fatos são expostos a certas pessoas, elas denotam ainda mais seu temor aos concentradores e imaginam ser impossível limitar-lhes o poder. Muitas optam por dar de ombros à destruição do País, integrando, como cúmplices, a camada dos cooptados por vantagens equivalentes a milhões de dólares, migalhas comparadas aos trilhões dos potentados mundiais.