Recém empossado na gerência municipal, Eduardo Paes e seu secretariado inauguraram a nova gestão com uma intensa campanha de criminalização da pobreza e perseguição de trabalhadores informais, além da destruição de pequenos estabelecimentos comerciais e moradias ditas irregulares. O "choque de ordem", como anunciou o secretário municipal de ordem pública Rodrigo Bethlem, teria a suposta meta de "reeducar o povo carioca e devolver a legalidade ao espaço público". De acordo com Paes, a operação irá continuar até o fim do seu mandato.
Logo na primeira segunda-feira do ano (5), mais de 500 agentes de 10 instituições diferentes — entre elas a Guarda Municipal, a Coordenadoria de Recursos Urbanos, Vigilância Sanitária, Detran, Comlurb, polícias Civil e Militar — saíram do Maracanã e se dividiram em diversas equipes. Os principais alvos foram os bairros do Recreio, Copacabana, Ipanema, Maracanã, Vila Isabel e Tijuca.
Na praia de Copacabana, um escultor de areia teve seu material apreendido pelos agentes. Ao lado do morro do Cantagalo, na Rua Barão da Torre, os agentes apreenderam todo material de barraqueiros que moram no morro e trabalham na praia. Eram barracas e cadeiras de praia, além de grande quantidade de material para reciclagem. No Maracanã, uma blitz na Avenida Radial Oeste parou o trânsito na região. No trecho que vai da UERJ ao morro da Mangueira, moradores de rua foram recolhidos e comerciantes e taxistas tiveram seu material de trabalho confiscado pelos agentes.
Na orla do Recreio dos Bandeirantes, uma equipe da Prefeitura demoliu um prédio com 14 estabelecimentos comerciais e 18 apartamentos ditos irregulares. Foram demolidos uma padaria, uma igreja, um cyber café, bares, uma farmácia, além do condomínio que funcionava sobre o comércio. Em oito anos a edificação foi construída sem nenhum tipo de repressão. Depois de conquistada a estabilidade e referência da população local, principalmente da favela do Terreirão, que margeia a praia da Macumba, tudo foi levado abaixo por Eduardo Paes. Curiosamente a região é um dos mais cobiçados alvos da especulação imobiliária — construtoras milionárias que dominam a maior parte do litoral do Rio erguendo caríssimos prédios de luxo.
Duro golpe nos camelôs
Na quarta-feira (7), 92 pessoas que estavam dormindo nas ruas foram presas em abrigos. No Flamengo, 40 toneladas de material de barraqueiros e camelôs foram apreendidas pelos agentes.
A partir do domingo (11), o foco da operação passou a ser barraqueiros que trabalham na orla da zona Sul. Para evitar o deslocamento de material, os trabalhadores que vivem do comércio praiano usam kombis que ficavam regularmente estacionadas nas vagas da praia de Ipanema, mas que foram recolhidas pelos agentes.
— O que vai acontecer com a gente, se não podemos trabalhar? Por que o prefeito não dá um lugar para a gente parar o carro? Ele está vendo só o lado do bacana — protestou o trabalhador Wellington de Almeida, proprietário de um dos veículos apreendidos.
— Se a gente não puder trabalhar como vamos sustentar nossas famílias? Se roubar, vai preso. Eles têm que dar um jeito de nos deixar trabalhar — reclamou João Vieira da Silva, outro barraqueiro que depende da função para sobreviver.
Na terça-feira (13), mais agressões aos vendedores ambulantes. Em Ipanema outras 10 kombis foram rebocadas pela Secretaria Especial de Ordem Pública. No Centro do Rio, nas ruas do Senado e Regente Feijó quatro depósitos de mercadoria dos trabalhadores foram invadidos pelos agentes e toda a mercadoria foi apreendida.
Trabalhadores resistem
Na segunda-feira (19), agentes, policiais e guardas municipais rebocaram 11 Kombis e outros sete carros que serviam de depósito de material para os ambulantes que trabalham na praia da Barra da Tijuca. Por volta das 10:30h da manhã, a repressão chegou ao posto oito onde os trabalhadores não permitiram a remoção de seus veículos. Um dos ambulantes tentou fugir com a Kombi. Outros ameaçavam queimar a mercadoria que estava sendo levada e jogar bombas contra os guardas municipais.
Os vendedores fecharam a Avenida Lúcio Costa no sentido praia do Pepê com cadeiras e barracas até a chegada da polícia acompanhada da sua habitual truculência. Ao final da operação seis trabalhadores foram presos e levados para a 16ª DP, na Barra.
Na sexta-feira (30), depois que guardas municipais apreenderam vários DVDs de ambulantes que trabalhavam na Rua Uruguaiana, centro da cidade, quase 30 trabalhadores, munidos de pedras, barras de ferro e paus com pregos nas pontas, entraram em confronto com os guardas deixando quatro deles feridos. A Guarda Municipal não conseguiu prender ninguém. Há muito os camelôs dessa região sofrem com os assaltos e outros crimes que vêm sendo cometidos pela gerência municipal.
Na quarta-feira (2 de fevereiro), por volta das 10:30h da manhã, mais abusos. Um camelô que vendia bonés no calçadão da Avenida Atlântica em Copacabana teve todo seu material apreendido por guardas municipais. Cerca de vinte companheiros de trabalho da vítima protestaram e entraram em confronto com os guardas. Eles acabaram detidos por policiais e levados à delegacia, algemados como bandidos. Lá os trabalhadores foram autuados por desacato a autoridade e lesão corporal.
Todas essas são evidencias claras da dura perseguição que estão sofrendo trabalhadores pobres, moradores de rua, prostitutas e outros "indesejáveis" nos bairros nobres ou turísticos da cidade. Essas operações estão em perfeita sincronia com a política genocida da gerência estadual de Sérgio Cabral Filho, que diuturnamente joga sua polícia para o cerco e contenção das populações pobres nas favelas com a desculpa de combater o tráfico de drogas.
Está claro que a "ordem" e a "disciplina" buscadas tanto por Paes como por Cabral e Luiz Inácio são as que excluem os pobres dos espaços ditos públicos, como as praias, para que fiquem confinados nos morros e bairros distantes, sem direito ao trabalho ou ao lazer.