Entrevista com Ahmed Ramadan, Presidente da Conferência Cultural Árabe Brasileira
A Conferência Cultural Árabe Brasileira foi fundada em 1982. Interrompeu suas atividades durante algum tempo retomando-as diante dos últimos acontecimentos em Gaza.
O povo palestino impõe dura derrota ao invasor fascista
Ahmed Ramadan: Consideramos Israel um Estado artificial. Um Estado sionista e o sionismo é uma ideologia de expansionismo, rapina e morte para todo o povo árabe. É o único país sem fronteiras no mundo, vão tomando tudo em volta de forma criminosa. Bárbaros e assassinos. O que eles criticam em Hitler, o mesmo fizeram na Palestina. Os governantes não querem que o Hamas cresça, mas o povo está do lado do Hamas.
Primeiro Israel começou a bombardear com tanques, atacaram casas e hospitais. Depois começaram a atacar com aviões M16, em seguida com helicópteros nas áreas onde se concentravam principalmente crianças. Depois veio a aviação e as bombas de fósforo branco, que explodem no ar e queimam. Ela queima terra, contamina os lençóis de água. No sul, Israel descarregou lixo atômico enterrando toneladas de lixo nuclear na Faixa de Gaza. Bombas de fragmentação foram jogadas nas escolas, cortando as pernas das crianças. Muitas crianças estão sem pernas. Já morreram 421 crianças em menos de 2 anos. Mortos e feridos totalizam 10 mil.
As tropas sionistas já perderam mais de 171 soldados, mas não querem declarar. Eles perderam 47 tanques de guerra nos arredores de Gaza. Sentiram que iria haver uma dura resistência, por isso se afastaram. Eles fracassaram.
O objetivo do Hamas não é matar judeus. Respeitamos as religiões, todas por igual. Somos contra o movimento sionista que é representado pelo Estado político de Israel. 18% dos palestinos são católicos. Em Gaza os católicos e os muçulmanos lutam juntos e estão representados pelo Hamas. Nossa luta não é para libertar somente a Palestina, mas todo o povo árabe. O povo árabe está sofrendo de miséria, nas prisões.
Eu sou de Gaza, de um campo de refugiados. Eu brincava naquelas terras, comecei a aprender o que sei hoje naquelas terras. Ahmed Yassin, fundador e liderança inconteste do Hamas, assassinado em 2004 pelo exército sionista de Israel, foi meu professor quando eu tinha apenas oito anos. Ele nos ensinava como viver com igualdade social, nos ensinava muito. Ele nos orientava sobre a causa palestina, sobre tudo. Era um homem simples, aceitava trocar idéias. Assim foi criado o Hamas.
O Hamas venceu as eleições porque não tem corrupção. Os outros caíram porque são corruptos. O Al Fatah caiu porque começou a se aliar ao USA e à França e por isso caiu, porque parou de defender os interesses do povo.
Em 2006 o Hamas ganhou com 50% de vantagem nas eleições. Agora representa 87% da vontade do povo palestino, e cresceu assim por causa da igualdade social que promove e porque luta. O Al Fatah caiu, e os outros caíram porque se aliaram com o primeiro mundo e querem retirar o sangue do povo, seu interesse, sua filosofia, sua liberdade.
O Hamas não está lutando sozinho em Gaza. Além do apoio de todo o povo árabe, ainda há o Movimento Popular de Liberação da Palestina, a Frente Democrática para a Libertação da Palestina, além de outros movimentos que fazem parte da Resistência. Hoje existem principalmente seis movimentos junto do Hamas.
Em Gaza o Hamas dirige as escolas, hospitais, guia o povo palestino para o caminho certo, para voltar para sua terra. Com o Hamas melhoraram as escolas, o nível da educação. Hoje os palestinos fabricam vacinas, remédios, materiais primários como panelas, copos. Isso tudo em fábricas pequenas mesmo, ainda rudimentares. Nós temos tecelagens, estamos industrializando pequenas máquinas. O povo palestino, quando foi expulso de suas casas, não tinha roça nem fábricas, muitos foram estudar. Hoje podemos dizer que a Palestina tem o povo mais instruído do mundo árabe. 20% dos médicos árabes são palestinos. Por isso estamos desenvolvendo tecnologia, nossa mesma, não importada.
O povo vive à base da caça marítima, plantações de laranjas, verduras que os próprios palestinos plantam em seus quintais e sítios. O povo está unido. Quando as pessoas não têm dinheiro para comprar, esses produtos são distribuídos gratuitamente. Israel não deixa entrar trabalhadores palestinos e 70% da população está desempregada. A maioria vive de biscates. O povo tem fraternidade mútua, não há ganância e comercialização com os mais necessitados. Combustíveis e roupas têm que vir de fora, e isso impõem certas dificuldades.
A Palestina possui muitos lençóis subterrâneos de água. Nesse período do ano chove e, quando explodem as bombas assassinas de Israel a chuva ácida infiltra e contamina a água, que não serve mais para beber nem para plantar. Assim eles contaminam nossas terras.
Eles atacam a rede de eletricidade. Isso afeta em primeiro lugar os hospitais. Várias bombas israelenses causam problemas respiratórios e as pessoas precisam de aparelhos para sobreviver. Em segundo lugar, ela afeta toda a comunicação, as escolas, etc. Gaza está no escuro, assim como as escolas, hospitais etc. e, na verdade, o número de feridos e mortos é muito maior do que é divulgado.
Temos certeza que vamos vencer. Uma vez, em uma de minhas viagens ao estrangeiro, me encontrei com um comunista na Bulgária. Ele me disse que tinha certeza que Israel vai acabar. Ele deu um exemplo que nunca esqueci, disse que uma coisa é Israel, que parece mais um poste moderno. Outra coisa é a Palestina, que é como uma árvore. Se um vendaval os atinge, o poste cai. Já a árvore se mantém firme porque possui profundas raízes.